Lagarde vê corte nos juros como provável no Verão, mas alerta para “incertezas”

Banco Central Europeu continua preocupado com alguns indicadores, mas considera que política restritiva está a dar frutos. Presidente pede prudência, mas crê que inflação já terá ultrapassado o pico.

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Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu FRIEDEMANN VOGEL/EPA
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A presidente do Banco Central Europeu (BCE) admite como "provável" o cenário de um corte nas taxas de juro a partir do próximo Verão, mas alerta que "ainda há alguma incerteza" e "alguns indicadores" não estão de acordo com o que é necessário para que esse corte aconteça.

"Estou confiante de que, sem mais choques, atingimos o pico" da inflação, disse Christine Lagarde, nesta quarta-feira, numa entrevista à agência Bloomberg, a partir de Davos, na Suíça, onde desde segunda-feira se reúne a elite financeira e política global, com os olhos postos no Médio Oriente e nos riscos de uma recessão.

"Temos de manter esta política restritiva enquanto for necessário para chegar àquele ponto em que todos podemos estar seguros de que [a inflação] estará nos 2% no médio prazo. Sei que alguns estão a dizer que estamos a ir além do necessário e a arriscar em demasia. Penso que o risco seria acelerar agora [a descida dos juros] e depois ter de inverter e voltar a apertar, porque estaríamos a desperdiçar o esforço que todos temos feito nos últimos 15 meses", afirmou a presidente do BCE.

Mesmo entre os 20 países da zona euro, prosseguiu Lagarde, os preços têm trajectórias muito distintas. "Veja-se a inflação em Portugal e na Alemanha", exemplificou, para depois responder às expectativas daqueles que, dentro do conselho de governadores, começam a formar uma corrente maioritária que acredita que, lá pelo Verão, já será possível cortar na taxa de juro.

"Também acho que é provável", resumiu Lagarde, acrescentando porém que tem de ser "cuidadosa". "Cada membro tem a sua visão, que eu respeito. As decisões são tomadas com base em dados e alguns desses membros têm os seus próprios dados domésticos, com as suas próprias taxas de inflação, que diferem de país para país. Olhem para Portugal, olhem para a Alemanha — são realidades diferentes! E é missão deles dizer que é provável que isso aconteça. Eu também acho que é provável, mas tenho de ser cuidadosa porque, afinal de contas, estamos dependentes dos dados e ainda há um certo nível de incerteza e alguns desses dados não estão ancorados no nível que precisamos."

Segundo os dados mais recentes, a inflação em Portugal já se encontra abaixo dos 2%, mas o balanço de todo o ano demonstra ainda uma forte variação nos preços de 4,3%. Na Alemanha, a inflação voltou a disparar em Dezembro, com a variação homóloga a subir 1,5 pontos percentuais, de 2,3% para 3,8%.

Nesta quarta-feira, o Eurostat confirmou que a taxa de inflação homóloga subiu, em Dezembro, para os 2,9% na zona euro, indicando ainda que a da União Europeia (UE) aumentou para 3,4%, invertendo a tendência em baixa.

Embora reconheça que, no cenário actual, se esteja a formar um consenso para um alívio nos juros em breve, Lagarde tenta deitar água na fervura, considerando que as expectativas demasiado altas dos mercados podem ser um problema. "Não ajuda no combate à inflação se as expectativas são demasiado altas comparadas com o que é provável que aconteça", observou.

Nos últimos dias tem-se registado uma sucessão de declarações e entrevistas de diferentes membros do BCE que mostram que, do lado dos chamados "falcões" (que defendem uma política monetária restritiva por mais tempo), se considera que o combate à inflação por via do aumento dos juros está a ter sucesso, o que permite pensar num alívio. Ao mesmo tempo, do lado das "pombas" (que defendem uma política monetária menos restritiva), reconhece-se que ainda é cedo para declarar vitória.

Um dos mandatos do BCE é a estabilidade dos preços na zona euro, mantendo a inflação controlada em torno de um valor a rondar os 2%. Klaas Knot, líder do banco central dos Países Baixos e considerado um desses "falcões", reconheceu, numa entrevista à cadeia de televisão CNBC, que o conselho de governadores está "optimista" quanto a esse objectivo, antevendo que a meta é atingível em 2025, mas alertou que "ainda há muito trabalho pela frente". Diz ainda que "os mercados estão muito à frente" da realidade, o que pode ser contraproducente.

Philip Lane, economista-chefe do BCE, é visto como um dos "moderados". Disse no sábado passado, ao jornal italiano Corriere della Sera, que um corte demasiado rápido nos juros poderia alimentar uma nova onda inflacionária. "Uma descida em falso, demasiado veloz, pode ser autodestrutiva", avisou.

Constantinos Herodotou, igualmente visto como uma das "pombas", secundou essa opinião quando, numa entrevista ao jornal online Econostream Media, considerou que ainda é cedo para pensar no alívio dos juros ou para especular sobre o calendário de um novo ciclo de corte nas taxas.

Para o presidente do Bundesbank alemão, Joachim Nagel, a inflação continua alta e, como tal, é extemporâneo discutir a descida nos juros. Nagel é visto como outro "falcão" dentro do órgão do BCE responsável pela fixação da política monetária.

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