Aos 50 anos, a Pinto Lopes Viagens já passou de pai para filho e segue viagem

O operador turístico nasceu em Portugal em 1973 com viagens de autocarro pela Europa. Mas já chegou a todos os continentes, com circuitos culturais e viagens “fora da caixa”. A estrear: o Iraque.

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Rui Pinto Lopes, líder de operações. O seu pai foi o fundador da agência DR
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Se Rui Pinto Lopes pudesse “tirava um ano sabático, sozinho, para fazer uma volta ao mundo”, diz em tom de brincadeira. Sempre apoiado por uma agência porque “só uma agência pode trazer de volta se acontecer algo” — “é sempre melhor viajar sob o chapéu de agência, com todos os seguros, o know-how, uma série de ferramentas para ajudarem os viajantes”. Como não pode, ajuda os outros a darem voltas ao mundo — um circuito de cada vez. É o líder de operações na Pinto Lopes Viagens, que opera actualmente 800 circuitos em 150 países, de todos os continentes. E cumpre 50 anos em 2023 com o seu melhor ano de sempre (com 30 mil viajantes), com a mesma filosofia — circuitos culturais em grupo com guia — e mantendo o mesmo espírito aventureiro — a obrigação de incorporar pelo menos um país novo por ano no portfólio (ou, à medida que o mundo começa a escassear, novos circuitos).

Depois de já ter estado na “Coreia do Norte, Paquistão, Arábia Saudita e Sudão …”, enumera, este ano a Pinto Lopes Viagens estreia-se no Suriname e Guiana Francesa: a viagem inaugural começou no dia seguinte ao da nossa conversa, em meados de Outubro, e entre os viajantes está “o Pinto Lopes, the one and only”, aponta Rui — ou seja, Joaquim Pinto Lopes, 78 anos, seu pai, fundador da agência de viagens corria o ano de 1973. Já não tem funções oficiais na empresa, mas a vontade de viajar não esmorece. “Conhece mais de 150 países, viaja desde os 16 anos, é um cidadão do mundo”, resume o filho. E é, acrescenta, “o viajante que mais se diverte com a Pinto Lopes”: “já não vai sozinho a liderar grupos, mas continua a ter acesso aos microfones, como dizemos. Tem histórias brutais e experiências únicas”. Uma espécie de “a sua vida [que se confunde com a da agência] dava um filme” — ou pelo menos um livro, que até vai ser publicado no dia 16 de Novembro com autoria de três escritores-viajantes, José Luís Peixoto, Gonçalo Cadilhe e Raquel Ochoa, todos eles líderes de viagem da agência: “E mais mundo houvesse”, é o titulo do livro; “se houvesse viagens à lua, ele iria”, assevera o filho.

Da Europa para o mundo e a (re)descoberta de Portugal

Quando Joaquim Pinto Lopes fundou a agência não era um neófito no transporte de passageiros — esse é o negócio de família desde 1870, conta Rui. Na altura, com diligências, cavalos. Ainda hoje, a família continua a ter empresa de autocarros. Mas, então, em 1973, Joaquim, representante da sexta geração da família no transporte de passageiros — e com experiência em conduzi-los, “foi assim que conheceu Portugal, de Bragança a Vila Real de Santo António”, algo que se viria a provar muito útil durante a pandemia —, resolveu “experimentar as viagens de grupo pela Europa”. Em autocarros, pois claro, até porque “a pouca capacidade financeira dos portugueses” tornava “os aviões impossíveis”. O modelo já era o mesmo, circuitos culturais (em grupo, com guia), que Rui considera ter sido por uma questão de nicho de mercado e gosto pessoal. Aos 16 anos, Joaquim tinha feito a sua primeira viagem sozinho, por Portugal, aos 19, 20 “correra a Europa toda de carro com dois amigos”. “Hoje temos toda a informação, em 1965 não me parece que tenha sido fácil”, comenta Rui Pinto Lopes.

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Joaquim Pinto Lopes, 78 anos, o fundador da agência de viagens em 1973 Alfredo Cunha

Com um grupo de 17 pessoas, “amigos”, dá-se o pontapé de partida para “esta longa aventura” — e as palavras já são de Joaquim Pinto Lopes, no site da agência: “Eram tempos difíceis, em que a geopolítica transformava fronteiras em barreiras quase intransponíveis. Impunha-se um espírito aventureiro, de mochilas e tendas, sacos-cama e farnéis, autocarros com bagagem no tejadilho e sem ar condicionado.”

