Power Play, uma moderna história política de época
A série norueguesa sobre Gro Harlem Brundtland, a primeira primeira-ministra do país, passa-se nos anos 1970, mas é filmada na Noruega dos dias que correm. Estreia-se nesta terça na Filmin.
A norueguesa Gro Harlem Brundtland era filha de um político, mas entrou na política por acaso, aos 35 anos. Era médica e activista pró-aborto. Nos anos 1970, o partido trabalhista, que estava no poder há vários anos, precisava de uma mulher, uma qualquer, para ter como ministra. Não lhe iam dar um ministério importante, muito menos um que tivesse que ver com a sua área de formação e especialidade, como a saúde ou assim. Não, puseram-na no ambiente, uma pasta a que ninguém ligava muito. Mas ela provou ser tão competente e firme como política que acabou, depois de uma série de intrigas internas, por se tornar a primeira mulher a ser primeira-ministra da Noruega, isto em 1981 – também foi, por exemplo, a primeira académica a dirigir o seu partido. Durou pouco tempo, mas voltaria depois a servir dois mandatos, entre 1986 e 1996.
É essa a história que é contada em Power Play, uma criação de Silje Storstein, Johan Fasting e Kristin Grue, que estiveram vários anos a desenvolver esta produção, para a NKR. Kathrine Thorborg Johansen, que pôde ser vista na série Netflix Ragnarok, faz o papel da médica tornada política, que ainda hoje é viva. A série ganhou este ano os prémios de melhor série e melhor música no Canneseries, o festival de séries de televisão de Cannes, e teve estreia na sua Noruega natal no final do Outubro. A primeira temporada chega agora a Portugal, via Filmin, com estreia na terça-feira. São seis episódios, rodados em simultâneo com os seis da segunda, que virá depois.
"Power Play é um drama político baseado em verdades, mentiras e má memória", dizia a co-criadora Silje Storstein num vídeo do tal festival que foi conquistado pela série. Esta ideia das "verdades, mentiras e má memória" também aparece no início do episódio inaugural. O "drama", aqui, vem com doses muito generosas de comédia, e mal-entendidos e facadinhas nas costas de políticos nem sempre muito competentes à moda de The Thick of It ou Veep. Há uma certa ideia de falso documentário, a acompanhar os momentos privados destas pessoas e como se comportam nos corredores de poder. E ainda uma componente metarreferencial, com momentos em que há claquetes e recomeços de gravação, bem como texto em cima da imagem a explicar quem são as pessoas e entrevistas a personagens.
É uma série de época filmada, por Yngvild Sve Flikke, em película de 16mm na Oslo de hoje, sem grande esforço para disfarçar – há pessoas a passar na rua a mexer em telemóveis, vestidos com roupas modernas – o elenco principal não –, em frente a edifícios modernos. Não é comum, e ajuda a dar um toque de leveza, de não se levar demasiado a sério, permitindo à série não se cingir aos factos e evitar perder-se em discussões de pormenores que são comuns neste tipo de reconstituições.