Bruxelas desiste da proposta para o uso sustentável dos pesticidas
Comissão Europeia cede à pressão dos agricultores e retira proposta para a redução de 50% do risco e da utilização de pesticidas químicos. Nova solução será apresentada no Verão.
A Comissão Europeia decidiu retirar a sua proposta para o uso sustentável de pesticidas na agricultura, e fará uma nova solução para reduzir os riscos dos produtos químicos fitofarmacêuticos depois do Verão, após uma consulta e discussão alargada com o sector e a indústria agro-alimentar, anunciou a presidente do executivo comunitário, Ursula von der Leyen, esta terça-feira, no Parlamento Europeu de Estrasburgo.
É uma nova cedência de Bruxelas à pressão política e às reivindicações dos agricultores, cinco dias depois de uma marcha de protesto ter desembocado na capital da União Europeia, com alguns momentos de tensão e confronto entre manifestantes e autoridades, e quatro meses antes da realização das eleições para o Parlamento Europeu, que segundo as projecções poderão resultar num reforço significativo da representação da direita radical e extrema-direita.
“A proposta para a redução do uso de pesticidas tornou-se um símbolo de polarização. Foi rejeitada pelo Parlamento Europeu, e não tem feito nenhum progresso no Conselho da UE. É por isso que vou propor ao colégio a retirada desta proposta”, justificou Ursula von der Leyen, considerando que é “necessário mais diálogo e uma abordagem diferente”.
Mas “o tema mantém-se”, acrescentou a presidente da Comissão, que prometeu apresentar uma nova proposta “muito mais amadurecida com a participação de todas as partes interessadas” depois do Verão, quando for apresentado o relatório final do Diálogo Estratégico sobre o Futuro da Agricultura na UE, que arrancou no mês passado.
Mudar o uso do solo
A proposta para o uso sustentável de pesticidas, que faz parte da estratégia alargada conhecida como “Do Prado ao Prato”, contemplava duas metas (que os agricultores contestam) até 2030: uma redução de 50% no risco e na utilização de pesticidas químicos, medida nas quantidades e nas propriedades perigosas das substâncias activas contidas nos pesticidas utilizados em cada Estado-membro; e uma idêntica redução de 50% na utilização dos pesticidas mais perigosos.
Na sua intervenção no plenário do Parlamento Europeu, Ursula von der Leyen referiu-se às queixas e reivindicações do sector agrícola, classificando como “um facto” que a actividade se vê confrontada com “problemas graves” e que afectam o rendimento dos agricultores. “As secas e as inundações que destroem colheitas e ameaçam a criação de gado o impacto da guerra de agressão da Rússia, a inflação e o aumento do custo da energia e dos fertilizantes”, enumerou.
A presidente da Comissão manifestou compreensão pelas preocupações do sector, mas lembrou que “a agricultura precisa de avançar para um modelo de produção mais sustentável”, para que “as explorações continuem a ser rentáveis” e a Europa mantenha “os alimentos mais saudáveis e de melhor qualidade no mundo”.
Nesse sentido, defendeu a necessidade de “inverter” algumas tendências negativas, a primeira das quais sobre o uso do solo. “O solo fértil é a espinha dorsal do modo de vida dos agricultores, mas 60% a 70% dos solos da Europa estão actualmente em mau estado”, disse, considerando ser do interesse do sector promover uma recuperação dos recursos naturais. “Muitos agricultores estão precisamente a fazer isso, mas é preciso fazer mais”, apelou Von der Leyen. E reconheceu algum falhanço na forma como Bruxelas tem comunicado as suas medidas ambientais e de combate às alterações climáticas.
“Os agricultores precisam de uma justificação comercial válida para as medidas de protecção da natureza, e talvez não a tenhamos apresentado de forma convincente”, afirmou a presidente da Comissão, acrescentando que novos subsídios públicos, que vão “para além da mera perda de rendimento” poderão funcionar como um “incentivo”.