Veludo à superfície

O mundo precisava de outra biografia de Lou Reed? Em que é que esta biografia de Lou Reed difere das biografias de Lou Reed publicadas em 2017, em 2015, em 2014, em 2008, em 2003, ou em 1994?

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A predisposição para comprar e ler biografias de estrelas rock é uma condição clínica como qualquer outra: os sofredores merecem carinho e respeito, e não troça. A culpa, afinal, não é nossa (é da Natureza, ou de Deus, ou do governo). Quem o faz, e continua a fazer, deseja apenas reproduzir uma sensação familiar. O que se procura é, por ordem: a infância “normal”, mas com uma ou outra intrusão de “dificuldades”; a adolescência problemática, onde se encontram as raízes do ego frágil e (portanto) sobredimensionado (bullying na escola, dificuldades com o sexo oposto que se desvanecem assim que se pega na primeira guitarra, ensaios preliminares com substâncias tóxicas); depois, o sucesso explosivo; a vida na estrada; o primeiro (de muitos) divórcio(s); as zangas com colegas; as odisseias de litigação mediadas por personagens secundárias (managers, advogados); os relatos de excessos (quartos de hotéis destruídos, uso imaginativo de bicicletas ou extintores); o bater no fundo; e um de dois desenlaces, a) morte prematura, ou b) redenção tardia. O maior choque possível seria a biografia que termina com a estrela a pousar a guitarra para estudar Gestão. Mas a fórmula do género é tão estável e previsível como a do western ou do policial nórdico. O que se desenvolve é uma hierarquia de apetites, sobre os quais nem sempre é possível agir, mas que fazem sentido teórico. As biografias de Dylan e Jagger, por exemplo, são demasiado engraçadas. As de Lennon e Bowie insuficientemente engraçadas. As de Elvis e Lou Reed costumam ser engraçadas na medida certa.

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