Câmaras do Alentejo dizem-se impotentes para fiscalizar a insalubridade em que vivem imigrantes

As principais praças de Beja esvaziaram-se de imigrantes, enquanto a Polícia Judiciária detinha 28 pessoas em mais uma operação de desmantelamento de redes de exploração de imigrantes.

Foto
Imigrantes que procuram trabalho nas explorações agrícolas do Alentejo vivem muitas vezes em condições de sobrelotação e insalubridade LUSA/NUNO VEIGA
Ouça este artigo
00:00
03:11

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Em vez do habitual fervilhar, o silêncio. Nas principais praças de Beja, o habitual frenesim dos imigrantes que são chamados a satisfazer a necessidade de mão-de-obra das explorações agrícolas da região, com os trabalhadores a disputarem ansiosamente um lugar para trabalhar, “nem que seja umas horas”, como relatou ao PÚBLICO um cidadão senegalês, calou-se enquanto decorria a operação da Polícia Judiciária (PJ), que desmantelou uma rede criminosa dedicada a explorar trabalhadores imigrantes no Baixo Alentejo.

O imigrante senegalês que procura trabalho na construção civil disse compreender a repentina ausência de paquistaneses, moldavos, romenos, indianos e de outras paragens do Extremo Oriente, mas não adiantou mais pormenores: “Tenho medo”, desculpou-se.

Na operação da PJ, em que foram detidas 28 pessoas, estiveram sob o foco das autoridades os concelhos de Cuba, Ferreira do Alentejo e Alcácer do Sal, tal como aconteceu na operação realizada em 23 de Novembro de 2022. Mas é em Beja, cidade que se transformou no epicentro da circulação de imigrantes, que mais se sente o fervilhar de imigrantes. No chamado Jardim do Bacalhau, um dos presentes admitia que a ausência de imigrantes se fazia notar pelo facto de estarem a trabalhar nos campos, mas o seu parceiro de conversa lembrou que “ainda ontem [segunda-feira]" o jardim estava "cheio de imigrantes".

Aluguer de casas ainda sem fiscalização

O modo como vivem está cada vez mais presente no quotidiano da cidade. O número crescente de casas na cidade e aldeias de Beja que estavam devolutas e que passaram a estar ocupadas por cidadãos estrangeiros justifica um crescendo de interrogações. Alugar a casa a imigrantes passou a ser uma importante fonte de rendimento para os seus proprietários, seja nos concelhos alentejanos preenchidos por olivais, seja no concelho de Odemira, onde impera a cultura dos pequenos frutos vermelhos.

A Câmara de Beja reconhece a sua incapacidade para travar o aluguer de todo o tipo de fogos, incluindo os que não estão destinados a habitação. E o executivo municipal de Odemira salientou, numa das suas últimas reuniões, que não existe notícia de que a Autoridade Tributária e Aduaneira esteja a fiscalizar "o cumprimento das obrigações fiscais relativamente aos contratos de arrendamento e subarrendamento para fins habitacionais”. Do mesmo modo, o município diz temer que a administração central não esteja disponível para colaborar, no âmbito das suas competências, "no cumprimento das suas obrigações de fiscalização da ocupação de edifícios".

Acresce que a intervenção das autoridades no desmantelamento das redes de tráfico de mão-de-obra não tem paralelo na fiscalização dos espaços habitados por imigrantes, sobretudo nas condições de habitabilidade e salubridade e no cumprimento das obrigações fiscais. O município de Beja, confrontado em várias reuniões com o seu grau de responsabilidade nesta matéria, admite que a legislação em vigor não define um número máximo de residentes que podem ser acolhidos num determinado edifício.

As lacunas e as omissões da legislação em vigor facilitam a concentração de imigrantes em condições desumanas, atribuindo à cidade de Beja um novo figurino: a roupa a secar que os imigrantes estendem nas janelas, varandas, terraços e ainda num dos torreões da muralha medieval que circunda o centro histórico de Beja.

Do lado dos empregadores, um empresário agrícola revelou ao PÚBLICO já ter sofrido as consequências de ter sido identificado numa das suas explorações mão-de-obra ilegal. “Agora exijo a documentação que autoriza o seu portador a trabalhar em Portugal”, assegurou.

Sugerir correcção
Ler 19 comentários