Dono do Sá da Bandeira quer cessar contrato com inquilino que gere teatro há décadas
A Lello Vitória - Livros e Turismo, Lda alega que o arrendatário deve pagar as obras de reabilitação do edifício. A estimativa do orçamento, feita pelo proprietário, ronda os 2,1 milhões de euros.
Tudo começou com o actual proprietário do Teatro Sá da Bandeira a apresentar ao inquilino uma estimativa dos custos das obras que considera necessárias para o prédio ser reabilitado – no total, estima ser necessário que se invista 2,1 milhões de euros para que as patologias existentes sejam resolvidas. A Livraria Lello, propriedade do Grupo Lionesa, que comprou o espaço à Câmara do Porto, em 2019, entende que os trabalhos de reabilitação do imóvel devem ser pagos pelo inquilino. Só que a Rocha, Brito & Vigoço, Lda., que arrenda o espaço desde a década de 1970, tem outro entendimento sobre o assunto: o proprietário deve ser responsável pelo pagamento dos trabalhos. Perante essa circunstância, a empresa do grupo de Avelino Pedro Pinto moveu uma acção no Tribunal Judicial do Porto para cessar o contrato com o inquilino, que considera estar a ser alvo de uma estratégia delineada pelo grupo que é dono do teatro para “desalojar” os edifícios históricos que compra.
Segundo a petição que já entrou no tribunal, a que o PÚBLICO teve acesso, a Lello Vitória - Livros e Turismo, Lda alega que o contrato de arrendamento prevê que o inquilino fique responsável pelas obras e elenca um conjunto de deficiências a serem corrigidas ao nível da estrutura e da segurança do edifício. Em 2019, quando o edifício foi adquirido, os novos proprietários diziam que, em altura própria, o projecto que estava a ser definido para o teatro seria apresentado – o imóvel tem várias fracções, mas a do teatro terá sempre de cumprir o mesmo uso, depois da autarquia o ter classificado antes de o vender em hasta pública por 3,5 milhões de euros. Para o projecto ser implementado, seria necessário proceder-se a trabalhos de reabilitação.
Porém, a gestão da programação do espaço está nas mãos da Rocha, Brito & Vigoço, Lda, que chegou a contestar a venda do teatro à Lello, alegando que lhe deveria ter sido dada a hipótese de invocar o direito de preferência para a aquisição do imóvel. Esta circunstância obrigaria sempre a que o projecto delineado pelo proprietário fosse discutido com o arrendatário.
Ou sai ou paga as obras
Na petição, a empresa do grupo de Avelino Pedro Pinto alega que o inquilino, além de alguns “biscates”, não avançou com as obras, entre elas, algumas que deveriam ser realizadas por indicação da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC). Lê-se na petição que, em relatório produzido pela ANEPC, estipulava-se uma data limite para os trabalhos serem realizados. Segundo a petição escrita pela Amílcar P. Fernandes & Associados, representante legal da Lello, todos os prazos foram excedidos.
Em função dessas alegações, a empresa entende ter legitimidade para poder cessar o contrato com o arrendatário e avançou para a justiça para "ser declarado resolvido o contrato de arrendamento". Se o entendimento do tribunal for outro, sugere-se que o inquilino seja obrigado "a realizar todas as obras e intervenções necessárias” ou, em alternativa, condená-lo a pagar uma quantia "não inferior a 2.104.500 euros, a título de indemnização".
Contactado pelo PÚBLICO, Luís Bianchi Aguiar, advogado da Rocha, Brito & Vigoço, optou apenas por fazer um comentário: “A minha cliente entende que esta acção não tem qualquer fundamento sério, uma vez que se trata de mais um expediente da proprietária do teatro para desalojar e fazer acabar mais um estabelecimento com uma actividade histórica na cidade, conforme tem vindo a fazer com outras já noticiadas neste jornal.”
Confrontado com as declarações do advogado do inquilino, Amílcar Fernandes, advogado da Lello, afirma que objectivo do arrendatário “não é manter o contrato porque as obras que o imóvel exige são muito dispendiosas e estão a seu cargo”. “O seu objectivo é receber uma indemnização absurda para entregar o imóvel e não levar a cabo essas obras”, acrescenta. Apesar de na petição se pedir ao tribunal "a entrega imediata" do imóvel, e apenas como alternativa que o inquilino faça as obras, o advogado diz que “o pedido que é formulado” é “apenas o de condenação da arrendatária a efectuar as obras”.