Relógio do Apocalipse continua a 90 segundos do fim, o mais perto que já esteve

Todos os anos, os especialistas da revista Bulletin of the Atomic Scientists acertam o relógio, que serve de aviso da comunidade científica para a humanidade.

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O Relógio do Apocalipse foi acertado esta terça-feira para os 90 segundos antes da meia-noite – ou seja, o mundo continua a 90 segundos do fim, tal como no ano passado, com este relógio a representar uma metáfora para alertar a humanidade se está mais perto ou mais longe de se autodestruir. Significa isto que o relógio continua o mais próximo que alguma vez já esteve da meia-noite.

A meia-noite significa a destruição total do mundo tal como o conhecemos. Todos os anos, os especialistas da revista Bulletin of the Atomic Scientists acertam o relógio, que serve de aviso da comunidade científica para a humanidade.

No ano passado, o relógio ficou a 90 segundos do fim devido à guerra na Ucrânia e aos perigos nucleares, mas também devido às ameaças biológicas e às alterações climáticas.

O facto de o relógio se manter “parado” não é, contudo, indicador de estabilidade, com os especialistas a citarem algumas ameaças, como guerras, ameaças nucleares, falhas no combate às alterações climáticas, ameaças biológicas e a inteligência artificial.

A posição dos ponteiros do relógio reflecte, segundo a revista Bulletin of the Atomic Scientists, “o estado contínuo de perigo sem precedentes que o mundo enfrenta”, com os especialistas a destacarem, citados em comunicado, que o relógio poderá ser atrasado se os governos e a sociedade tomarem medidas urgentes.

As ameaças que assombram a humanidade actualmente são várias: a guerra entre a Rússia e a Ucrânia e a deterioração dos acordos de limitação do uso de armas nucleares; a crise climática e a designação oficial de 2023 como o ano mais quente já registado; a sofisticação crescente das tecnologias de engenharia genética; e o avanço da inteligência artificial que poderá “ampliar a desinformação e corromper o ambiente de informação global, tornando mais difícil resolver os maiores desafios existenciais”, enumeram os especialistas.

“Não se deixem enganar”

“Não se deixem enganar: reiniciar o relógio a 90 segundos da meia-noite não é uma indicação de que o mundo está estável. Muito pelo contrário. É urgente que os governos e as comunidades de todo o mundo ajam. E o Boletim continua esperançoso – e inspirado – por ver as gerações mais jovens a liderar a luta”, afirmou Rachel Bronson, presidente e directora executiva do Boletim, em comunicado.

No início da apresentação em directo online, tinham sido já destacadas algumas das ameaças prementes, incluindo a escalada nuclear, a situação em Israel e na Faixa de Gaza e “os horrores da guerra moderna”, as alterações climáticas e a “falta de acção” para as combater, o risco de surgirem futuras pandemias e os avanços na tecnologia.

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Israel ATEF SAFADI/EPA

“Tendências perigosas continuam a levar o mundo em direcção a uma catástrofe global. A guerra na Ucrânia e a dependência generalizada e crescente de armas nucleares aumentam o risco de uma escalada nuclear. A China, a Rússia e os Estados Unidos estão a gastar somas avultadas para expandir ou modernizar os seus arsenais nucleares, aumentando o perigo sempre presente de uma guerra nuclear por erro ou engano”, refere o comunicado de imprensa do painel.

Além disso, “em 2023, a Terra registou o ano mais quente de que há registo e inundações maciças, incêndios florestais e outras catástrofes relacionadas com o clima afectaram milhões de pessoas em todo o mundo”, enquanto “os desenvolvimentos rápidos e preocupantes nas ciências da vida e noutras tecnologias disruptivas se aceleraram” perante uma certa inacção por parte dos governos. Porém, há esperança: “O mundo pode tornar-se mais seguro. O relógio pode afastar-se da meia-noite.”

Como no Titanic

Jerry Brown, ex-governador da Califórnia e presidente executivo do Boletim, lamentou que os dirigentes mundiais estejam “a conduzir o mundo para uma catástrofe”, quase “como se estivessem no Titanic”, com “mais bombas nucleares, grandes emissões de carbono, agentes patogénicos perigosos e inteligência artificial”. “Só as grandes potências como a China, a América e a Rússia podem fazer-nos recuar. Apesar dos profundos antagonismos, têm de cooperar – ou estamos condenados”, conclui, citado em comunicado, Jerry Brown.

Já Bill Nye, que participou no anúncio do Relógio do Apocalipse de 2024, sublinha que, “durante décadas, os cientistas têm-nos alertado para os perigos que a humanidade enfrenta”. “Podemos estar perante uma catástrofe, se não gerirmos melhor as tecnologias que criámos. É altura de agir.”

A hora do Relógio do Apocalipse é definida pelo Painel de Ciência e Segurança do Bulletin of the Atomic Scientists, sob consulta de um painel de patrocinadores, que inclui nove laureados com o Prémio Nobel.

Daniel Holz, professor dos Departamentos de Física, Astronomia e Astrofísica da Universidade de Chicago (EUA), é o presidente do Painel de Ciência e Segurança do Bulletin of the Atomic Scientists de 2024, que é também composto por Asha George, directora executiva da Comissão Bipartidária de Biodefesa dos EUA, Alexander Glaser, professor do Departamento de Engenharia Mecânica e Aeroespacial da Universidade de Princeton, Herb Lin, investigador sobre ciberpolítica e segurança do Centro para a Segurança e Cooperação Internacional da Universidade de Stanford, e Ambuj Sagar, director adjunto e professor do Instituto Indiano de Tecnologia de Deli.

Apesar de 2023 ter sido o ano mais quente de que há registo, de eventos extremos terem ocorrido em todo o mundo, de as emissões globais de dióxido de carbono continuarem a aumentar e de nem todos os seres humanos serem afectados da mesma forma, Ambuj Sagar salientou que há “boas notícias”. “Estamos a avançar na direcção certa, ainda que não tão rapidamente ou tão profundamente como gostaríamos”, disse, durante a transmissão online, salientando os compromissos assumidos na COP28.

Já Herb Lin e Asha George destacaram o debate sobre se a inteligência artificial é uma ameaça existencial, com o investigador da Universidade de Stanford a salientar tratar-se de “uma tecnologia disruptiva”. Porém, disse ainda Herb Lin, “qualquer ameaça física” apenas surgirá se alguém decidir fazer a ponte entre a inteligência artificial e o mundo físico. Asha George afirmou, por sua vez, que é necessário haver mais discussão sobre a eventual aplicação da inteligência artificial em termos de armas biológicas.

Esta é a 77.ª vez que os ponteiros do Relógio do Apocalipse (ou Doomsday Clock) são acertados. O relógio foi criado em 1947, numa altura em que as grandes ameaças à humanidade residiam nas armas nucleares. O ano em que esteve mais longe da meia-noite foi o de 1991, com o fim da Guerra Fria, quando ficou a 17 minutos do fim.

Entre 2020 e 2022, o Relógio do Apocalipse permaneceu a 100 segundos do fim e, em 2023, ficou a 90 segundos da meia-noite, o mais perto do que alguma vez tinha estado do fim.

Os ponteiros do relógio são acertados por especialistas de diversas áreas, incluindo energia nuclear, alterações climáticas, tecnologias disruptivas e biossegurança, com muitos destes especialistas a aconselharem também governos e agências internacionais.

A principal conclusão repete-se: “Cada segundo conta.”

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