Maior icebergue do mundo desprendeu-se e está à deriva na Antárctida

O maior icebergue do mundo esteve “encalhado” durante quase quatro décadas na Antárctida, mas, agora, começou a mover-se. A massa de gelo A23a é tão grande que caberiam 99 cidades do Porto ali dentro.

cop28,azul,icebergues,antonio-guterres,antarctida,
Fotogaleria
Imagem de satélite mostra o maior icebergue do mundo, localizado na Antárctida, que tem a designação A23a Reuters/Copérnico
cop28,azul,icebergues,antonio-guterres,antarctida,
Fotogaleria
Massa de gelo A23a vista do espaço a 15 de Novembro de 2023 Reuters/Copérnico
Ouça este artigo
00:00
04:33

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

O maior icebergue do mundo esteve “encalhado” durante quase quatro décadas na Antárctida, mas, agora, começou a mover-se e pode acabar por alcançar oceano aberto. Esta gigantesca massa de gelo, que tem a designação A23a, estende-se ao longo de cerca de 4000 quilómetros quadrados – uma área onde caberiam quase 100 cidades do Porto.

A massa de gelo A23a separou-se em 1986 da plataforma de gelo Filchner-Ronne, situada no Sudeste do mar de Weddell, na costa da Antárctida. A base do icebergue acabou por encalhar no leito do mar de Weddell, ali ficando encalhado desde então, funcionando como uma estrutura insular a cerca de 260 quilómetros do oceano aberto.

Se esteve tanto tempo quietinho, por que razão o icebergue começou agora movimentar-se? Questionei alguns colegas relativamente a esta questão, imaginando que alguma possível mudança nas temperaturas da água da plataforma poderia ter provocado isso, mas o consenso é que a hora [de partir] tinha chegado, afirmou à cadeia britânica BBC Andrew Fleming, investigador na British Antarctic Survey, em Cambridge, no Reino Unido. Esta entidade ocupa dos assuntos britânicos na Antárctida.

"[O icebergue] estava encalhado desde 1986, mas acabou por diminuir (de tamanho) o suficiente para perder aderência e começar a mover-se. Vi o primeiro movimento em 2020", acrescentou Andrew Fleming. Nos últimos meses, o A23a começou a ganhar lanço, impulsionado por ventos e correntes oceânicas. A BBC refere que, agora, está a passar pelo extremo norte da Península Antárctida.

Um dos icebergues mais antigos

O glaciólogo Oliver Marsh possui uma perspectiva semelhante. O especialista explicou que o icebergue A23a, “um dos mais antigos da Antárctida”, provavelmente perdeu massa e volume, ganhando assim maior capacidade de flutuar e ser transportado pelas correntes.

“Com o tempo, [o icebergue] provavelmente diminuiu um pouco e ganhou um pouco de flutuabilidade extra que lhe permitiu levantar-se do fundo do oceano e ser empurrado pelas correntes oceânicas”, disse Oliver Marsh, citado pela Reuters. O A23a tem cerca de 400 metros de profundidade.

O glaciólogo afirmou que é possível que o A23a encalhe novamente, desta vez na ilha da Geórgia do Sul. Se isso acontecer, será uma má notícia para milhões de focas, pinguins e aves marinhas que se reproduzem naquela área insular, buscando ainda alimento nas áreas circundantes. Ao estacionar na região, o icebergue pode funcionar como um tampão, perturbando as rotas habituais utilizadas pela vida selvagem para alimentar as crias.

António Guterres visita a Antárctida

“O que acontece na Antárctida não fica na Antárctida. Vivemos num mundo interligado”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, na última quinta-feira, numa viagem simbólica que fez àquele continente gelado uma semana antes da Cimeira do Clima (COP28). Esta conferência decorre no Dubai de 30 de Novembro a 12 de Dezembro.

António Guterres alertava que o gelo da Antárctida “está a derreter mais rapidamente do que nunca”, o que pode ter “consequências dramáticas” para o mundo. O degelo contribui para a subida do nível médio do mar, sendo que certos países insulares e regiões costeiras já estão a ser ameaçados.

“Está na hora de acabarmos com este vício dos combustíveis fósseis que estão a acelerar as alterações climáticas. Está na hora de garantir, através de grande força de vontade política, que as temperaturas não subirão para além dos 1,5 graus Celsius até ao final deste século”, afirmou Guterres num vídeo divulgado domingo na rede social Instagram.

Antiga estação científica soviética

O icebergue A23a foi assim baptizado segundo uma lógica de designação estabelecida pela comunidade científica. A letra corresponde a uma área específica no mapa da Antárctida, ao passo em que o número diz respeito a uma ordem definida pela British Antarctic Survey.

A massa de gelo A23a já albergou no passado uma estação científica soviética. Quando o icebergue se desprendeu da plataforma de gelo há mais de três décadas, Moscovo teve de enviar às pressas uma expedição para resgatar o equipamento científico. Na edição de 15 de Outubro de 1986, o jornal New York Times noticiava que a estação Druzhnaya 1 havia simplesmente desaparecido.

“Uma das estações de investigação da União Soviética na Antárctica, que estava prestes a ser ocupada novamente durante a temporada anual de Verão, desapareceu. O desaparecimento foi divulgado na edição de 5 de Outubro do jornal governamental Izvestia, que dizia que um enorme pedaço da camada de gelo ao longo da costa da Antárctida havia partido, aparentemente levando consigo a estação Druzhnaya 1, temporariamente não utilizada”, lia-se no diário norte-americano há 37 anos.