Comissão avança na tentativa de apertar escrutínio ao investimento estrangeiro

Medidas inserem-se na estratégia de segurança económica de Bruxelas e visam prevenir e mitigar os riscos de segurança associados à entrada de investidores estrangeiros no mercado europeu.

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A presidente executiva da Comissão Europeia, Margrethe Vestager EPA/OLIVIER HOSLET
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As novas regras e medidas concretas para prevenir e mitigar os riscos de segurança no investimento estrangeiro que entra e sai da União Europeia só deverão ser aprovadas na próxima legislatura, mas esta quarta-feira a Comissão Europeia já adoptou um conjunto de propostas para a revisão dos mecanismos existentes de vigilância e escrutínio, bem como da lista dos itens sujeitos a controlos de exportação, que agora serão discutidas com os Estados-membros e os legisladores do Parlamento Europeu.

As ideias avançadas pelo executivo comunitário inserem-se no chamado segundo pilar da sua estratégia de segurança económica, que diz respeito à “protecção” do espaço europeu, principalmente das ameaças de transferência de tecnologia e conhecimento; apropriação e utilização de produtos de duplo uso (civil e militar), ou ainda interferência ou coerção económica de países classificados como rivais ou adversários da UE.

“Estamos confrontados com um panorama geopolítico cada vez mais complexo e tenso. Há novos desafios a materializar-se que acarretam maiores riscos para a segurança económica da União Europeia”, contextualizou a presidente executiva da Comissão Europeia, Margrethe Vestager, que não precisou de nomear países como a China ou a Rússia para se perceber quais serão os principais destinatários das novas medidas.

As iniciativas que foram discutidas esta quarta-feira pelo colégio de comissários ainda se encontram numa fase preliminar: são rascunhos de futuras propostas legislativas, ou relatórios técnicos (os chamados “white paper” ou livros brancos) que enumeram diferentes alternativas e opções possíveis para prevenir ou mitigar uma série de riscos e ameaças — que tanto têm a ver com a segurança física ou virtual de novas tecnologias e infra-estruturas críticas, como com a resiliência das cadeias de abastecimento e do funcionamento do mercado interno.

O trabalho que se encontra numa fase mais avançada tem a ver com a revisão das regras para a análise e autorização do investimento directo estrangeiro na UE. Em 2020, Bruxelas montou um mecanismo de escrutínio (screening) dos riscos para a segurança ou a ordem pública dos Estados-membros que acolhem esse investimento, que já analisou 1200 projectos. Em 80% dos casos, os problemas que foram detectados foram resolvidos “em questão de dias”, disse fonte da Comissão Europeia.

Mas como o escrutínio é gerido por cada Estado-membro de acordo com as suas próprias regras, Bruxelas defende um alargamento e uma harmonização do sistema, que passará obrigatoriamente a ter de avaliar os riscos de segurança do IDE num conjunto restrito de sectores e tecnologias. A proposta alarga ainda o escrutínio aos investimentos que são feitos por empresas da UE mas que são controladas ou detidas por pessoas ou entidades de um país terceiro.

E a Comissão quer ir mais longe do que prevê a legislação actual e passar também a controlar o potencial de risco de segurança do investimento directo estrangeiro que sai da UE para determinados países. Trata-se de criar regras que permitam avaliar os projectos de investimento externo que possam conduzir à transferência de tecnologias críticas ou ao reforço de capacidades militares de países terceiros que possam depois agir contra os interesses da UE ou minar a paz e a segurança internacionais.

No mesmo sentido, Bruxelas vai pedir aos Estados-membros para melhorar a sua coordenação em termos da aplicação de controlos de exportação fora dos quadros específicos dos regimes de sanções. O executivo comunitário pretende actualizar a lista de produtos que estão sujeitos a restrições ou proibições de exportação, para acrescentar uma série de itens de duplo uso civil e militar, tais como electrónica avançada, toxinas, tecnologia nuclear ou de mísseis.

Como justificou o presidente executivo da Comissão, Valdis Dombrovskis, “a UE tem beneficiado muito do facto de ser uma potência exportadora, de investir no estrangeiro e de ter o seu mercado aberto ao comércio e aos investidores estrangeiros. Mas para continuar a tirar o máximo partido dessas oportunidades, tem de ter uma visão mais clara dos riscos, e melhorar a sua protecção neste momento de turbulência geopolítica e rápidas mudanças tecnológicas”. Como? “Tornando os investimentos mais seguros, e controlando a exportação de produtos sensíveis de forma a evitar que caiam nas mãos erradas”, resumiu.

Dombrovskis conta com o acordo dos Estados-membros, mas mesmo assim atira a aprovação destas medidas para o próximo ciclo político, depois das eleições europeias de Junho. “Realisticamente não podemos esperar que estas propostas legislativas sejam adoptadas ainda no actual mandato, uma vez que o prazo para as votações do Parlamento Europeu termina em Abril”, lembrou.

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