Uma orquídea encontrada num vulcão “adormecido” é uma das espécies do ano de 2023

Especialistas dos Jardins Botânicos Reais de Kew elegeram dez conjuntos de espécies de plantas e fungos descobertos em 2023. Orquídeas raras e líquenes na Antárctida são alguns dos eleitos.

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A nova orquídea encontrada na Indonésia Yanuar Ishaq Dwi Cahyo
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E boom: de um vulcão “adormecido” na Indonésia surgiu uma nova orquídea para a ciência. Uma subespécie da espécie Dendrobium lancilabium foi uma das novas plantas descritas em 2023. Pode estar escondida num vulcão agora bem sossegadinho, mas as suas cores avermelhadas são explosivas garante quem a viu ao vivo. Mas não fica por aqui. O ano de 2023 trouxe à ribalta muitas outras espécies de plantas. Cientistas dos Jardins Botânicos Reais de Kew, perto de Londres, decidiram destacar dez grupos de plantas e de fungos que foram descritos, pela primeira vez, no ano passado.

Esta lista é apenas um vislumbre do conjunto de espécies descoberto e divulgado todos os anos. Estima-se que, todos os anos, sejam encontradas cerca de 2500 novas espécies de plantas e à volta de 2500 espécies de fungos. Contudo, há muito mais por descobrir: haverá cerca de 100.000 espécies de plantas por identificar. Já as espécies de fungos por descobrir ultrapassam os 2,5 milhões — só conhecemos 150.000.

“É obrigatório que agora, mais do que nunca, façamos tudo o que está ao nosso alcance para tentar ir para o terreno com os nossos parceiros e descobrir quais as espécies de plantas e fungos que ainda não têm uma descrição científica”, assinala Martin Cheek, responsável científico pela equipa de África dos Jardins Botânicos Reais de Kew. “Se não o fizermos, corremos o risco de perder essas espécies sem nunca as termos conhecido.” Em 2023, juntamente com os seus parceiros, os cientistas dos Jardins Botânicos Reais de Kew descobriram 74 espécies de plantas e 15 de fungos.

Agora, os especialistas fizeram um top 10 com algumas das plantas e fungos que foram uma novidade em 2023. Eis a lista:

Uma orquídea “salva” por uma ave...

Esta é a história de como uma ave pode salvar uma planta. Na ilha de Madagáscar, há muitos anos que uma comunidade local luta pela protecção de uma ave muito rara de seu nome científico Euryceros prevostii. Para garantir essa protecção, a comunidade pede uma pequena quantia aos visitantes que a queiram ver, o que contribui para a protecção da floresta. A preservação da floresta acabou por permitir a conservação de uma espécie de orquídea rara, a Aeranthes bigibbum, que foi descrita pelos cientistas no ano passado.

Com um aspecto etéreo, esta orquídea foi descoberta pelo botânico Johan Hermans e passou a integrar as cerca de 45 espécies do seu género, o Aeranthes. A maioria delas pode ser encontrada em Madagáscar.

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A nova espécie de orquídea encontrada na ilha de Madagascar Johan Hermans

... e outra no cume de um vulcão “adormecido”

Uma outra orquídea foi descrita na Indonésia. Recuemos a 2020. Nesse ano, um grupo de cientistas visitou a ilha de Waigeo e observou orquídeas que já não eram vistas há 80 anos. E descobriram-se outras novas. Uma subespécie da espécie Dendrobium lancilabium, a wuryae, foi uma das plantas desse conjunto identificadas no cume de um vulcão extinto. A sua descrição no comunicado dos Jardins Botânicos Reais de Kew não lhe poupa elogios: refere-se que é “espectacular” e tem “flores de um vermelho brilhante”. Esta é a 9.ª orquídea a ser descrita desde 2022 na zona da Indochina e do Sudeste asiático.

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A nova subespécie de orquídea descoberta na Indonésia distingue-se pelas suas flores avermelhadas Yanuar Ishaq Dwi Cahyo

Uma violeta em perigo na Tailândia

Apenas agora foi descrita e já está ameaçada é esta a sina da Microchirita fuscifaucia, uma violeta descoberta na Tailândia. Até ao momento, esta espécie apenas foi encontrada em dois locais e nenhum deles tem protecção ambiental. Outras plantas do mesmo género o Microchirita estão distribuídas pelo continente asiático. Das cerca de 47 espécies desse género, 37 foram identificadas pela Tailândia. Crescem em zonas com rochas calcárias e a cor das suas flores pode ser branca, amarela ou laranja.

