A camélia-japoneira dos jardins centenários da Villa Margaridi, em Guimarães, é a árvore portuguesa deste ano, depois de ter vencido a votação online da 7.ª edição do concurso Árvore Portuguesa do Ano 2024. Agora, vai representar Portugal na competição Árvore Europeia do Ano.
Esta é a segunda vez consecutiva que uma espécie exótica vence o concurso da árvore do ano, com a camélia-japoneira que veio do Oriente a conquistar o primeiro lugar, com 3900 votos, “na votação mais elevada de todas as edições para o primeiro lugar”, destaca, em comunicado, a União da Floresta Mediterrânica – UNAC.
O exemplar é “representante da história portuguesa e das relações comerciais entre Portugal e o Japão”, tendo a introdução desta espécie exótica em território nacional ocorrido “através dos marinheiros das naus dos Descobrimentos que traziam e levavam sementes de diferentes espécies entre os vários pontos do mundo”, realça a nota.
A União da Floresta Mediterrânica – UNAC sublinha ainda que “foi agora a vez de uma árvore estritamente ornamental vencer este concurso”. O exemplar foi considerado de interesse público pelo Despacho n.º 837/2022, devido ao seu desenho em forma de campânula, com 6,30 metros de diâmetro e 6,15 metros de altura, sendo esta “a confirmação de que se trata de um exemplar centenário baseada na construção e manutenção dos jardins desde o final do século XVII e pelo significado paisagístico, enquanto elemento de referência no enquadramento do tanque lavrado situado no terreiro frontal à Casa de Margaride, também ela classificada como monumento de interesse público”.
Uma árvore que tem uma flor de Inverno
Rita Salgado, arquitecta paisagista da Câmara Municipal de Guimarães, foi a responsável por submeter a candidatura da camélia-japoneira (da espécie Camellia japonica) dos jardins centenários da Villa Margaridi (ou Casa de Margaride) ao concurso Árvore Portuguesa do Ano 2024.
“Escolhi esta camélia pela sua história, pelo seu corte invulgar, pela casa em si e pelos jardins”, conta ao PÚBLICO a arquitecta paisagista. A Casa de Margaride já celebrou mais de mil anos de existência, tendo o actual proprietário continuado “o legado”, ao cuidar do jardim em questão e das camélias que dele fazem parte – incluindo a recente vencedora do título.
O exemplar que venceu o primeiro lugar do concurso encontra-se “junto à entrada da quinta”, perto de um “pequeno tanque” e de uma parede adornada com “várias inscrições e textos sobre os antepassados da quinta”. Esta árvore está, portanto, “enquadrada num sítio mais cénico” – e não dentro do jardim murado que faz parte da casa –, destacando-se “pelas formas e pela beleza das flores que agora estão a começar a surgir”, acrescenta Rita Salgado. Não fosse, aliás, a camélia uma árvore que “tem uma flor de Inverno”.
A arquitecta paisagista sublinha ainda que “a camélia é uma planta que se adaptou muito bem ao nosso clima, é muito resistente e típica do Minho e do Norte de Portugal”. “Quase todas as casas e quintas antigas nos seus jardins formais têm camélias”, diz.
Neste caso, destaca-se o “cuidado” e “dedicação” que o proprietário da Casa de Margaride investiu (e continua a investir) nas suas árvores, salienta Rita Salgado, que diz ter ficado “muito contente” com o prémio. “Acima de tudo, é uma representação de Guimarães e de Portugal na Europa.”
Simbiose entre humanos e a natureza
Palavras ecoadas por José Couceiro da Costa, proprietário da Casa de Margaride, que sublinha que esta é uma “vitória de toda uma comunidade”, a comunidade de Guimarães, e “de todo um país”, Portugal, que se uniu em torno de “uma espécie arbórea única”.
A camélia-japoneira de que aqui falamos, destaca o proprietário, “é um exemplar absolutamente icónico da simbiose entre o Homem e a natureza” e trata-se “apenas e só” de “uma árvore simples e singela que floresce no Inverno, numa altura em que tudo parece triste, sombrio, sem folhas, sem luz e sem brilho”.
José Couceiro da Costa conta ao PÚBLICO que a Casa de Margaride está na sua família desde o início do século XVI e que esta camélia-japoneira é um “exemplar multissecular”. “Temos uma fotografia desta árvore em Junho de 1912 e a árvore apresenta a mesma volumetria que apresenta hoje. Portanto, já em 1912 a árvore tinha esta copa, este detalhe e esta forma.”
