O indestrutível Bobby, o irmão da Marsha
Em 11 anos, o jogador do Fulham soma média de 38 jogos por época. Aparentemente indestrutível, Bobby Decordova-Reid é, fora do relvado, alguém que respeita a inclusão.
Bobby, para os amigos. Bobby Reid, para muitos. Bobby Decordova Reid, para outros quantos — mas menos. O “irmão da Marsha”, para a própria Marsha. Não é fácil saber como tratar o jogador que começou a construir, neste sábado, o triunfo (3-1) do Fulham frente ao Bournemouth, na 24.ª jornada da Premier League.
Há poucos irmãos e irmãs de futebolistas que escapem à sina de serem apenas o irmão do famoso que corre atrás da bola. Mas Bobby Reid sentirá uma pressão especial para que não seja assim
“Não sou a Marsha, representante de Battersea no parlamento, mas sim a irmã do Bobby Reid. Entro em locais e dizem-me ‘olá! O teu irmão joga no Fulham!’ e eu fico ‘sim, OK...’. Depois dos jogos, os adeptos pedem-me para lhes tirar fotos com o Bobby, algo que acho muito bizarro”, explicou Marsha, ao jornal The Times.
Marsha De Cordova, membro do parlamento no Reino Unido pelos trabalhistas, costuma navegar por pelouros como a inclusão, a igualdade e, sobretudo, por medidas de apoio a pessoas com deficiência. A própria Marsha, com um problema de cegueira, responde no parlamento por si própria, como no dia em que, ironicamente, uma proposta de um ministro para cidadãos com deficiência não foi impressa com o tamanho necessário para que Marsha conseguisse lê-la.
Bobby, apesar de dizer que pouco percebe de política, considera que, cada um na sua área, ambos são “exemplos para a sociedade e que têm a tarefa de influenciar as pessoas”. Será assim? Alguns dirão que Bobby se terá em demasiada conta, mas talvez ele não esteja tão errado assim. Afinal, Marsha é muitas vezes definida como a irmã de Bobby. E se assim é, talvez Bobby seja – erradamente ou não – tão ou mais relevante do que a irmã. Ele garante, ainda assim, que valoriza as lutas da irmã. E ela diz que seria sempre assim, mesmo que ele não quisesse.
Homenagem à mãe e "malandrice"
Mas esta figura do Fulham tem mais camadas em si. Antes do futebol propriamente dito, podemos dizer que este fã de David Attenborough é um apoiante bem verbal dos direitos dos animais e que já prestou apoio directo a crianças em cuidados paliativos.
É também neto de representantes da famosa geração Windrush, pessoas que vieram das Caraíbas na segunda metade do século passado, quando a precariedade nesses países, conjugada com a necessidade britânica de mão-de-obra, facilitou a entrada no Reino Unido. A geração Windrush, apontada como essencial na cultura e sociedade modernas do Reino Unido, significa, para Bobby, um motivo de orgulho.
É aqui que regressamos à primeira linha deste texto. Já como jogador proeminente da Liga inglesa, Bobby Reid decidiu mudar o seu nome para Bobby Decordova-Reid, acrescentando o apelido da mãe, jamaicana, a pessoa que o criou sozinha, acompanhando-o em quatro autocarros para o levar e trazer dos treinos. “Quis prestar-lhe esta homenagem e permitir que me veja com o nome dela a correr nos relvados”, explicou.
Actuando pela nação caribenha, apesar de ser inglês de nascença, Bobby, de 31 anos, tem construído uma carreira de alguma solidez. É jogador de dezenas de golos e assistências por temporada? Não é. Mas tem-se fixado como um valor importante para Marco Silva, treinador português que confia muito no jamaicano.
Trata-se de um atacante que já actuou pela zona central do ataque, mas que é, sobretudo, um ala. E podendo isto parecer um elogio curto para um ala, Bobby destaca-se pela agressividade com que trabalha sem bola e pelo voluntarismo de fazer todo o corredor.
A polivalência como lateral, ala, avançado ou mesmo médio interior têm colocado no jogador o ónus de não se mostrar “especialista” em nada – mas, por outro lado, acaba por ser sempre dos mais utilizados, tendo ainda uma fiabilidade física tremenda, com uma média de 38 jogos por temporada nas últimas 11 épocas — e sempre acima dos 30 em cada uma.
Mas nem tudo é perfeito. Em 2021, num derby londrino com o Chelsea, Bobby chegou-se ao pé de Mendy, antes de um canto a favor do Fulham, e perdeu vários segundos a tentar desapertar as luvas do guardião. Tentou uma vez, depois duas, três, quatro, cinco e seis. Bobby Reid estava a ser tão incompetente como persistente na sua ideia e andou, claro está, nas redes sociais e nos programas de comentário desportivo.
Há quem defenda que a malandrice no futebol é saudável e quem defenda que tentar prejudicar e enganar adversários, mesmo que sem especial crueldade, é sempre criticável. Seja como for, Bobby, o amigo das crianças e animais, também é “malandro”.