Conseguir um tratado vinculativo para limitar a poluição por plástico até 2024 é o objectivo das negociações que se iniciaram nesta segunda-feira em Nairobi, no Quénia, na sede do programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), e se prolongam até dia 19 de Novembro. Mas um grupo de países produtores e exportadores de petróleo e produtos de petroquímica está a resistir.
“O que está em causa não é apenas melhorar a reciclagem, ou gerir os lixos e fazer limpezas. O que temos de fazer é repensar completamente a forma como usamos os plásticos”, disse a directora executiva do PNUA, Inger Andersen. Países como a Rússia, ou a Arábia Saudita, no entanto, preferem que os esforços se concentrem no fim da cadeia, ou seja, na reciclagem e tratamento dos lixos. Não na limitação da produção ou utilização de plásticos, dizem analistas que acompanham as negociações.
São produzidos anualmente 430 milhões de toneladas de plástico por ano em todo o mundo, e a quantidade está a aumentar cada vez mais. “Muito deste plástico, frequentemente cheio de químicos perigosos, transforma-se em poluição: acaba em aterros, no oceano, noutros ecossistemas e no nosso organismo”, recordou Inger Andersen. E, como o plástico é produzido a partir de combustíveis fósseis, se queimarmos o lixo plástico, isso tem impactos significativos no clima.
Os plásticos podem representar 19% das emissões de gases com efeito de estufa que o planeta se poderia permitir ter em 2040 para que o aquecimento global não ultrapasse 1,5 graus, segundo contas apresenta pelo PNUA.
Por isso é preciso pensar no ciclo de vida completo dos plásticos para controlar esta poluição: produzir menos e reduzir a quantidade de materiais não reciclados que se usa, eliminar o plástico em excesso nos produtos de consumo – aquele que se usa durante cinco minutos mas passará 500 anos num aterro –, arranjar alternativas, reutilizar e reciclar de forma mais eficaz. É preciso lidar de forma segura com a poluição de plástico que já existe, sabendo que deixa uma herança de múltiplos efeitos no ambiente, na nossa saúde.
Das mais de 400 toneladas produzidas anualmente, só 10% são recicladas, segundo o PNUA, e pelo menos 14 milhões de toneladas acabam nos oceanos todos os anos, de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza, citada pela Reuters. Maiores quantidades acabam em aterros.
Em Março de 2022, houve acordo a nível internacional para que se iniciassem as negociações para concluir um tratado para controlar a poluição por plástico até ao fim de 2024 e que seja legalmente vinculativo. O objectivo é conseguir reduzir a poluição por plástico em 80% até 2040. Esta é a terceira ronda de negociações com esse objectivo, e o que está a ser negociado é o texto que poderá vir a dar origem a esse tratado – aquilo a que chamam o “rascunho zero”.
“Apelo a todos os negociadores que se recordem que 2024 está apenas a seis semanas de distância e que só faltam mais duas reuniões”, disse o Presidente do Quénia, William Ruto, na abertura desta ronda negocial em Nairobi.
O risco de andar para trás
Os negociadores estão a discutir se devem manter o objectivo de lidar com todo o ciclo de vida dos plásticos, incluindo a produção, ou dar prioridade à gestão dos resíduos, diz a Reuters. O documento resultante destas negociações deve já esboçar compromissos para reduzir a poluição, e sugerir um esquema de financiamento para pôr em prática essa redução, disse Carroll Muffett, presidente do Centro de Direito Ambiental Internacional, uma organização pública sem fins lucrativos com sede em Washington, D.C.
“A vasta maioria de países quer fazer avançar as negociações e chegar a um acordo”, disse à Reuters Pamela Miller, co-secretária da rede Internacional para a Eliminação dos Plásticos, um grupo de organizações não-governamentais. A indústria produtora de plástico e países que exportam petróleo, como a Arábia Saudita, não querem que seja reduzido o uso do plástico. Afirmam que o futuro tratado sobre a poluição do plástico deve promover a reciclagem e reutilização, mas não limitar a produção, sublinhou Carroll Muffett.
“Vai ser necessário navegar por entre riscos extraordinários durante esta semana”, disse Muffett à Reuters, referindo-se a essas tentativas de vários Estados-membros das Nações Unidas de atrasar e fazer derrapar as negociações, que se verificaram em anteriores rondas negociações.
“Um pequeno grupo de países com interesses comuns, essencialmente grandes produtores e exportadores de combustíveis fósseis e produtos plásticos e petroquímicos, como a Arábia Saudita e a Rússia, estão activamente a tentar andar para trás”, afirmou Pamela Miller, citada pela Reuters.