Grécia admite compensar Museu Britânico pela devolução dos mármores do Pártenon
Ministra da Cultura Lina Mendoni equaciona preencher o vazio no museu de Londres com o empréstimo de outros tesouros da Grécia antiga. Mas há ainda caminho a percorrer.
É mais um capítulo no difícil e prolongado processo de negociações entre as autoridades culturais e políticas da Grécia e do Reino Unido com vista à reclamada devolução a Atenas dos mármores do Pártenon, que desde o início do século XIX se encontram no Museu Britânico. A ministra grega da Cultura, Lina Mendoni, equaciona a possibilidade de o seu país compensar a instituição londrina preenchendo “o vazio” nela deixado pela restituição daquele património através de ciclos de exposições com outros tesouros da Grécia antiga.
Numa espécie de balanço de mais um ano marcante no processo de recuperação das obras-primas do século V a.C. que pertenceram ao Pártenon e à Acrópole de Atenas, Mendoni disse ao diário The Guardian: “A nossa posição é clara: se as esculturas forem reunidas em Atenas, a Grécia está pronta a organizar exposições cíclicas de antiguidades importantes que preencheriam esse vazio.”
Não entrando em pormenores quanto às características e à extensão do património que o seu país estaria disposto a emprestar ao Museu Britânico, a ministra esclareceu que as negociações em curso não chegaram ainda a esse ponto, nem avançou até onde o Governo de Atenas poderia ir para assegurar a restituição dos também chamados “Mármores de Elgin”. Considerou, no entanto, que as peças e colecções a enviar seriam de molde a manter o interesse dos milhões de visitantes que anualmente entram na instituição de Londres. E, desde que o primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis (Nova Democracia) assumiu o poder, em 2019, já se tem falado – avança o Guardian – na possível cedência temporária de uma peça como a Máscara de Agamemnon, considerada a “Mona Lisa” da Pré-História.
“Qualquer acordo e todos os seus pontos teriam sempre de respeitar a lei grega relativa ao património cultural”, esclareceu Mendoni, diplomada em Arqueologia pela Universidade de Atenas.
“Um roubo em série”
Há muito que o Governo grego vem exigindo a restituição dos mármores do Pártenon, que, no início do século XIX, foram removidos dos seus lugares neste templo e na Acrópole de Atenas – classificada como Património da Humanidade – por Lord Elgin (1766-1841), embaixador britânico junto do Império Otomano, que então governava a Grécia.
Em 1816, quando o embaixador se encontrava falido, esse acervo – perto de metade do friso de 160 metros que representava uma procissão dedicada à deusa Atena, além de mais de três dezenas de esculturas e painéis esculpidos – foi-lhe adquirido pelo Museu Britânico, tornando-se numa das peças mais emblemáticas da sua colecção.
Para a Grécia, Elgin, e o Museu Britânico por associação, são culpados de “um acto gritante de roubo em série”, lembrou Lina Mendoni no passado mês de Novembro.
Nessa altura, acreditava-se que se iria avançar num acordo, “uma parceria adequada”, como em Outubro admitira George Osborne, presidente do Conselho de Administração do museu, numa reunião do Comité de Cultura, Media e Desporto do Parlamento britânico. “Isso significaria que peças da Grécia poderiam vir para cá, peças que nunca antes saíram da Grécia e certamente nunca foram vistas cá, enquanto peças da colecção do Pártenon poderiam viajar para a Grécia”, acrescentou na altura o responsável, agora também recordado pelo Guardian.
Mas essa atmosfera acabaria por ser toldada pelo incidente diplomático provocado, no final de Novembro, pela recusa do primeiro-ministro Rishi Sunak de se encontrar com o seu homólogo grego Mitsotakis, quando de uma visita deste a Londres – na altura, o governante britânico reafirmou o princípio de que os mármores do Pártenon não poderiam ser devolvidos à Grécia por “razões legais”.
Embora insista que a Grécia não pode negociar o empréstimo de tesouros que lhe foram saqueados, a ministra Mendoni diz que o seu Governo irá continuar a “fazer pleno uso das possibilidades oferecidas pelo diálogo e pela diplomacia cultural”. Uma posição que, associada à aparente receptividade de George Osborne – que, assinala o Guardian, é o primeiro presidente do Museu Britânico a reconhecer publicamente a controvérsia da presença de antiguidades na instituição –, pode suavizar a acrimónia de uma das mais antigas disputas culturais e patrimoniais da Europa, com ambos os lados a abordarem a questão já não na perspectiva das perdas mas dos ganhos que cada parte poderá reclamar no final de um eventual acordo.
O Guardian lembra, a propósito, o resultado de uma sondagem realizada no passado mês de Julho, que mostrou que 64% dos cidadãos do Reino Unido defendem a restituição dos mármores do Pártenon – um dado que vem reforçar o argumento moral dos gregos para reclamar a restituição do seu património.