O que representa a conquista de Marinka pelos russos?

Ucrânia reconhece que perdeu a cidade no Donbass ao fim de muito tempo de resistência. Rússia anuncia-a como grande vitória. Instituto para o Estudo da Guerra diminui a importância estratégica.

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Marinka tem sido alvo de combates desde 2014 que se acentuaram com a invasão russa da Ucrânia Reuters/STRINGER
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Militares ucranianos disparam contra as tropas russas perto da cidade de Marinka Reuters/VIACHESLAV RATYNSKYI
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Se ter ou não página própria na Wikipédia é medida para avaliar a importância de um acontecimento, então a Batalha de Marinka foi importante. A página existe e está actualizadíssima: “Em 25 de Dezembro de 2023, a Rússia afirmou que as suas forças tinham capturado totalmente a cidade, mas os militares ucranianos negaram inicialmente a afirmação. O chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Ucrânia, Valery Zaluzhnyi [Zalujny, na transliteração portuguesa], confirmou a perda de Marinka no dia seguinte.”

Claro que os dois lados olharam para a conquista da cidade de forma diametralmente oposta. Para a Rússia, carente de boas notícias numa guerra mais ou menos estagnada, o controlo de Marinka, além da heroicidade da conquista, permite-lhe agora dominar um ponto estratégico. Como disse o Presidente russo, Vladimir Putin, no dia de Natal, a conquista de Marinka trouxe dois efeitos positivos: “O primeiro é afastarmos de Donetsk as unidades de combate inimigas. Em segundo, ao invadir esta área fortificada que o inimigo tem vindo a construir desde 2014, as nossas tropas são capazes de alcançar uma área operacional mais ampla.”

Kiev tentou minimizar o efeito da sua retirada para os arredores da cidade. Não só garantiu que as Forças Armadas ucranianas mantêm ainda o controlo de uma pequena parte de Marinka, como aquilo que os russos conseguiram foi conquistar um monte de destroços. Tal como Bakhmut, outra cidade da província de Donetsk que os russos passaram a controlar em Maio depois de uma batalha feroz, também Marinka foi obliterada pelos bombardeamentos e os combates e poucos edifícios permanecem de pé.

Como disse esta quarta-feira o secretário do Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia, Oleksii Danilov, aquilo que os russos capturaram foram “os restos de um assentamento” com as infra-estruturas destruídas, insistindo que “não há praticamente edifícios que tenham sobrevivido”.

Na terça-feira, na sua habitual análise dos avanços do conflito no terreno, o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW) dava pouca importância a Marinka, sublinhando que “representava um ganho táctico limitado russo”, sem “qualquer avanço operacionalmente significativo, a não ser que as forças russas tenham melhorado drasticamente a sua capacidade de efectuar movimentos rápidos e mecanizados para a frente, algo que não mostram sinais de ter acontecido”.

No entanto, o ISW é um think tank norte-americano com sede em Washington, e Marinka fazia parte da linha defensiva ucraniana desde 2014. Em 2015, o então comandante ucraniano Valentin Manko, referindo-se à guerra com os separatistas apoiados por Moscovo, dizia que, se acontecesse “um avanço separatista no distrito de Marinka (no ano passado, os russos chegaram a controlar a cidade, mas voltaram a perdê-la), as forças ucranianas poderiam ver-se a braços com mais um cerco”, como tinha acontecido nesse ano quando haviam perdido outra cidade da região de Donetsk, Debaltseve.

Desde 2014 que a Rússia, primeiro por interpostas forças separatistas e desde a invasão da Ucrânia, em Fevereiro de 2022, com os seus próprios soldados, tentava conquistar Marinka. Nove anos de forte investimento em vidas e material para ser apenas um avanço simbólico.

O ISW refere que bloggers militares russos falam da captura de Marinka “como uma vitória táctica” que irá permitir “às forças russas conduzir operações ofensivas em direcção a localidades situadas até 15km a oeste de Marinka nas próximas semanas e meses, ameaçando as linhas de comunicação terrestres ucranianas mais próximas”.

Os especialistas do think tank norte-americano discordam, pois “um assentamento pequeno e completamente destruído não oferece às forças russas um ponto de apoio operacional seguro a partir do qual possam lançar novas operações ofensivas”.

“Marinka situa-se a menos de um quilómetro da linha da frente anterior à invasão e as forças ucranianas há muito que fortificaram muitas das povoações circundantes, que as forças russas têm igualmente lutado para capturar”, acrescenta o ISW.

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