Pinho acusa Carlos Alexandre de usar expediente ilegal para lhe arrestar a pensão
Na contestação ao arresto da reforma de quase 20 mil euros, Pinho alega que o juiz guardou o processo sete dias e estranha ser o único arguido a ser alvo de uma medida com efeitos patrimoniais.
O antigo ministro da Economia, Manuel Pinho, apresentou um recurso para contestar o arresto da reforma que recebia no valor de quase 20 mil euros. Segundo a defesa do antigo titular da Economia que está a ser julgado no âmbito do processo EDP, o juiz Carlos Alexandre terá retido indevidamente o processo, durante sete dias, para poder ser ele a decidir sobre o pedido do Ministério Público (MP).
O arresto da pensão de Pinho foi mandado decretar pelo juiz Carlos Alexandre no dia 25 de Julho deste ano, quando o magistrado ainda estava no TCIC (actualmente exerce funções no Tribunal da Relação de Lisboa) e no âmbito do processo EDP que ainda está em investigação e em segredo de justiça.
Segundo o recurso a que o PÚBLICO teve acesso, o MP promoveu o arresto da pensão no dia oito de Julho, considerando indiciada a prática por Pinho de, pelo menos, um crime de corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo politico, relativamente a decisões tomadas a favor da EDP, em concretização de um pacto com António Mexia e João Manso Neto, antigos administradores da EDP, tendo como contrapartida o pagamento do seu salário na Universidade de Columbia.
Refere o mesmo documento que, seguindo os trâmites do tribunal, o pedido foi anexado aos autos a 13 de Julho e estes deviam ter sido entregues ao Juiz de Instrução Criminal 3 para decisão a 18 de Julho, porque nesse dia o Juiz de Instrução 1, que era na altura Carlos Alexandre, estava de turno, mas estava ocupado com os interrogatórios dos arguidos do processo do caso Altice. “Porém, o juiz Carlos Alexandre não largou mão dos autos”, lê-se, sublinhando que o juiz os reteve “até estar disponível para o despachar, chamando a si a decisão sobre o arresto num momento em que já não era o juiz de turno”.
A defesa do antigo governante, a cargo do advogado Ricardo Sá Fernandes, alega que “o juiz de turno só pode assumir a prática de actos jurisdicionais relativamente ao período em que está de turno”. “Quando tomou conta deste processo de arresto, sete dias depois de se verificar o impedimento, o juiz Carlos Alexandre, já não era o juiz competente para julgar o arresto. Não era o juiz natural do processo”, sustenta a defesa de Pinho, acrescentando ainda que o MP não trouxe argumentos novos para voltar a tentar arrestar a reforma do antigo governante.
Esta não é a primeira vez que Pinho tem a pensão arrestada. Os outros arrestos ocorreram no âmbito do outro processo que resultou da divisão do caso EDP, sendo que, sempre que recorreu para o Tribunal da Relação, o antigo governante viu a decisão de arresto ser revertida.
Aliás, no recurso e referindo que os argumentos do MP para arrestar a pensão são exactamente os mesmos já usados anteriormente, e que já foram apreciados pela Relação que acabou por dar sempre razão a Pinho, a defesa considera que o juiz Carlos Alexandre “violou ostensivamente o seu dever de acatamento da decisão proferida em via de recurso por um tribunal superior”.
Outra questão que a defesa do antigo governante considera “inquietante” é que, “segundo o MP e o juiz de instrução, estão em causa prejuízos causados ao Estado e aos residentes em Portugal no valor de 1,2 mil milhões de euros, o que teria resultado de um pacto corruptivo celebrado entre os co-arguidos. Porém, nestes autos em que há outros arguidos constituídos, e alegadamente indiciados pela prática dos correspondentes crimes e corrupção activa, a mais ninguém foi imposta qualquer medida de garantia patrimonial, o que numa validação objectiva, significa que o alvo é apenas o património do arguido Manuel Pinho”.
Ricardo Sá Fernandes termina o recurso sublinhando que este arresto é "muito triste, indigno e revoltante”. Para o advogado, Manuel Pinho “foi objecto de um acto retaliatório e mesquinho”. “Não se perdoou ao arguido o facto de, por duas vezes, ter ousado rebelar-se contra o arresto da sua pensão de reforma, tendo tido ganho de causa, o que poderá ter sido julgado insuportável para quem agora reincidiu na apreensão dessa mesma reforma”. “Estamos na fronteira de abuso de poder, o que a seu tempo terá de ser objecto em sede própria da adequada investigação”, avisa o advogado.
A investigação deste processo arrancou em 2012 por causa dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC) — uma compensação recebida pela EDP desde Julho 2007, devido à cessação antecipada de vários contratos de aquisição de energia que a empresa tinha em cerca de três dezenas de centrais eléctricas. Em causa estão suspeitas de corrupção e participação económica em negócio por parte dos antigos administradores da EDP, António Mexia e Manso Neto, para a manutenção do contrato das rendas excessivas, no âmbito do qual, segundo o MP, terão corrompido o ex-ministro Manuel Pinho e o ex-secretário de Estado da Energia Artur Trindade.