Adeus, “chumbos” nos dentes: amálgama com mercúrio proibida na UE em 2025

Bruxelas deu luz verde para proposta que proíbe, a partir de Janeiro de 2025, o uso de amálgamas dentárias com mercúrio em todos os pacientes. Objectivo é reduzir a contaminação por este metal pesado.

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O fabrico e a importação de amálgama dentária na União Europeia deverão acabar a partir de 1 de Julho de 2026 Ivan Babydov/Pexels
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As amálgamas dentárias com mercúrio, conhecidas como “chumbos”, têm os dias contados na União Europeia. Bruxelas deu luz verde para uma proposta que proíbe, já a partir de 1 de Janeiro de 2025, o uso deste material odontológico em pacientes de qualquer idade. O objectivo é reduzir a contaminação por este metal pesado.

“Após mais de uma década de discussões, a proibição foi finalmente acordada. É o início de uma nova era, em que a medicina dentária sem mercúrio será a regra e não a excepção, passando a estar acessível para todos”, refere a associação ambientalista Zero num comunicado.

Recorde-se que, na União Europeia, a aplicação de amálgama dentária já era proibida desde 2018 em crianças com menos de 15 anos e também em grávidas e mães a amamentar. Como resultado, continuaram a ser empregues cerca de 40 toneladas anuais de mercúrio em tratamentos odontológicos. A partir do próximo ano, a restrição passa a valer para qualquer pessoa.

A Comissão do Ambiente (ENVI) do Parlamento Europeu acolheu a revisão do Regulamento do Mercúrio, restringindo o uso alargado do metal pesado em contexto clínico, no dia 8 de Fevereiro. O mercúrio representa 50% da composição da amálgama dentária.

A proposta prevê a proibição da exportação de amálgama dentária a partir de 1 de Janeiro de 2025, bem como o fabrico e importação na União Europeia a partir de 1 de Julho de 2026. Alguns países poderão excepcionalmente utilizar a amálgama dentária até Junho de 2026, período em que têm de trabalhar num sistema de reembolso que ajude pessoas com baixos rendimentos a arcar com os custos de materiais alternativos sem mercúrio.

O documento da UE aborda ainda a questão das lâmpadas com adição de mercúrio: os Estados-membros devem reduzir gradualmente a exportação deste produto – que já é proibido no espaço europeu – até Junho de 2026.

“Aplaudimos a visão progressista da ENVI de eliminar gradualmente as lâmpadas com mercúrio adicionado já em 2025, pondo fim à duplicidade de critérios, evitando o dumping [exportações para países de baixo e médio rendimento] de lâmpadas de mercúrio já proibidas internamente. Tal decisão permitirá ainda que sejam realizadas importantes poupanças de emissões de CO2, contribuindo para a luta contra as alterações climáticas”, afirma Elena Lymberidi-Settimo, directora de políticas públicas do Gabinete Europeu do Ambiente, citada numa nota da entidade.

Impacto na saúde humana e ambiental

O mercúrio é um metal pesado que pode causar danos ambientais e afectar gravemente a saúde das pessoas. A literatura científica sugere que este poluente tóxico pode causar alterações directas no sistema nervoso central, causando problemas cognitivos e motores, perda de visão, complicações renais, cardíacas e no sistema reprodutor.

Além da amálgama dentária, os seres humanos podem estar expostos a este poluente tóxico através do consumo de peixes contaminados e de determinados produtos de beleza, em particular os cremes para clarear a pele. A queima de carvão em centrais eléctricas também pode libertar mercúrio para a atmosfera.

Rita Fonseca, coordenadora do Laboratório AmbiTerra, da Universidade de Évora, explica ao PÚBLICO que, se por um lado a União Europeia merece um aplauso pela forma como tem regulado e restringido o uso de mercúrio, por outro há muito a fazer no que toca à descontaminação de cursos de água e à remediação de solos.

“É infelizmente algo que se faz muito mal em Portugal e noutros países da Europa. A remediação não é pôr um geotêxtil num solo, mas é isso que se faz no nosso país. Os elementos não são estáveis e vão por aí fora, e as linhas de água acabam contaminadas. É possível remediar os solos, mas quando as linhas de água estão contaminadas não é possível retirar [o mercúrio], só imobilizar”, afirma a professora do Departamento de Geociências da Universidade de Évora.

Os trabalhadores de garimpos ilegais usam com frequência mercúrio para separar o ouro de outros materiais, sendo que a maior parte desse poluente acaba por contaminar a água e o solo. No Brasil, por exemplo, o metal pesado contamina rios e ribeiros no território do povo indígena Yanomami.