Crise política guineense tem nova etapa com exoneração do primeiro-ministro

Geraldo Martins mostrara-se indisponível para liderar um governo sobre o qual não tinha qualquer controlo. Esta quarta-feira, o Presidente, Umaro Sissoco Embaló, afastou-o do cargo.

Foto
O decreto presidencial do Presidente guineense está assinado como general Umaro Sissoco Embaló ANTONIO COTRIM/LUSA

O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, demitiu esta quarta-feira o primeiro-ministro, Geraldo Martins. Sem apresentar qualquer justificação, o Gabinete de Comunicação e Relações Públicas limitou-se a informar em comunicado que o chefe de Estado, “fazendo uso das suas competências”, decidiu exonerar “o senhor Geraldo João Martins do cargo de primeiro-ministro”.

Horas mais tarde, um novo decreto presidencial vinha nomear Rui Duarte de Barros como novo primeiro-ministro. Antigo ministro da Economia e Finanças que chegou a exercer o cargo de primeiro-ministro de transição em 2012, Barros, em tempos, politicamente próximo do Partido de Renovação Social (foi o falecido Kumba Yalá que o nomeou ministro em 2002), foi eleito nesta legislatura deputado pela Coligação PAI-Terra Ranka.

Geraldo Martins não terá aceitado ser primeiro-ministro de um governo do qual não tinha controlo e, na terça-feira, segundo o jornal Última Hora, ter-se-á mostrado indisponível para continuar no cargo. Reconduzido no cargo depois de o Presidente ter dissolvido, a 4 de Dezembro, a Assembleia Nacional à revelia da Constituição do país e declarar a queda do Governo saído das eleições de Junho, Martins não quis manter-se num executivo em que a sua chefia seria apenas de nome.

Informações que chegam de Bissau dão conta de que Embaló pretendia escolher uma dezena dos ministros e que estes lhe responderiam a ele e não ao primeiro-ministro, a quem a Constituição atribui o papel de chefia do executivo. Geraldo Martins tentou demover o chefe de Estado das suas intenções, mas na terça-feira já era dado como adquirido que não havia conseguido e a sua exoneração era uma questão de horas.

A Coligação PAI-Terra Ranka, que venceu com maioria as eleições de 4 de Junho, liderada pelo PAIGC, de que Geraldo Martins é vice-presidente, convocou uma reunião para esta quarta-feira para analisar a situação. Em comunicado, a coligação acusa o chefe de Estado de querer “chamar ao poder pessoas e formações políticas que o povo rejeitou de forma categórica nas eleições legislativas de há seis meses”.

A coligação refere que aceitou, num “espírito de diálogo”, integrar um executivo de iniciativa presidencial que considera inconstitucional por o Presidente ter dissolvido o Parlamento antes do limite de tempo imposto pela Constituição. Mas, “apesar da disponibilidade e determinação do primeiro-ministro em colaborar com o Presidente da República” para “encontrar uma saída para a crise”, Embaló “persistiu em pessoalizar o novo Governo e em não respeitar a vontade popular manifesta nas urnas”.

Foto

“A Coligação PAI-Terra Ranka declara-se por isso indisponível para aceitar a nomeação de qualquer chefe de governo e respectivos membros que o não sejam por sua indicação e livre escolha, tendo em conta o estatuído na Constituição da República.” E exige ao Presidente “a reposição efectiva do Governo do PAI-Terra Ranka liderado pelo exmo. senhor dr. Geraldo João Martins e a retoma do normal funcionamento da Assembleia Nacional Popular”.

Num país onde “muitos já começam a demonstrar sinais de cansaço e de desespero”, como referiu na terça-feira a Igreja Católica na sua mensagem de Natal, este novo passo no caminho da crise só virá fazer com que fiquem mais “desesperados com a situação de instabilidade política”.

Sem reflectir grande esperança no futuro imediato do país, a declaração do bispo de Bissau, José Lampra Cá, e do padre Lúcio Brentegani, da diocese de Bafatá, citada pela Lusa, é antes a constatação de que, “infelizmente”, há quem não queira e “não aceite que os guineenses possam viver tempos de paz num caminho de desenvolvimento e de fraternidade”.

Sugerir correcção
Comentar