Uma silhueta

Somos todos futuros cadáveres, mas não vale a pena antecipar esse dia derradeiro, pois não?

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O Almeida tocava insistentemente à campainha, preciso de falar com a São, dizia através do intercomunicador, apesar de a Alexandra já lhe ter dito ao telefone que ela se tinha ausentado por morte de um familiar, mas o homem não acreditava, achava que a São não queria falar com ele, quero desculpar-me, disse o Almeida ao telefone, comprei bombons belgas, comprei flores, havemos de fazer as pazes. Quando a porta do prédio se abriu e o Almeida viu o tamanho da Alexandra, aliviou a pressão no botão da campainha. Ela, usando o indicador e o polegar, prendeu a ponta do dedo do Almeida, que se contorceu de dor, amarfanhando as flores contra a caixa de bombons. Vai ter de acreditar em mim, disse ela, e não voltar a tocar nesta campainha, pelo menos com essa insistência; a São saiu esta manhã com a filha e não sei quando volta, mas não será tão cedo, com tudo o que tem para tratar, aliás, nem sei se volta. E o senhor também não. Somos todos futuros cadáveres, mas não vale a pena antecipar esse dia derradeiro, pois não?

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