Bruxelas abre processo contra Portugal pelo atraso no IRC mínimo

Oito países da UE receberam cartas da Comissão Europeia para explicarem porque não transpuseram a directiva que coordena o IRC mínimo de 15% sobre as grandes multinacionais.

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A transposição da directiva é responsabilidade do Ministério das Finanças, liderado por Fernando Medina Daniel Rocha
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A Comissão Europeia desencadeou nesta quinta-feira um processo de infracção contra Portugal, pelo facto de o Estado ainda não ter transposto para a legislação nacional a directiva europeia que coordena a implementação das novas regras do IRC mínimo de 15% a nível mundial sobre os lucros das grandes multinacionais.

Os 27 Estados-membros tinham até 31 de Dezembro do ano passado para traduzir as novas regras para a ordem jurídica interna, mas Portugal falhou esse prazo. Outros oito países – Espanha, Grécia, Chipre, Malta, Estónia, Letónia, Lituânia e Polónia – também não notificaram a Comissão Europeia da transposição da directiva e, por isso, viram Bruxelas abrir um procedimento idêntico.

Nesta primeira fase, Portugal e os outros oito países receberam uma carta de notificação para cumprir o processo legislativo nos próximos dois meses, caso contrário, Bruxelas passa à fase seguinte do processo de infracção, a emissão de um parecer fundamentado.

O Governo português sabia desde 14 de Dezembro de 2022 que teria de transpor a directiva para o plano nacional até 31 de Dezembro e definiu como calendário submeter a proposta no Parlamento apenas na segunda metade do ano, mas até à discussão do Orçamento do Estado para 2024, em Outubro, não o chegou a fazer e, a partir de 7 de Novembro, abriu-se a crise política com a demissão do primeiro-ministro e a anunciada dissolução do Parlamento.

Como neste momento Portugal está com a Assembleia da República dissolvida e a transposição da directiva terá de ser feita através de uma lei, Portugal fica em risco de falhar o prazo de dois meses dado pela Comissão Europeia, porque, agora, estando o Governo demitido e o Parlamento dissolvido, só o próximo executivo que resultar das eleições legislativas de 10 de Março poderá apresentar uma proposta de lei, a ser aprovada pelos deputados.

O patamar mínimo de 15% no IRC a nível mundial aplica-se às empresas com receitas anuais a partir de 750 milhões de euros. Se um território não aplicar uma taxa efectiva de IRC de pelo menos 15% a uma empresa, o Estado onde essa multinacional estiver sediada pode aplicar um imposto complementar para perfazer o patamar mínimo de tributação, o que desincentiva o primeiro território a abdicar da cobrança do IRC.

Portugal tem de assegurar que uma grande empresa abrangida pela directiva e que esteja presente no território português através de uma filial paga uma taxa efectiva de IRC de pelo menos 15%, e o primeiro ano económico sobre o qual se aplica o patamar mínimo é 2024 (IRC a declarar em 2025).

A medida resulta de um acordo mundial subscrito por 139 jurisdições que se comprometeram a combater o planeamento fiscal agressivo das multinacionais procurando travar a transferência de lucros de forma artificial para territórios de baixa ou nula tributação. Este eixo da reforma fiscal é complementar a um outro pilar, que diz respeito à distribuição de direitos de tributação da actividade das empresas, pensado para aproximar a tributação das actividades do local onde os resultados são gerados.

No final de 2023, quando já se sabia que Portugal ia falhar o prazo de transposição, o PÚBLICO perguntou ao gabinete do ministro das Finanças, Fernando Medina, por que razão, tendo previsto o Governo apresentar a iniciativa no Parlamento durante a segunda metade de 2023, não o chegou a fazer. A equipa de Fernando Medina nada disse. Sem resposta ficou igualmente a pergunta sobre se o Governo reconhece o dano reputacional para o Estado português de não colocar em vigor este instrumento de cooperação fiscal dentro do prazo.

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