COP28: fracassada ou histórica – afinal em que ficamos?

O que verdadeiramente se exige, se queremos olhar de frente para os impactos das alterações climáticas, é a ruptura com as políticas fundadas na exploração desenfreada da natureza e do homem.

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Recorrentemente, os ecos mediáticos de sucessivas Conferências das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, as chamadas COP, ressoam num estreito limbo que vai do fracasso nas negociações às decisões históricas. A COP28 não foi diferente.

Com toda a segurança, podemos afirmar que o nível de “ambição” apresentado foi gorado com os compromissos e medidas adoptadas, muito aquém das expectativas, mas sobretudo, aquém do que é necessário para responder à dimensão do problema com que nos confrontamos.

Na oportunidade que tive de estar presente no decorrer dos trabalhos da COP28, pude testemunhar a contradição evidente entre aquilo que são os interesses dos países desenvolvidos, onde se contam aqueles que maiores responsabilidades históricas têm nas emissões de gases com efeitos de estufa – inclusive por via da deslocalização de meios de produção e exploração de recursos através das suas transnacionais – e os países em vias de desenvolvimento, pressionados para a adopção de medidas de “mitigação”, “adaptação” e “transição”, mas aos quais os primeiros continuam a negar os recursos necessários para os investimentos que são chamados a realizar.

Esta e outras contradições tiveram expressão nos avanços e recuos negociais, prolongando a COP28 para lá do prazo inicialmente previsto, o que já não vai sendo novidade.

Algumas decisões foram tomadas. É o caso da constituição de um “fundo de perdas e danos”, que visa apoiar os países impactados de forma irreversível pelas alterações climáticas. O fundo será capitalizado ao longo do próximo ano, mas o arranque não é promissor. Quando as previsões apontam para necessidades que superam os 100 mil milhões de dólares por ano, para apoios aos respectivos países afectados, na COP o compromisso alcançado não vai além de pouco mais de 700 milhões de dólares. Uma pequena fracção do necessário. Por outro lado, e ao contrário da pretensão dos países em desenvolvimento, caberá ao Banco Mundial a gestão deste fundo. Face à sua natureza, importa garantir que o acesso a estes apoios não se traduza em empréstimos que somam dívida a países já em dificuldades. Essa é, aliás, uma das maiores críticas ao compromisso assumido em 2009 de mobilização de 100 mil milhões de dólares anuais de meios financeiros para apoios à adaptação e mitigação nos países em desenvolvimento, que não só nunca alcançou esse valor, como foi mobilizado maioritariamente através de empréstimos. Uma realidade que contrasta, e muito, com a mobilização de muitos milhares de milhões em subvenções que, nomeadamente nas maiores potências, alimentam os lucros dos grandes grupos económicos, nos sectores do armamento, da energia, dos transportes, da agro-indústria, entre outros.

Outra decisão tomada diz respeito ao chamado "pacote energético", que aponta a uma transição faseada da dependência de combustíveis fósseis, ao triplicar da capacidade de produção de energia por renováveis e à duplicação da eficiência energética. Mas a declaração neste tema estratégico, como noutros, escapa a questões que são essenciais. Quem controla e a quem servem os meios de produção? Que políticas as norteiam?

O controlo público de sectores estratégicos, como a energia, seria determinante para garantir que as opções tomadas, também no que diz respeito à implementação de projectos de energia renovável, servem em primeiro lugar os interesses dos povos e as estratégias de desenvolvimento soberano dos Estados, minimizando impactos ambientais associados ao processo, como aqueles a que temos assistido no nosso país, com o comprometimento de áreas relevantes em biodiversidade.

Paradigmática da sobreposição da propaganda à realidade foi a sessão promovida no pavilhão de Portugal, no dia temático dedicado à água e à agricultura, sobre “gestão de água e produção sustentável alimentar – os casos do olival e produção de frutos secos em Portugal”, que apresentou como casos de referência a produção superintensiva de olival e amendoal no Alentejo.

É essencial que as políticas que procuram responder aos problemas ambientais com que nos confrontamos não ignorem, antes integrem, as dimensões económica e social, sob pena, como vários casos parecem confirmar no nosso país, das medidas adoptadas nada resolverem e agravarem ainda mais as desigualdades e assimetrias.

O que verdadeiramente se exige, se queremos de forma séria olhar de frente para os impactos das alterações climáticas, é a ruptura com as políticas fundadas na exploração desenfreada da natureza e do homem. Concretamente, é tempo: de recuperar o controlo público de sectores estratégicos, como a energia; de promover a produção e consumos locais, reduzir circuitos de produção-comercialização-consumo e regular o comércio internacional; defender o direito à soberania alimentar; garantir o controlo público da água; rejeitar a mercantilização da natureza; adoptar uma abordagem normativa à redução das emissões, que se contraponha às abordagens de mercado patentes no comércio de licenças para poluir; promover o transporte público colectivo e a diminuição do uso do transporte individual; defender a paz!