“O Algarve não pode baixar a cabeça”: Macário Correia vai criar federação da agricultura regional

Comunidade Intermunicipal diz: “O Algarve não pode baixar a cabeça, desistindo de ter agricultura.” Os hoteleiros alinham com o Governo nos cortes de 15% no abastecimento de água, mas com avisos.

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Produtores agrícolas estão preocupados com a falta de água no Algarve Rui Gaudêncio
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A suavização das medidas de redução no abastecimento de água ao Algarve não travou os agricultores, que recusam ser vistos como os “maus da fita” dos gastos excessivos. “Temos uma reunião na próxima segunda-feira e vamos avançar com a criação da Federação da Agricultura do Algarve”, adiantou ao PÚBLICO Macário Correia, actual presidente da Associação de Regantes do Sotavento Algarvio. A nova estrutura associativa, disse, vai englobar “todos os que têm ligação ao mundo da agricultura – desde os abacates aos citrinos à pecuária e hortofrutícolas” – ou seja, vai surgir uma espécie de CAP regional, liderada por Macário Correia, que já foi presidente da Câmara de Faro e de Tavira.

Com a seca que se faz sentir no país – e com a tendência para se manter e agravar nos próximos anos – onde é que vai haver água para satisfazer todas as necessidades? Na opinião dos agricultores, a poupança deve começar pela eliminação dos 30% de perdas nas redes públicas. Sobre os cortes, anunciados na quarta-feira, Macário Correia afirma: “Não têm nenhuma alteração relevante em relação àquilo que já vinha sendo previsto, são apenas uma forma diferente de tratar os números.”

O sector agrícola consome 135 hm3 de água, 100 hm3 dos quais têm origem nos aquíferos e 35 hm3 nas barragens. “Inicialmente, dizia-se que iria haver uma redução de 72%, agora diz-se 28%, não significa que houve golpe de magia, e que apareceu água na barragem de um momento para o outro...” O que acontece, explicou, é que a água que escasseia vai ser compensada com as captações subterrâneas, para manter (como refere, o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro) a “sobrevivência” das plantas.

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Adaptação no turismo

Do lado do sector turístico, o presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Hélder Martins, entende que algumas das medidas propostas são de difícil aplicação, mas apoia a decisão governamental. “Não temos outra hipótese senão reduzir os consumos.” Porém, não deixa de frisar que há “medidas difíceis de aplicar”, nomeadamente a instalação de “chuveiros ecológicos”, em que o máximo de caudal que debitam são seis litros por minuto. Os que estão instalados nos hotéis chegam ao dobro desse valor.

“O mercado [fabricante], se calhar não está preparado”, sublinha. No sentido de vir a aderir às directivas que foram propostas, a AHETA vai reunir a sua direcção na sexta-feira, para avaliar, de forma prática, como pode começar a “reduzir” os consumos, tendo em vista obter o “selo” de Unidade ou Estabelecimento Amigo do Ambiente.

Para alcançar essa certificação, refere Hélder Martins, terão ser aplicadas dez medidas até ao Verão, e a seguir outras tantas, que abrangem desde o abdicar dos contadores para rega à redução dos espaços verdes regados. “Acredito que vamos conseguir, o que não controlamos é o tempo que o cliente está debaixo do chuveiro, embora se possa sensibilizar” o turismo a participar numa causa de interesse público. “O sector não tem outra hipótese, porque efectivamente não há água – vamos ter de nos adaptar”, remata.

Uma situação preocupante

Em relação a fontes de abastecimento alternativas às barragens e captações subterrâneas, Hélder Martins defende que não bastará uma unidade dessalinizadora, que só vai resolver uma parte ínfima dos consumos. “Uma forma que o sector [do turismo] tinha de dar um sinal fortíssimo era a aplicação da taxa turística, que é uma receita municipal, para a construção de outra dessalinizadora”, sugere.

O que defendeu o presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve (Amal), António Pina (PS), na conferência de imprensa, após a reunião interministerial da comissão da acompanhamento da seca, compagina-se com a opinião do social-democrata Macário Correia: “O Algarve não pode nem vai baixar a cabeça, desistindo de ter agricultura.” Por isso, apelou aos responsáveis pela pasta da Agricultura e Ambiente, sentados ao seu lado, fazendo votos para que o quadro de apoios financeiros “seja o suficiente para manter a esperança de vida”.

O estado crítico a que chegou o Algarve, na opinião de Francisco Ferreira, da Zero, deve-se “à inacção [governamental] que tem existido nos últimos anos”, nomeadamente no que diz respeito à reutilização das águas residuais na rega de campos de golfe. A passagem para a exploração das águas subterrâneas, para que a redução caísse de 70% para 25%, sublinha, é uma “situação preocupante, porque o Algarve, nas últimas décadas, foi um desastre – temos vários aquíferos que ficaram salinizados ou poluídos à custa de uma extracção exagerada ou poluição agrícola”.

“Compreendemos a lógica de sobrevivência para a agricultura, mas achamos que não podemos fechar os olhos àquilo que têm sido falhas estruturantes.” Até porque, acrescenta, “a capacidade de monitorização e fiscalização dos furos é mínima – temos aqui um risco grande e a sério”. Por outro lado, o vice-presidente da Agência Portuguesa de Ambiente (APA), Pimenta Machado, esta semana, em Loulé – na apresentação do livro 50 Anos de Políticas Ambientais em Portugal, de Luísa Schmidt – declarou: “Se há coisa que o Algarve não tem falta é de água, mas é salgada.”