Frank apostou em Toney e não temos de o punir por isso
Por convicção ou por necessidade – ou ambas –, Thomas Frank, treinador do Brentford, apostou num futebolista que não jogava futebol há oito meses. E ganhou: a aposta, o jogo e o jogador.
Oito meses sem jogar futebol “a sério”, alguns dos quais passados em praias paradisíacas, já que nem sequer podia treinar – cenário que Ivan Toney criou para si próprio, depois de ignorar a regra que impede profissionais de futebol de fazerem apostas desportivas.
Neste sábado, já livre da dor auto-infligida, marcou um golo e ajudou o Brentford a vencer – algo que não fazia há sete jogos –, com um 3-2 frente ao Nottingham Forest. Será que apostou num golo seu? É provável que não.
Durante a semana, a imprensa inglesa já falava do regresso do jogador e, havendo algumas vozes que apontavam uma possível titularidade de Toney, a lógica dizia-nos que ele haveria de entrar no decorrer do jogo. Para quem não jogava futebol há oito meses, já seria muito bom.
E tudo isto é difícil de explicar. Um jogador não deveria perder ritmo competitivo depois de oito meses parado? Em teoria, sim. Não deveria ser preciso algum tempo de readaptação à competição, sobretudo no campeonato mais forte do mundo? Em teoria, sim. Não deveria haver, da parte do treinador, prudência em confiar o seu ataque a alguém que não jogava futebol há mais de meio ano? Em teoria, sim.
Thomas Frank, treinador do Brentford, está com o ataque reduzido por lesões e pela CAN e, por convicção ou por necessidade – ou ambas –, apostou em Toney no seu “onze”. Apostou, ganhou e, ao contrário de Toney, não terá de ser punido pela sua aposta. Foi legítima e bem lucrativa.
Linhas tortas
É certo que o fez de livre directo e não propriamente numa jogada em que tenha exibido fulgor físico, mas não era previsível que Toney jogasse a titular na Liga inglesa depois de oito meses parado e muito menos que marcasse um golo.
Mas o inglês já tem mostrado que não é fã do banal, do esperado ou sequer do suposto. Não é suposto um jogador apostar, mas Toney fê-lo. E ousou até apostar em jogos da sua equipa e até na derrota da sua equipa – aposta que, a avaliar pelo desempenho do Brentford nesta temporada, nem é muito arriscada para quem possa aventurar-se nisso.
Também não é suposto um jovem craque chegar a um clube como o Newcastle e falhar redondamente. Tal como não é suposto ser emprestado e falhar uma e outra vez, onde quer que jogasse.
Também não era esperado que tivesse de descer até à terceira divisão para voltar a ser goleador. E muito menos que depois dessa descida até ao terceiro escalão ainda tivesse forma de voltar à Premier League – e menos ainda de marcar golos e ser apontado a clubes de primeira água.
Quase nada na carreira de Toney tem feito sentido, tal como, para muitos adeptos do Brentford, não terá feito sentido que na semana em que iria regressar aos relvados o jogador tenha tido a audácia de dizer numa entrevista que quer “jogar num clube de primeira linha” e que “se um clube pagar a quantia certa, quem sabe. Em Janeiro ou noutra altura, estarei pronto”.
Euro 2024?
Toney é o homem que acha bem apostar em jogos de futebol, apostar em derrotas da sua equipa e dizer, no dia em que fica livre de uma suspensão, que quer sair do clube que não lhe rescindiu o contrato com justa causa, apesar de ter motivos para tal.
Mas Toney também é o homem que marca golos depois de oito meses parado, que consegue mudar, sozinho, o ambiente de uma equipa em dificuldades e ter um estádio a cantar o seu nome, mesmo depois de prevaricar.
Entre um Toney e o outro há uma linha ténue sobre a qual o inglês ainda não aprendeu a caminhar de forma segura. Quando o fizer, talvez o esperem outros voos.
Além do interesse de clubes como Chelsea e Arsenal, a selecção de Gareth Southgate já lhe foi colocada "no prato", ainda que Toney tenha acabado por ficar fora do Mundial 2022, numa fase em que estava em grande forma. Mas desde que volte a marcar golos dificilmente não vai dar o salto: para o tal clube grande que Toney deseja, e, quem sabe, o salto para o Euro 2024.