RTP desafiada a pressionar para que Israel seja banido da Eurovisão
Comité de Solidariedade com a Palestina enviou uma carta aberta pedindo que a emissora pública boicote o concurso caso a União Europeia de Radiodifusão não afaste Israel.
O Comité de Solidariedade com a Palestina enviou esta terça-feira uma carta aberta a Nuno Galopim, responsável pela curadoria musical do Festival da Canção e comentador da Eurovisão de longa data nas transmissões televisivas da RTP, e a Hugo Figueiredo, integrante do conselho de administração da emissora pública, apelando a que esta última “pressione a União Europeia de Radiodifusão (UER) para que Israel seja banido da Eurovisão, e boicote o concurso caso isso não aconteça”.
Os autores do texto, que foi partilhado com os restantes órgãos de comunicação social, estão “convictos de que a televisão pública portuguesa rejeita o genocídio e o apartheid”, termos que utilizam para descrever a ofensiva militar de Israel. “O genocídio em curso na Faixa de Gaza é a continuação do projecto colonial de limpeza étnica que Israel desenvolve há mais de 75 anos em terras da Palestina, na mais completa impunidade”, escrevem logo no início do documento.
Esta carta surge pouco depois de, no último sábado, a Campanha Palestiniana para o Boicote Académico e Cultural de Israel (PACBI, na sigla inglesa) e o Sindicato dos Jornalistas Palestinianos terem apelado conjuntamente à UER para que proibisse a participação de Israel na edição deste ano da Eurovisão, que acontece na Suécia. A PACBI já deixava críticas fortes à presença dos israelitas no “maior evento de música ao vivo do mundo” no início de 2022, quando, devido ao início da guerra na Ucrânia, a Rússia foi afastada da edição desse ano da Eurovisão.
“Ao sancionar a Rússia pela invasão da Ucrânia, que havia ocorrido apenas uns dias antes, e ao proteger o apartheid israelita da responsabilização, apesar do seu regime de décadas de opressão contra os palestinianos, os organizadores da Eurovisão e a UER demonstram um desrespeito absolutamente hipócrita, racista e colonial pela vida palestiniana”, afirmou a Campanha Palestiniana para o Boicote Académico e Cultural de Israel, como lembrou no comunicado de imprensa relativo ao apelo agora feito com o Sindicato dos Jornalistas Palestinianos. “Se a UER não conseguir banir o apartheid israelita da Eurovisão, os palestinianos e os milhões de pessoas que apoiam a nossa luta de libertação farão campanha para boicotar o festival”, prometeram, este sábado, as duas entidades.
Na carta aberta enviada esta terça-feira à RTP, o Comité de Solidariedade com a Palestina mostra-se contente por ver que a Islândia, por exemplo, já não sabe se quer participar na edição deste ano da Eurovisão. A emissora pública desse país escandinavo, a RÚV, anunciou há umas semanas que decidirá se a Islândia integrará ou não o concurso em conjunto com o vencedor do próximo Söngvakeppnin, o equivalente islandês ao nosso Festival da Canção. No final de 2023, a Associação de Compositores e Letristas da Islândia já havia sugerido aos seus membros para não participarem na edição deste ano da Eurovisão a menos que Israel fosse banido do concurso.
Têm-se amontoado, nos últimos tempos, as manifestações públicas contra a participação de Israel na Eurovisão. Na primeira metade de Janeiro, mais de 1400 profissionais do ramo musical na Finlândia e na Islândia assinaram uma carta aberta apelando a que a emissora finlandesa, a Yle, pressionasse a UER no sentido de afastar os israelitas — e ameaçasse sair da competição caso isso não acontecesse. Repto similar proveio, no final do mesmo mês, do próprio país organizador, quando mais de mil artistas suecos, entre os quais Robyn, Fever Ray e Malena Ernman (cantora de ópera que é mãe da jovem activista climática Greta Thunberg) tomaram posição no jornal vespertino Aftonbladet.
A UER, organizadora da Eurovisão, tem mantido a posição de que o evento é apolítico: trata-se de um concurso entre as emissoras públicas dos países envolvidos e não de uma competição entre Estados. Mas já houve países a serem banidos no passado. Além do já referido caso russo, em 2022, a Bielorrússia também fora excluída um ano antes: a UER afastou a emissora pública Belaruskaja Tele-Radio Campanija por não cumprir com as suas regras relativamente à liberdade de imprensa.
Israel participa na Eurovisão desde 1973 e já venceu o concurso quatro vezes (em 1978, 1979, 1998 e 2018). O último desses triunfos aconteceu em Lisboa, um ano após a vitória de Salvador Sobral na Ucrânia, com Amar pelos dois; Toy, de Netta, foi então a vencedora da competição. Portugal, representado nesse ano por Cláudia Pascoal (O jardim), caiu do primeiro lugar da edição anterior para o último.