IL e PCP num debate de sonhos lindos, inacabados e muito, muito distantes

Caminhando sempre em direcções opostas, os líderes do PCP e da IL partilharam uma garantia: nenhum exigirá integrar o próximo governo para eventualmente o viabilizar.

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Rui Rocha, líder da Iniciativa Liberal, e Paulo Raimundo, secretário-geral do Partido Comunista José Alves
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Ainda antes de se sentarem frente a frente Rui Rocha e Paulo Raimundo, já se preconizava uma discussão mais calma, mas de confronto ideológico entre os líderes de dois partidos que dificilmente disputarão eleitores. Está por encontrar quem, perante o boletim de voto, hesitará entre dar a sua cruz à Iniciativa Liberal ou à CDU.

Ao 20.º debate, numa maratona que termina aos 30, a discussão foi amena, o tom de voz não subiu e as interrupções foram a excepção, apesar de se debaterem sonhos inacabados de países muito distantes.

A notícia do dia ajudou a lançar a discussão: ao fim de três semanas, o juiz de instrução Jorge Bernardes de Melo libertou os arguidos detidos na Madeira por não existirem indícios — “muito menos fortes indícios” — da prática dos crimes que lhes são imputados pelo Ministério Público.

A propósito deste caso e de eventuais reformas no sistema judicial, Rui Rocha prometeu dar força ao combate à corrupção, pela simplificação e agilização dos processos judiciais. Quanto a “mexer na Justiça”, expressão utilizada pelo jornalista João Adelino Faria, o líder liberal lembra o perigo da “intromissão do poder político na Justiça” e, por isso, escusa-se a esse papel.

Raimundo levanta as bandeiras do PCP: atender aos verdadeiros problemas das pessoas e às reivindicações dos trabalhadores — neste caso, dos funcionários judiciais. E se, no sonho liberal, os funcionários públicos são motivados por remunerações indexadas a objectivos de produtividade, no país comunista a distribuição da riqueza por quem a produz é lei: “As pessoas contam com o salário, não com prémios que poderão receber um dia, às vezes no dia de S. Nunca à tarde.”

Rocha exige para Portugal um “crescimento económico a sério”, “porque temos sido ultrapassados [no contexto europeu] até por países da antiga União Soviética”. Porque pior do que ficar para trás é ficar a ver passar à frente os antigos regimes comunistas da Europa do Leste, subentende-se.

Os líderes partidários pareciam estar, por fim, de acordo numa proposta: baixar o IRC e fixá-lo nos 12%. Falso alarme: o PCP propõe 12% de IRC apenas para as pequenas e médias empresas; a IL quer a mesma taxa para todas as empresas portuguesas, para que “possam crescer e para que possamos atrair capital e investimento estrangeiro”.

Ambos prometiam trazer cartas na manga, mas os truques eram os mesmos de debates anteriores. Rui Rocha trouxe na ponta da língua a Alemanha e os Países Baixos como exemplos do sucesso das políticas liberais; Paulo Raimundo acusou mais um adversário de “não perdoar ao PCP” por ter “corrido com o Governo PSD-CDS”. Já o tinha dito no debate com André Ventura, que, à semelhança de Rui Rocha, não era sequer deputado durante os anos da troika.

O debate terminou com a evocação dos fantasmas das anteriores lideranças: João Cotrim de Figueiredo e Jerónimo de Sousa. O presidente da Iniciativa Liberal aproveitou uma última oportunidade para mostrar o lado bom do liberalismo. “Sou liberal, adoro concorrência. Ter um líder anterior forte só faz com que me esforce a cada dia para ser um líder melhor.”

O secretário-geral do Partido Comunista preferiu afastar de si os holofotes. “O que vamos avaliar a 10 de Março não são as lideranças. A questão fundamental não é ‘como é que o Paulo Raimundo se vai safar’. É se criamos, ou não, as condições para melhorar a vida das pessoas.”

Caminhando em direcções opostas, partilharam uma garantia: integrar o próximo executivo não será condição imposta para viabilizar uma eventual solução governativa.

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