Um “bastião de anti-semitismo desenfreado”: Harvard processada por estudantes judeus

Seis estudantes acusaram a universidade de aplicar selectivamente políticas anti-discriminação, evitando proteger estudantes judeus do assédio e de ignorar os seus apelos por protecção.

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Brian Snyder / Reuters
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A Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, está a ser processada por estudantes judeus que acusam a instituição de permitir que o seu campus se tornasse num "bastião de anti-semitismo desenfreado". Numa queixa apresentada na noite de quarta-feira, seis estudantes acusaram Harvard de aplicar selectivamente as suas políticas anti-discriminação para evitar proteger os estudantes judeus do assédio, ignorando os seus apelos por protecção e contratando professores que apoiam a violência anti-judaica e que espalham propaganda anti-semita.

"Com base no seu histórico, é inconcebível que Harvard permitisse que qualquer grupo que não os judeus fosse alvo de abusos semelhantes ou, sem resposta, que estudantes e professores apelassem à aniquilação de qualquer país que não seja Israel", lê-se na queixa a que a agência Reuters teve acesso.

Os estudantes invocam o título VI da Lei dos Direitos Civis de 1964, que proíbe beneficiários de fundos federais, como Harvard, de permitir a discriminação racial, religiosa ou como base na origem nacional. A entrada do processo acontece uma semana depois de a presidente da universidade, Claudine Gay, ter anunciado a sua demissão ao fim de apenas seis meses no cargo, não resistindo a uma polémica que pôs em causa o posicionamento da instituição sobre os limites da liberdade de expressão e o discurso anti-semita.

A queixa foi apresentada no tribunal federal de Boston e do grupo de queixosos faz parte Alexander Kestenbaum, estudante da Harvard Divinity School, cinco estudantes anónimos das escolas de Direito e Saúde Pública de Harvard e a organização sem fins lucrativos Students Against Antisemitism. Outras universidades, incluindo a Universidade de Nova Iorque, a Universidade da Califórnia (Berkeley) e a Universidade da Pensilvânia, enfrentam processos semelhantes.

Instituições académicas em vários países têm sido abaladas por conflitos em torno da liberdade de expressão e o direito de protesto desde a eclosão da guerra Israel-Hamas em Gaza. Em Novembro, o Departamento de Educação dos EUA abriu uma investigação sobre a forma como Harvard lidou com o anti-semitismo no campus, depois de iniciar investigações em várias outras instituições de ensino.

De acordo com a denúncia, o anti-semitismo não é inédito em Harvard, que foi fundada em 1636 e está entre as universidades mais prestigiadas do mundo, mas aumentou desde o ataque do Hamas a 7 de Outubro de 2023. Mais de 30 grupos de estudantes da escola assinaram uma petição no dia seguinte ao ataque, culpando Israel.

Os queixosos dizem que Harvard demorou um dia a responder, oferecendo "banalidades", mas sem condenar a petição ou o Hamas, nem apoiar os estudantes judeus. Mas depois de um camião com cartazes que identificavam os membros dos grupos que apoiavam a petição ter circulado pelo campus, Harvard respondeu em força, oferecendo-se para proteger esses estudantes do “ataque repugnante à nossa comunidade”.

"Os dois pesos e duas medidas de Harvard são injustificados e ficar sentado de braços cruzados e permitir uma escalada de hostilidade aos judeus para que as pessoas possam expressar-se livremente não constituiu protecção", dizia a queixa.

Dois dos estudantes de Direito, ambos "visivelmente judeus", com base nas roupas que estavam a usar, dizem que foram regularmente hostilizados nos corredores da faculdade de Direito e que Harvard permitiu que manifestantes anti-judaicos gritassem slogans como "glória aos mártires" dentro da instituição.

A denúncia afirma que o preconceito de Harvard se estende até às admissões, incluindo um suposto declínio de 60% no número de estudantes judeus. “Harvard, a principal universidade da América, tornou-se um bastião de ódio e assédio anti-judaicos desenfreados”, alegam.

Os queixosos estão a pedir indemnizações compensatórias e punitivas e exigem que Harvard suspenda ou expulse estudantes que se envolvam em anti-semitismo e devolva doações destinadas à "contratação de professores anti-semitas ou à promoção de um currículo anti-semita".

“Está claro que Harvard não corrigirá voluntariamente o problema profundamente enraizado do anti-semitismo”, disse o advogado dos estudantes, Marc Kasowitz, cuja firma também entrou com acções judiciais na Universidade de Nova Iorque e Penn.