Grupos de defesa do clima estão a pressionar os governos mundiais reunidos na conferência das Nações Unidas sobre o clima COP28, a realizar este ano no Dubai, para que se comprometam a reduzir as emissões globais do sector alimentar, uma vez que o anfitrião da conferência promete colocar a agricultura no centro das atenções.
Os sistemas alimentares globais - incluindo a agricultura e a utilização dos solos, a produção pecuária, o consumo e o desperdício de alimentos domésticos e a energia utilizada nos sectores agrícola e retalhista de alimentos - são responsáveis por 31% das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) produzidas pelo homem, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
No entanto, poucos governos publicaram objectivos numéricos para reduzir essas emissões, concentrando-se sobretudo na utilização de combustíveis fósseis para a produção de electricidade, transportes e indústria, segundo os defensores do clima.
"Os sistemas alimentares normais utilizariam quase todo o orçamento de carbono para um mundo com uma temperatura de 2 graus Celsius. Precisamos de implementar abordagens aos sistemas alimentares em toda a COP28", afirmou João Campari, líder global de práticas alimentares do World Wildlife Fund. Um dia inteiro da 28ª Conferência das Partes (COP), 10 de Dezembro, será dedicado à alimentação e à agricultura - uma estreia em qualquer COP - e o anfitrião, os Emirados Árabes Unidos, afirmou que o evento será um "divisor de águas para os sistemas alimentares".
Os ambientalistas dizem que os países devem aproveitar a oportunidade para se comprometer com uma acção mais forte sobre as emissões do sistema alimentar nos seus planos climáticos nacionais, chamados de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês).
Muitos NDCs mencionam a agricultura, mas apenas 53 dos 164 países que apresentaram NDCs à ONU em Setembro de 2022 incluíram metas quantificadas de GEE para subsectores agrícolas, de acordo com o CGIAR, um grupo de pesquisa de segurança alimentar global.
Os Estados Unidos, Índia, China e Canadá estão entre os países que não tinham metas de mitigação quantificadas.
Os defensores do sistema alimentar gostariam de ver uma contabilização mais clara das emissões e dos objectivos para as reduzir, bem como a discussão de questões como a biodiversidade e dietas saudáveis e sustentáveis. "Esta é uma base mínima para compreender o papel dos sistemas alimentares e a sua ligação [às alterações climáticas]", afirmou Patty Fong, directora do programa para o clima, saúde e bem-estar da Aliança Global para o Futuro da Alimentação.
A realização deste objectivo poderia também desbloquear o investimento financeiro na luta contra as emissões alimentares, afirmou Saswati Bora, directora global dos sistemas alimentares regenerativos da Nature Conservancy.
Os sistemas alimentares receberam apenas 4,3% do financiamento climático global em 2019 e 2020, de acordo com a Climate Policy Initiative. "Ter essa atenção crescente em nível global ajuda a direccionar parte do apoio necessário para que os produtores façam a transição da produção de alimentos para ser mais favorável ao clima", disse Bora.
Combater o metano
Um objectivo fundamental para os defensores da causa é a redução das emissões de metano provenientes de sectores alimentares como a produção animal e os resíduos alimentares.
O metano é cerca de 20 vezes mais potente do que o dióxido de carbono num período de 100 anos. Os sistemas alimentares geram 53% das emissões mundiais de metano e cerca de dois terços do metano agrícola provêm da produção pecuária, incluindo os arrotos das vacas e a gestão do estrume, de acordo com a FAO.
Uma maior sensibilização para as emissões de metano da pecuária deve conduzir a compromissos globais para as reduzir, da mesma forma que o Compromisso Global de Metano lançado na COP26 compromete os países a reduzirem as suas emissões de metano em 30% até 2030, lembrou John Tauzel, director sénior de metano agrícola global do Fundo de Defesa Ambiental.
Os países mais ricos devem apoiar os agricultores na implementação de tecnologias como os biodigestores que capturam as emissões de estrume para a produção de energia, enquanto os países mais pobres devem ajudar os agricultores a melhorar a alimentação animal e a digestão do gado, disse Tauzel.
Os países também devem assumir compromissos mais fortes nos NDC sobre o desperdício alimentar, disse Liz Goodwin, directora de perda e desperdício alimentar do World Resources Institute. O desperdício alimentar gera metade de todas as emissões do sistema alimentar global, de acordo com um estudo publicado em Março na revista Nature Food.
"Isso coloca-o claramente na agenda dos governos, o que significa que têm de fazer algo a esse respeito", afirmou Goodwin. Em 2015, os membros da ONU comprometeram-se a reduzir para metade a perda e o desperdício de alimentos a nível mundial até 2030, mas o mundo, colectivamente, fez poucos progressos nesse sentido e alguns países desperdiçam ainda mais alimentos actualmente.