Afinal, as garrafas de plástico não são 100% recicláveis? Consumidores apresentam queixa

Empresas de bebidas enganam os clientes ao alegar que embalagens de plástico são 100% recicladas ou recicláveis, denunciam associações de consumidores. Uma queixa foi apresentada à Comissão Europeia.

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As garrafas de água de marcas pertencentes a marcas como Coca-Cola, Danone e Nestlé propagandeadas como “100% recicláveis” ou “100% recicladas” são enganosas, diz associação de consumidores Pixabay
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Grandes empresas que engarrafam e distribuem água têm enganado os clientes ao alegar que as embalagens de plástico são totalmente recicladas ou recicláveis, denuncia um colectivo europeu de associações que defendem os consumidores – incluindo a portuguesa DECO –, que apresentou nesta terça-feira uma queixa formal à Comissão Europeia.

“Deparamo-nos com várias garrafas com alegações de que são 100% recicláveis. Isto transmite uma percepção ao consumidor que não corresponde à realidade: se o corpo da garrafa é, pelo menos em parte, reciclada ou reciclável, o mesmo não acontece com a tampa e o rótulo”, explica ao PÚBLICO Susana Correia, jurista da DECO.

O Gabinete Europeu das Associações de Consumidores (BEUC, na sigla em francês) afirmou, num comunicado de imprensa divulgado nesta terça-feira, que as garrafas de água de marcas pertencentes à Coca-Cola, Danone e Nestlé propagandeadas como “100% recicláveis” ou “100% recicladas” são enganosas.

O BEUC, que representa 45 associações nacionais em toda a Europa, frisa no documento que as taxas de reciclagem na Europa são muito mais baixas na realidade e que, na prática, cada garrafa colocada no mercado contém partes que não são feitas de material reciclado ou reclinável. Por outras palavras, não se pode dizer que 100% de um produto possui um atributo quando este só se verifica parcialmente.

“Seja na compra de roupas novas, seja na abertura de uma conta num banco ou na compra de garrafas de água, os consumidores querem cada vez mais fazer a escolha mais sustentável e buscam informações credíveis ​para isso. No entanto, eles são bombardeados com afirmações incorrectas e enganosas, por isso não sabem em qual afirmação ou rótulo confiar”, refere Ursula Pachl, vice-directora do BEUC.

A DECO afirma que a denúncia foi feita não só junto da Comissão Europeia, mas também da Rede de Cooperação no domínio da Defesa do Consumidor. A queixa baseia-se na análise conduzida pelo BEUC em parceria com a ClientEarth e a ECOS (Environmental Coalition on Standards), cujas conclusões sugerem que as alegações não cumprem as regras em vigor na União Europeia.

A cor verde e o mito da circularidade

A utilização de ícones esverdeados nos rótulos também transmite, segundo as associações, uma imagem infundada de produtos amigos do ambiente.

“Logótipos verdes ou imagens da natureza são usados para rotular muitas garrafas de água em toda a Europa. Suscitam a falsa ideia de neutralidade ambiental, de circularidade infinita do plástico e podem até dar a impressão de que as garrafas teriam um impacto positivo no ambiente”, lê-se na nota de imprensa do BEUC.

Um vídeo divulgado nesta terça-feira pela BEUC na rede social X (antigo Twitter) recorda ainda que “a circularidade do plástico é um mito”. Todas as garrafas plásticas, mesmo aquelas que contêm material reciclado, apresentam alguma percentagem de plástico virgem.

“A realidade é que o plástico descartável não é circular nem sustentável. A reciclagem nunca poderá acompanhar o grande volume de plástico produzido no nosso planeta. As empresas estão numa posição única para mudar a forma como consumimos, mas actualmente estas alegações – que consideramos enganosas – estão a dificultar que os consumidores façam boas escolhas ambientais”, afirma Rosa Pritchard, jurista da ClientEarth, organização que co-produziu o relatório Unbottling Greenwashing.

“Acreditamos firmemente na circularidade das embalagens – e continuaremos a investir e a liderar a campanha por melhores infra-estruturas de recolha e reciclagem juntamente com os nossos parceiros. Também fizemos progressos reais no nosso caminho para a redução paralela da utilização de plástico descartável e de plástico virgem (-10% em termos absolutos desde 2018)”, afirmou um responsável da Danone ao diário britânico The Guardian.

Contactada pelo mesmo diário, a empresa Coca-Cola terá justificado que só comunica nas embalagens “mensagens que possam ser fundamentadas, com quaisquer qualificações relevantes claramente exibidas para permitir que os consumidores façam escolhas informadas”.

A água tratada fornecida pelos sistemas públicos de abastecimento em diversos países da União Europeia é considerada segura para consumo humano. Ainda assim, os europeus bebem em média 118 litros de água engarrafada por ano e 97% desse volume é distribuído em garrafas de plástico.

A Comissão Europeia não pode multar directamente as empresas que não observam as regras, cabendo aos Estados-membros tomarem ou não esta decisão.