Cientistas resolvem mistério geológico da dolomite com mais de 200 anos

As lições aprendidas com o “problema da dolomite” podem ajudar os engenheiros a fabricar materiais de maior qualidade para semicondutores, painéis solares, baterias e outras tecnologias.

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As Dolomitas italianas formam uma cadeia montanhosa dos Alpes orientais no Norte da Itália Francesca/wikicommons
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A dolomite é um mineral que forma cadeias montanhosas como as Dolomitas italianas, mas também é protagonista de uma peculiaridade que confunde cientistas há 200 anos e que finalmente foi resolvida, de acordo com um estudo.

A teoria e as experiências que fornecem uma solução para o chamado “problema da dolomite” são explicadas num estudo, liderado pela Universidade do Michigan (EUA), publicado esta quinta-feira pela revista Science e que sublinha a importância das flutuações dentro de um ambiente geoquímico.

A dolomite é um mineral composto por camadas ordenadas de carbonato de cálcio e magnésio, que forma montanhas como as Dolomitas ou as das Cataratas do Niágara (EUA).

Sendo muito abundante em rochas com mais de 100 milhões de anos, está quase ausente nas formações mais jovens. Além disso, desde que este mineral foi descoberto em 1791 pelo francês Déodat de Dolomieu, os cientistas não conseguiram criá-lo em laboratório nas condições que se acredita terem sido formadas naturalmente.

“Se entendermos como cresce na natureza, poderemos aprender novas estratégias para promover o crescimento cristalino de materiais tecnológicos modernos”, realçou Wenhao Sun, da Universidade de Michigan, um dos autores do artigo.

Um proposta “brilhante”

Os investigadores apresentam uma proposta “muito brilhante” com uma experiência muito interessante” baseada em microscopia electrónica e cálculos computacionais, referiu à agência Efe o investigador Juan Manuel García-Ruíz, do Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC), que não participou no estudo, mas escreveu um artigo na Science onde o comenta.

A equipa, formada também por cientistas da Universidade de Hokkaido (Japão), descobriu que para construir montanhas com dolomite é preciso dissolvê-la periodicamente. Quando os minerais se formam na água, os átomos geralmente acomodam-se ordenadamente numa das bordas da superfície do cristal em crescimento.

No caso da dolomite, essa borda são fileiras alternadas de cálcio e magnésio que aderem aleatoriamente e muitas vezes na ordem errada, criando defeitos que impedem a formação de camadas adicionais e retardam o seu crescimento em milhões de anos. Mas se houver oscilações de temperatura ou salinidade no local onde o mineral se está a formar, como pode ocorrer numa praia ou lagoa, o tempo de disposição é bastante reduzido, salientou García-Ruíz.

O segredo para “cultivar" dolomite em laboratório era eliminar defeitos na estrutura mineral que impedem a formação de camadas adicionais. Como os átomos desordenados são menos estáveis do que aqueles na posição correcta, estes são os primeiros a dissolverem-se.

A lavagem repetida destes defeitos - por exemplo, pela chuva ou pelos ciclos das marés - permite que uma camada de dolomite se forme numa questão de anos e, ao longo do tempo geológico, as montanhas podem acumular-se.

As poucas áreas onde a dolomite se forma hoje são inundadas intermitentemente e depois secam, o que combina bem com a teoria, explicou a Universidade do Michigan em comunicado.

No passado, os produtores de cristal que queriam fabricar materiais livres de defeitos tentavam cultivá-los muito lentamente.

No entanto, esta teoria mostra “que materiais livres de defeitos podem crescer rapidamente se os defeitos forem periodicamente dissolvidos durante o crescimento”, garantiu Wenhao Sun. A equipa testou a teoria utilizando microscópios electrónicos de transmissão, colocando um minúsculo cristal de dolomite numa solução de cálcio e magnésio e dissolvendo os defeitos. Após esta acção, observou-se que a dolomite cresceu aproximadamente 300 camadas (cerca de cem nanómetros). Nunca antes tinham sido criadas mais de cinco camadas em laboratório.

Estas lições aprendidas com o “problema da dolomite” podem ajudar os engenheiros a fabricar materiais de maior qualidade para semicondutores, painéis solares, baterias e outras tecnologias.