Embora o site da União da Floresta Mediterrânica – UNAC indique que esta é uma camélia-japoneira com seis metros de altura, seis metros de perímetro do tronco e 300 anos de idade, o proprietário assume não conseguir “dizer exactamente a idade da árvore”. Mas, em vez de nos focarmos nesse aspecto, “todos nós, seres humanos, devemos mais estar preocupados com a defesa e protecção da biosfera e com o estado fitossanitário que as espécies arbóreas apresentam”, sugere José Couceiro da Costa. O concurso Árvore do Ano é, aliás, “particularmente singular porque vem despertar, de uma forma crescente, a consciência verde de todo o país e até mesmo de toda a Europa”, diz.
Mas voltemos à questão da simbiose. As camélias, afirma José Couceiro da Costa, podem apresentar duas formas: a sua forma selvagem, de crescimento natural; ou uma silhueta talhada pelos seres humanos. A arte da topiária em Portugal, no século XVIII, diz, seguiu “toda uma dramática discursiva do ponto de vista arquitectónico, que se iniciou em França”, com as árvores a serem talhadas e a ganharem uma forma idealizada pelo ser humano, o que representa a “simbiose entre o verde e o Homem”.
Todos os anos, refere o proprietário da Casa de Margaride, a colecção de 27 camélias centenárias é podada entre a última semana de Maio e a primeira semana de Junho – algo que acontece há várias “gerações”. “Só assim conseguimos assegurar a qualidade da sua silhueta, das suas formas, como também um óptimo estado fitossanitário. Portanto, a grande história que esta árvore tem é uma ligação umbilical da árvore e do Homem e do Homem e da árvore”, conclui José Couceiro da Costa, que garante que naquele jardim não se usa um único pesticida, herbicida ou insecticida.
Para concluir, o proprietário da camélia-japoneira vencedora admite ser “daquelas pessoas” que entendem que “o património verde precisa de muito mais protecção do que o património edificado”. “Para destruir a Torre de Belém, o Castelo de Guimarães ou a Domus Municipalis de Bragança é preciso muito tempo, muito esforço e muitos homens. Para se destruir o património verde basta uma atitude irreflectida, uma motosserra e três minutos.”
Além de “tudo aquilo a que a lei obriga”, os cuidados a ter com uma árvore classificada incluem “todo um bom senso, educação e um saber acumulado de gerações”, explica José Couceiro da Costa. O segredo é um: tentar “ao máximo preservar toda a biosfera em grande harmonia”.
Seguem-se um sobreiro e uma oliveira
O segundo lugar do concurso Árvore Portuguesa do Ano 2024 foi atribuído ao Sobreiro do Rei (em Mafra, Lisboa), com 3075 votos, e o terceiro lugar foi ocupado pela Oliveira do Peso (em Pedrógão, Vidigueira), com 2988 votos.
Dez árvores estavam a concurso, depois de terem sido seleccionadas por um júri constituído pelo economista António Bagão Félix, pelo engenheiro silvicultor Rui Queirós, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, por Francisco Teotónio Pereira, produtor do programa Faça Chuva ou Faça Sol, e por João Maria Salgado de Goes, director da União da Floresta Mediterrânica – UNAC. Foram sugeridas como candidatas a esta edição 44 árvores, entre as quais foram seleccionadas dez, de acordo com critérios biológicos, estéticos, de dimensão e históricos.
As árvores eleitas a concurso incluíam um plátano de Alijó com 35 metros de altura; uma azinheira com 250 anos de São Brás de Alportel; a camélia com 300 anos de Guimarães; um cedro de 44 metros de Vila Real; uma nogueira-do-japão com raízes em Mafra; uma magnólia com mais de 200 anos de Mangualde; uma oliveira com 3350 anos de Abrantes conhecida como Oliveira do Mouchão; uma mistura de zambujeiro e oliveira de Pedrógão; um sobreiro de 16 metros do lugar da Quebrada (Arcos de Valdevez); e um sobreiro de 25 metros na Tapada Nacional de Mafra.
No total, foram contabilizados 24.758 votos, o número mais elevado desde que a competição se realiza. O concurso é organizado ao nível nacional pela União da Floresta Mediterrânica – UNAC e ao nível europeu pela Associação de Parceria Ambiental (EPA).
A camélia-japoneira vai agora representar Portugal no concurso Árvore Europeia do Ano de 2024, cujas votações decorrerão online em Fevereiro.
Em 2018, o Sobreiro Assobiador da aldeia de Águas de Moura, no concelho de Palmela, ficou em primeiro lugar no concurso europeu. No ano seguinte, a Azinheira Secular do Monte do Barbeiro, no concelho de Mértola, ficou em terceiro lugar. Em 2020, o castanheiro de Vales, no concelho de Vila Pouca de Aguiar, obteve o sexto lugar europeu e, em 2021, o plátano do Rossio de Portalegre ficou em quarto lugar. Mais recentemente, em 2022, um sobreiro de Arraiolos ficou em terceiro lugar e, no ano passado, o eucalipto de Contige ficou em quinto lugar na competição europeia.