Bons resultados na Madeira justificados com medidas “vetadas” no Continente

Medidas como a recuperação integral do tempo de serviço dos docentes ajudaram a que a Madeira obtivesse, por exemplo, os melhores resultados em Leitura: 487 pontos contra os 477 da média nacional.

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Mais de metade dos alunos da Madeira recebem apoios sociais Nelson Garrido (arquivo)
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Paz nas escolas e possibilidade de estas seleccionarem professores são duas das razões apontadas pelo Secretário Regional de Educação da Madeira para os bons resultados dos alunos do arquipélago na última edição do PISA (Programme for International Student Assessment).

Em respostas por escrito ao PÚBLICO, Jorge Carvalho resume assim este desempenho: “Os resultados alcançados pelos alunos madeirenses situaram-se acima das médias da OCDE, de Portugal e da Região Autónoma dos Açores”. Para revelar de seguida que estas “são referências importantes, sobretudo no último caso, por se tratar igualmente de uma região insular e ultraperiférica, com condições de dupla insularidade”.

Comparando os resultados por NUT II, que foi a forma escolhida pelo Instituto de Avaliação Educativa (Iave) para os apresentar, constata-se que os melhores resultados em Leitura foram alcançados pela Madeira (487 pontos quando a média nacional se ficou pelos 477)

A Matemática e a Ciências, as outras duas literacias testadas pelo PISA, a região ficou em segundo lugar. Já os Açores situaram-se no pólo posto, recolhendo os resultados médios mais baixos dos testes PISA realizados em 2022.

Sobre os resultados alcançados pela Madeira, Jorge Carvalho lembra que, ao contrário do Continente, a região “desencadeou um processo de recuperação integral do tempo de serviço dos docentes, o qual se concluirá no ano lectivo 2024/25”. Por outro lado, acrescenta, “na gestão dos recursos docentes, as escolas gozam da prerrogativa de seleccionarem directamente, para os seus projectos de promoção do sucesso, até 15% do seu quadro”, o que no Continente voltou a ser vetado pelos sindicatos de professores no ano passado.

“Acresce que 96% dos professores em exercício na região detêm vínculo permanente”, informa ainda o Secretário Regional de Educação, que faz esta síntese: “Numa palavra, temos escolas que funcionam em clima de paz social, alunos que têm aulas durante todo o ano lectivo e docentes comprometidos com a sua missão.”

O presidente da secção da Madeira da Associação Nacional de Professores, Luís Alves, é parco nas palavras: “Estes resultados são a consequência de não haver greves de professores e outros profissionais da educação e assim ser garantida a estabilidade nas escolas, o que contrasta com o caos instalado nas escolas nacionais nos últimos dois anos”.

Condições para o sucesso

O investigador da Universidade da Madeira Carlos Fino começa por ressalvar que não é “grande adepto do PISA”. “Sob a capa da comparabilidade, tem vindo a reforçar a estandardização dos sistemas educativos e dos processos neles utilizados, deixando pouco espaço para a descentralização curricular e para a inovação pedagógica, por exemplo”. Especialista em inovação pedagógica, é também um crítico dos rankings das escolas,

Dito isto, Carlos Fino especifica que “a Madeira tem todas as condições para que o seu subsistema educativo produza bons resultados, independentemente do desempenho no PISA, ou nos exames nacionais”. E quais são essas condições? “Tem professores motivados ou, pelo menos, sem o stress e o alarido de uma luta desgastante com o Ministério da Educação para recuperarem o tempo de serviço. Tem um território de pequena dimensão e uma tutela próxima, que goza de estabilidade política há décadas. Tem um número de alunos que vem diminuindo por razões demográficas, o que abre a possibilidade de existência de turmas de dimensão mais favorável”.

“Ou seja, se existem condições de sucesso, elas estão materializadas na região autónoma da Madeira, como, talvez, em nenhum outro território do país. Um dia, até os testes PISA reparariam nisso”, conclui este investigador.

Jorge Carvalho salienta também que a Madeira “adoptou, desde 2015, uma estratégia de melhoria contínua no sector da educação, pugnando pela alteração positiva dos processos conducentes à conquista, desenvolvimento e consolidação das diferentes literacias que devem projectar-se no perfil de competências à saída da escolaridade obrigatória”. “Os indicadores disponíveis registam essa melhoria e cada patamar alcançado é ponto de partida para outro mais elevado”, informa ainda.

Segundo os últimos dados estatísticos publicados Governo Regional da Madeira, do pré-escolar ao secundário, a Madeira conta com 5861 professores e educadores, contabilizando um total de 39.663 alunos. Mais de metade (54%) beneficiam de apoios sociais, uma percentagem que no Continente ronda os 40%.

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