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Nova violeta encontrada na Tailândia já está ameaçada Naiyana Tetsana

“Árvores subterrâneas” em Angola

Baphia arenícola e Cochlospermum adjanyae são estes os nomes científicos de duas espécies de “árvores subterrâneas” (ou subarbustos geoxílicos) encontrados em Angola e descritos recentemente. Estas formas de vida com grandes estruturas lenhosas subterrâneas daí serem conhecidas como “árvores subterrâneas” foram descobertas pelo explorador David Goyder, durante expedições da National Geographic. Se da Baphia arenicola brotam flores brancas, da Cochlospermum adjanyae saem flores amarelas. Esta última foi nomeada em honra da exploradora da National Geographic Adjany Costa.

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A Baphia arenicola é uma das espécie de “árvores subterrâneas” identificada em Angola David Goyder

Uma palmeira escondida no subsolo

A Pinanga subterranea foi descoberta por acaso. Um cientista malaio alertou os seus colegas dos Jardins Botânicos Reais de Kew para a existência de uma palmeira muito particular na ilha do Bornéu, no Sudeste asiático, que floresce quase exclusivamente no subsolo. Mas, se esta é uma nova espécie descrita pelos cientistas, a comunidade local já conhecia a planta e os seus frutos.

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Nova para a ciência, a Pinanga subterranea já era conhecida pela comunidade local William J. Baker

Nove novas espécies de tabaco num parque natural

Ao todo, em 2023, foram nove as espécies da planta do tabaco do género Nicotiana descritas na Austrália pelos cientistas Mark Chase e Maarten Christenhusz. A Austrália tem mais de 90 espécies de tabaco conhecidas e estas nove foram identificadas no Parque Nacional Cocoparra, um parque natural no Leste do país. A distinção destas espécies só foi possível devido a um trabalho de estudos genéticos e taxonómicos.

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Nicotiana olens é uma das novas espécies de tabaco identificadas na Austrália Maarten Christenhusz

Nova espécie também ameaçada na África do Sul

A Indigofera abbottii é uma das mais recentes espécies do género Indigofera, que é conhecido por muitas das suas plantas produzirem pigmentos azuis para as suas roupas. Já são mais de 750 os membros desta família e quase 100 descobertos por Brian Schrire, um investigador honorário dos Jardins Botânicos Reais de Kew, que também integra a equipa que descobriu a nova espécie. Com flores de um tom rosado, a nova Indigofera já está ameaçada, devido ao excessivo uso agrícola do seu habitat e à construção de imobiliário.

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A Indigofera abbottii na África do Sul G. Grieve

Uma nova carnívora em Moçambique?

Ainda é um mistério: a Crepidorhopalon droseroides consegue atrair e criar armadilhas a insectos, mas não se sabe, ao certo, se os consegue digerir. A descoberta é atribuída ao botânico Bart Wursten em Moçambique e foi baptizada com o género Crepidorhopalon, que não está ligada a nenhuma planta carnívora. Fica a pergunta: é ou não é carnívora? Uma questão que será respondida por cientistas nos próximos anos.

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Ainda não se sabe se a Crepidorhopalon droseroides é carnívora Bart Wursten

Mais um fungo na Coreia do Sul

A nova espécie de fungo Lichtheimia koreana foi isolada, pela primeira vez, na Coreia do Sul em 2020 e depois em 2023, a partir de resíduos provenientes da produção de óleo de soja. A questão que se coloca é: será que causa doenças? Por agora, espera-se que não tenha esse potencial, como têm outros fungos do seu género. “Felizmente, não é muito parecida com as três espécies patogénicas [do seu género], e os cientistas acreditam que o seu potencial patogénico é limitado”, refere-se no comunicado. Até agora, conhecem-se, pelo menos, seis espécies do género Lichtheimia.

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Novo fungo encontrado na Coreia do Sul Hyang Burm Lee

E três líquenes na Antárctida

A colheita foi feita perto da base espanhola na Antárctida em 2018, mas apenas no último ano foram descritas como três novas espécies de líquenes. São elas: a Arthonia olechiana, a Sphaeropezia neuropogonis e a Sphinctrina sessilis. Todos estes líquenes um “casamento” entre fungos e algas crescem nas partes rochosas da Antárctida e foram descritos pela equipa da micóloga Raquel Pino Bodas.

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Um dos novo líquenes descobertos na Antárctida J. Etayo