Milhares de migrantes afegãos inundam fronteira paquistanesa

Terminou esta quinta-feira o prazo dado pelo Governo paquistanês para que os imigrantes afegãos indocumentados abandonassem o país. Organizações humanitárias descrevem cenas caóticas na fronteira.

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Milhares de afegãos no Paquistão têm chegado à fronteira nos últimos dias EPA/STRINGER
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Vários milhares de pessoas concentraram-se na principal passagem fronteiriça no Noroeste do Paquistão para atravessar para o Afeganistão no primeiro dia em que entrou em vigor a ordem de expulsão generalizada para todos os migrantes afegãos irregulares no país.

Até esta quinta-feira, mais de 165 mil afegãos tinham já abandonado o Paquistão desde que há cerca de um mês o Governo anunciou que iria expulsar todos os imigrantes indocumentados a partir de 1 de Novembro. A medida tem sido criticada pelas Nações Unidas e por várias organizações humanitárias que alertam para os perigos que a maioria dos afegãos irá enfrentar ao regressar ao país.

O Governo de Islamabad diz que os afegãos têm estado envolvidos na crescente actividade de grupos islamistas no país, para além de os responsabilizar pelo aumento da criminalidade, segundo a Reuters. Estima-se que haja mais de quatro milhões de afegãos a viver no Paquistão (os dois países partilham uma longa fronteira terrestre com mais de 2600 quilómetros), dos quais cerca de 1,7 milhões serão indocumentados.

A emigração de afegãos para o Paquistão é motivada por inúmeros conflitos e perseguições que abalaram o Afeganistão nas últimas décadas, desde a invasão soviética em 1979 até ao regresso dos taliban ao poder no Verão de 2021.

Só na quarta-feira, mais de 24 mil afegãos atravessaram a passagem fronteiriça de Torkham, de acordo com as autoridades locais. O governo controlado pelos taliban montou campos de refugiados do lado afegão da fronteira para tentar antecipar o enorme fluxo de pessoas nas próximas semanas.

Segundo as organizações de ajuda humanitária, o número de pessoas que chegam a Torkham subiu de 300 por dia para entre nove mil e dez mil desde que o decreto sobre a deportação de migrantes foi divulgado.

“As equipas estacionadas nas áreas onde as pessoas estão a regressar do Paquistão estão a relatar cenas caóticas e desesperadas entre os que regressaram”, afirmaram o Conselho Norueguês de Refugiados, o Conselho Dinamarquês de Refugiados e o Comité Internacional de Resgate, através de um comunicado conjunto.

“As condições em que chegam ao Afeganistão são desesperantes, com muitas pessoas a terem suportado viagens árduas, que duraram vários dias, durante os quais estiveram expostos às intempéries e frequentemente obrigados a trocar os seus pertences por transporte”, diz o mesmo comunicado.

Outro ponto de passagem onde o movimento tem sido intenso é em Chaman, na província do Baluchistão, no Sudoeste.

O Governo afegão condenou a decisão do Paquistão de expulsar milhares de migrantes indocumentados como “cruel e bárbara” e apelou às autoridades de Islamabad para dar mais tempo e condições para que os afegãos possam abandonar o país.

As agências humanitárias têm avisado que os afegãos que são forçados a regressar enfrentam perigos graves, num país com enormes carências económicas agravadas pelo corte de toda a ajuda internacional na sequência da subida ao poder dos taliban. O cenário poderá piorar consideravelmente com a chegada do Inverno durante os próximos meses.

Desde o Verão de 2021 que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) tem em vigor um aviso para que os migrantes afegãos no estrangeiro não sejam obrigados a regressar, incluindo requerentes de asilo mesmo que os seus pedidos tenham sido rejeitados.

“Numa altura em que o governo dos taliban proibiu o ensino a raparigas para além do sexto ano, com sanções económicas e infra-estrutura devastada pela ‘guerra ao terror’, além dos recentes sismos em Herat, deportar pessoas que vieram para o nosso país procurar refúgio é deplorável”, escreve no site do jornal Dawn a socióloga Tania Saeed.

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