Um organismo marinho semelhante às medusas e que raramente surge nas zonas costeiras tem aparecido junto à costa algarvia, mas, ao contrário de algumas medusas, a sua presença é inofensiva, disse hoje à Lusa Joana Cruz, investigadora do Centro de Ciências do Mar (CCMAR) da Universidade do Algarve (UAlg). Segundo a investigadora, por serem parecidas com as alforrecas, as pessoas podem ficar com medo, mas estes organismos "não fazem mal nenhum", porque não têm "células urticantes", reiterou.
A salpa é uma espécie de tunicado, invertebrada, com tamanho entre 1 e 30 centímetros, que é "completamente inofensiva", ao contrário de diversas espécies de medusas, que comportam risco para humanos por serem urticantes, ora como mecanismo de defesa ora de predação, esclareceu a especialista. O organismo movimenta-se por propulsão a jacto e é gelatinoso e translúcido, com forma de barril, muito semelhante às medusas.
Apesar de ser um animal oceânico, a salpa tem sido detectada junto à costa do Algarve, o que pode estar relacionado com as correntes, já que se trata de uma espécie que se alimenta de fitoplâncton e a sua deslocação é influenciada pela movimentação marítima, explicou a investigadora.
Segundo Joana Cruz, as salpas têm uma função muito importante na captura de carbono dos oceanos, ajudando à sustentabilidade ambiental, mas não costumam estar em zonas costeiras. A alimentação desta espécie é feita através de contracções do corpo que permitem a "bombagem de água para capturar fitoplâncton" e tem a capacidade de "transferir todo o carbono que existe à superfície para zonas mais profundas" do oceano. "Através, por exemplo, das fezes, que são muito grandes e acumulam muito carbono, e também dos próprios animais, das salpas que vão morrer, que acabam por afundar para zonas mais profundas. Isto é bom porque o carbono vai ficar capturado e, portanto, elas são bastante importantes nestes processos", salientou.
Joana Cruz costuma desenvolver muitos trabalhos de investigação em zonas costeiras, nomeadamente no baixo estuário do rio Guadiana ou mesmo na Ria Formosa, devido à sua especialização em fitoplâncton, e "nunca aparecem salpas", sublinhou.
A especialista acredita que têm sido arrastadas pelo mar para as áreas costeiras, porque "não conseguem vencer a corrente", sobretudo quando "crescem muito rapidamente – têm taxas de crescimento muito rápido –, entram numa fase de volume de cadeia e são arrastadas".
"A nível da reprodução, podem ter uma fase solitária e outra fase em que fazem colónias. Apresentam dois tipos de reprodução: quando estão solitárias fazem uma reprodução assexuada, e é com as salpas que provêm desta reprodução assexuada que se vão formar as tais colónias", referiu. Joana Cruz destacou que uma colónia é habitualmente composta por "muitos indivíduos agarrados uns aos outros" e o grupo pode chegar a ter "centenas de metros".
Desta forma, é comum avistar as salpas como que coladas, em corrente: podem formar "desenhos", por estarem dispostos em linha e ligados uns aos outros. Assim, de acordo com o The New York Times, cada salpa na cadeia "nada no seu próprio ritmo assíncrono", mas a cadeia "sincroniza" o seu movimento quando se sente ameaçada por correntes fortes ou predadores.
Segundo o mesmo artigo, a espécie tem ainda uma peculiaridade curiosa: "Cada [indivíduo] começa a vida como mulher, depois muda para homem e nunca mais volta, mas ninguém sabe porquê".