Esperma de baixa qualidade associado à exposição a insecticidas nos alimentos e na água
Estudo de revisão sistemática identifica uma “associação consistente” entre uma maior exposição a insecticidas usados na agricultura e uma menor concentração de espermatozoides em homens adultos.
Uma associação entre a baixa qualidade do esperma humano e a exposição a insecticidas foi descoberta num estudo, publicado esta quarta-feira, na revista científica Environmental Health Perspectives.
“Compreender como os insecticidas afectam a concentração de espermatozóides em humanos é fundamental, dada a omnipresença destas substâncias no ambiente e os riscos reprodutivos documentados”, diz a investigadora Lauren Ellis, primeira autora do estudo e estudante de doutoramento na Universidade do Nordeste, em Massachusetts, nos Estados Unidos, citada num comunicado.
A cientista afirma que os insecticidas constituem “uma preocupação para a saúde pública e para todos os homens, que são expostos principalmente através do consumo de alimentos e água contaminados”.
Uma equipa de sete cientistas fez uma revisão sistemática de quase meio século de literatura científica. Ao todo, examinaram 25 estudos sobre os impactos na saúde da exposição a dois grupos de insecticidas bastante comuns na agricultura: a classe dos N-metilcarbamatos (NMCs) e organofosforados (OFs).
Os dados apresentados nesses trabalhos epidemiológicos sugerem a existência de uma “associação consistente” entre uma maior exposição a insecticidas e uma menor concentração de espermatozóides em homens adultos em todo o mundo.
“Embora estudos adicionais da coorte sejam benéficos para colmatar as lacunas de dados”, conclui o estudo, “devem ser tomadas já medidas para reduzir a exposição aos insecticidas da classe dos N-metilcarbamatos e dos organofosforados para prevenir danos reprodutivos contínuos [na população].”
Revisão combinada com meta-análise
Melissa J. Perry, reitora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade George Mason, nos Estados Unidos, explica que os resultados encontrados são robustos uma vez que 20 dos 25 estudos considerados foram submetidos a uma meta-análise.
“Ficamos surpresos ao ver resultados tão robustos. Antes da meta-análise, não tínhamos a certeza de que se olhássemos todos os estudos combinados, e se aplicássemos cálculos tão avançados, ainda veríamos essa associação aparecer. Mas, de facto, foi o que aconteceu”, afirmou Melissa Perry ao PÚBLICO.
A meta-análise é método quantitativo consiste numa abordagem estatística que combina e resume dados preexistentes de vários estudos independentes, todos eles dedicados ao mesmo problema científico, permitindo a integração de resultados.
“Esta revisão é a mais abrangente publicada até à data, avaliando mais de 25 anos de investigação sobre fertilidade masculina e saúde reprodutiva. As provas disponíveis chegaram a um ponto em que devemos tomar medidas de regulamentação, reduzindo assim a exposição [humana] aos insecticidas”, acrescenta a reitora da Universidade George Mason.
Não se sabe ao certo quais são as causas da baixa concentração de espermatozóides – conhecida como oligospermia –, mas entre os factores de risco estão a idade, aspectos nutricionais e de estilo de vida (a prática habitual de ciclismo, por exemplo) e, por fim, a exposição a substâncias tóxicas presentes no ambiente, especialmente os desreguladores endócrinos.
Um estudo polémico publicado em 2017 mostrava, por exemplo, que a contagem de espermatozóides de homens no mundo ocidental caiu mais de 50% em apenas quatro décadas. Quatro anos depois, foram encontradas falhas no artigo e propostas formas alternativas para observar o problema. De uma forma ou de outra, a queda da qualidade do esperma humano é uma tendência que tem sido observada em diferentes estudos nas últimas décadas.