Na Minha Estante: André Neves (Maze)
O desafio era simples: diz-nos o que andas a ler, que livro marcou a tua vida ou que autor compras sem hesitar. Estas são as escolhas de André Neves (Maze), artista e escritor.
Qual o teu género literário favorito?
O meu estilo de livros favorito é um subgénero, são as distopias. E para ilustrar isso, trouxe as distopias clássicas: o Animal Farm e o 1984, de George Orwell; o Nós, do Evgueni Zamiatine, que origina todo este subgénero; e o Admirável Mundo Novo, do Aldous Huxley. Parece-me que as distopias são cada vez mais importantes porque estamos a viver uma distopia neste momento.
Um livro que te pôs a dormir...
Para o livro que me pôs a dormir pensei em escolher um que realmente me pôs a dormir das tentativas falhadas de o ler. E é um livro que eu li na adolescência, faz parte do Programa Nacional de Leitura. Estou a falar d' Os Maias, de Eça de Queirós. Sempre que encalhei naquela parte descritiva, desistia. E adormeci, muitas vezes, mas preferi não o trazer. Preferi trazer um livro que me pôs a dormir por boas razões, sempre, e que esteve na minha mesinha de cabeceira durante quase a vida toda, que é O Principezinho. É um livro que aconselho a toda a gente, que revela muito sobre a natureza humana e sobre a vida.
Um livro que te inspirou enquanto artista...
Um livro que me inspirou enquanto artista é este: Do Espiritual na Arte, de Wassily Kandinsky. Li-o enquanto estava a estudar design gráfico e inspirou-me bastante porque na altura fazia música e já escrevia e consegui estabelecer muitos paralelismos entre o processo criativo visual, o literário e o musical. Consegui perceber esta componente espiritual e abstracta que e o Kandinsky põe neste livro.
O teu livro preferido?
É sempre uma pergunta horrível de responder. Escolher um entre milhares de livros, mas resolvi trazer o Siddhartha, de Hermann Hesse, porque é um livro que me tem acompanhado durante toda a minha vida. Li-o na adolescência, depois li-o nos meus vintes, depois li-o nos trintas e, agora ao pegar nele, percebi que ainda não o li nos quarentas e vou certamente lê-lo nos próximos anos.
O último livro que leste...
O último livro que li foi o Dicionário da Erosão, de John Freeman. É um livro incrível, li-o, depois parei um pouco, reflecti sobre ele e reli-o. Vai de A a Z a esmiuçar diferentes palavras de uma forma muito actual. Este ensaísta vê o mundo de uma perspectiva incrível e é quase um livro sobre a etimologia da palavra.
Qual o teu autor português favorito?
O meu autor favorito português é a Sophia de Mello Breyner Andresen. Trouxe vários dela, livros de contos, livros infantis, mas principalmente de poesia. A poesia de Sophia é o que me fascina e eu continuo sempre a descobrir camadas novas e formas de escrita que ela usa e que me inspiram bastante. Enquanto artista, a escrita da Sophia interage comigo de uma forma muito íntima. Consigo identificar muitos pontos de vista, vejo-me reflectido na palavra dela e é uma enorme fonte de inspiração. E quando assim é... A escrita toca intimamente e toca profundamente. E é inevitável essa ligação.
Um livro que toda a gente devia ler...
Eu acho que há muitos livros que toda a gente devia ler, mesmo muitos. Estive com alguns na mão da minha estante, mas cheguei à conclusão que este é um dos fundamentais. É um livro de sabedoria, de espiritualidade. Chama-se The Four Agreements, em português são As Quatro Verdades, de Don Miguel Ruiz. E são quatro frases muito simples que conseguem transformar o nosso comportamento e o nosso estilo de vida. Não as vou revelar porque é um spoiler, mas aconselho este a todos.
Uma personagem de um livro com quem te identifiques...
Também não é fácil escolher um personagem ou identificarmo-nos com uma personagem de um livro. Acho que nos identificamos com parcelas de um ser e vemos vislumbres do nosso próprio ser na personagem. E é isso que às vezes nos prende aos livros. Eu escolhi Walden ou a Vida nos Bosques, de Henry David Thoreau. Eu revi-me mesmo nesta personagem, que não é uma personagem, é próprio Thoreau que decide viver, isolar-se do mundo e ir viver para o meio da natureza, para este lago Walden e sentir essa conexão com a natureza. Viver nesse estado de quietude, perceber essa solidão. Revi-me a cada passo deste livro porque consigo também identificar muitas características do Thoreau, a minha forma de ser e de estar e acho que conseguia passar por esta experiência e viver neste estado enquanto ermita.