“Aumento das prestações sociais não compensa gastos das famílias vulneráveis”

Natália Nunes, directora do Gabinete de Protecção Financeira (GAF) da Deco, alerta para a necessidade de planeamento das compras alimentares, à luz do fim da medida IVA Zero.

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Natália Nunes, directora do Gabinete de Protecção Financeira da Deco, a quem recorrem muitas famílias com dificuldades económicas Rui Gaudencio

O fim do IVA zero vai ter um forte impacto nas famílias de menores rendimentos?
Vai, sem dúvida. A nossa grande preocupação são as famílias de baixos recursos, as economicamente vulneráveis. Porque estas famílias gastam uma grande parcela do seu rendimento no supermercado, em alimentação, e outra grande fatia na renda da casa. São, habitualmente, as duas grandes despesas destas famílias, e ambas têm aumentos significativos este ano. No caso da alimentação não é só o fim do IVA zero, mas também os aumentos no pão e noutros bens essenciais, que os consumidores nos dizem que já estão a sentir. E juntam-se aos aumentos do custo dos serviços de telecomunicações, de electricidade e de outros. Tudo isso acaba por pesar significativamente no orçamento das famílias.

Mas as reformas e alguns apoios sociais também vão aumentar?
É verdade, e alguns aumentos até podem ser considerados significativos quando vistos isoladamente, nomeadamente nas pensões de reforma. Mas o problema é que na maior parte dos casos estamos a falar de reformas muito baixas, e apesar dos aumentos, o que as famílias recebem fica muito aquém daquilo que são as suas necessidades essenciais. Também é verdade que vai haver um aumento daquilo que são as prestações sociais. Mas, por aquilo que se conhece, o aumento das prestações sociais não compensa os gastos das famílias vulneráveis. Podem ser manifestamente insuficientes para ajudar as pessoas mais necessitadas. E há um apoio ao pagamento da renda para quem fez contratos de arrendamento até 15 de Março de 2023, ou para quem não cumpria os requisitos para ter acesso a esse apoio, e que pode agora pedir o pagamento do apoio para o aumento verificado em 2024. Mas a verdade é que os critérios de acesso deixam muitas famílias de fora.

O GAF tem recebido mais pedidos de ajuda das famílias?
Sim. A nossa preocupação tem muito que ver com os pedidos que nos chegam. É um bocadinho constrangedor que nos primeiros dois dias do novo ano, a maior parte das chamadas telefónicas, e são algumas dezenas por dia, esteja relacionada com os apoios que existem para este ano, o que espelha as preocupações das famílias mais vulneráveis. Depois há a situação de as famílias já estarem a suportar os aumentos de custos e de os seus rendimentos só aumentarem no final do mês. E este mês é muito comprido, como costumam dizer os consumidores.

Daí a importância do planeamento das despesas?
Sem dúvida. Especialmente antes de sairmos de casa para fazermos compras devemos ver o que é que efectivamente necessitamos. É para isso é extremamente importante haver um planeamento das refeições, e ver o que há no frigorífico ou na despensa, para não deixar passar de prazo produtos já adquiridos. Só assim ajustaremos a lista de compras ao que é mesmo necessário. Esta é uma das regras de ouro que devemos cumprir sempre. A outra é fazer uma comparação de preços. Geralmente, em momentos de crise, os consumidores fazem essa comparação, e vimos fazê-la em 2023. E é importante olhar não só para o preço final do produto, mas para o preço por quilo ou por litro, ou outra unidade de valor. Essa informação tem de estar na etiqueta do preço, que é um elemento fundamental para o consumidor poder fazer comparação de preços e decidir. O consumidor tem direito a ter esta informação. E o apelo que deixo é para que os consumidores também sejam mais zelosos daquilo que são os seus direitos, denunciando as situações em que essa informação não está disponível, para as autoridades competentes poderem actuar.

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