Em 1974, o 25 de Abril suspende a incipiente aventura-negócio, que regressa em 1975 para não mais se interromper, “alargando o portfólio na Europa” — “são as viagens paulatinamente a crescer, sempre com a empresa de autocarros”. Até que em 1992, assinala Rui Pinto Lopes, “com a liberalização do mercado aéreo”, abriu-se o mundo. A agência começa a “trilhar outros caminhos, fora da Europa”. Primeiro, o Brasil, “pela ligação portuguesa”, depois os Estados Unidos da América, depois a Índia. Curiosamente, foi um acontecimento na Europa, aqui ao lado, que constituiu “um virar de página”: para a Expo de Sevilha montou-se uma operação que mudou o rumo de tudo. Foram “35 viagens para um destino só”, o que resultou num “know-how e num potencial de clientes muito grande” que saiu ainda mais reforçado na exposição universal de 1998, que, “apesar de ser em Portugal”, deu origem a cem viagens da Pinto Lopes Viagens — agora, sim, já com nome oficial e espaço físico aberto em 1994.

Em 2012, novo marco na agência que também é operador turístico: o conceito de viagens de autor que se iniciou com três autores e agora vai em 11, “alargando o leque de temas”. Há escritores e chefs, historiadores, artistas plásticos e até um maestro, por exemplo. E, entretanto, em 2020 a pandemia fecha o mundo — “O meu pai disse: vamos reinventar-nos em Portugal”, recorda Rui.

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Rui Pinto Lopes dr

Foram criados 20 circuitos no país, para “descobrir novos cantos e recantos de Portugal”. Visitaram os lagos do Tua e do Sabor, Alentejo, Algarve e interior e litoral, fortalezas da raia, aldeias do xisto, seguiram os Passos de Santo António e percorrem N222, N15, N3 — “até a A1 fizemos”. E, sublinha, Rui, foram a primeira agência a explorar a N2, “antes que se começasse a falar dela”. Conseguiram fazer 50 viagens em Portugal, “e todas esgotadas”, e mais dez fora. “É pouco, menos de 10 por cento da produção, mas num momento em que estava tudo parado…”. Em 2021, já foram 300 as viagens “com o mundo ainda praticamente fechado”, nota Rui, incluindo um novo circuito nos Emirados Árabes Unidos, que englobava os sete emirados (“da mais alta cadeia montanhosa, Al Hajar, a portos portugueses”).

Alterações climáticas e “gabinete de guerra…ou paz”

“Não parámos”, reforça Rui, e 2023 surge, então, como o melhor ano de sempre “em termos de produção”. Fizeram-se, por exemplo, 35 viagens aos fiordes da Noruega, outras tantas à Croácia, ao Sul de Itália e aos lagos italianos, e 30 à Índia; à Irlanda foi-se 15 vezes, as mesmas que à tríade Vietname-Laos-Camboja; 12 ao Japão… Preparam-se para “aumentar a oferta em África” e já têm novos circuitos para arrancar no próximo ano — por exemplo, mais dois na Índia (serão dez) e na China (passarão a cinco). Além de uma nova grande viagem, ao Iraque — “começámos com duas, já estão esgotadas, vamos lançar a terceira”.

Rui não tem dúvidas de que têm “os melhores clientes do mundo” — “querem viajar”. E nas viagens querem “cultura, segurança e bom aproveitamento do tempo”, ou seja, “não querem muitos dias livres”. É um público “eminentemente cultural”, resume, cujo perfil não mudou muito desde os anos 70, “muitos professores, bancários, médicos, advogados”. E embora o público-alvo se mantenha acima dos 50 anos, há cada mais vez mais clientes abaixo desta idade, “para destinos menos convencionais”.

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Pinto Lopes Viagens em Lisboa MIGUEL SEQUERRA

Na verdade, a Pinto Lopes Viagens tem um catálogo de destinos que vai desde o Tajiquistão, “que não tem turismo quase nenhum”, a Veneza e Roma, “massacradas” — “temos um espectro enorme, qual é o certo não sei”, responde Rui sobre a pressão turística em alguns locais. “Sei que tentamos ir pela via do menor impacto possível e pegada menor”, afirma. Em algumas cidades ficando, por exemplo, em hotéis centrais que permitam andar a pé ou de transportes públicos “de forma controlada”, inserindo em algumas viagens, “não muitas”, “componentes de caminhadas e criando circuitos “com dias de visitas a pé”. “Cem por cento de viagens a pé pelo mundo? É impossível”, nota Rui, “agora em algumas usamos comboios eléctricos, como no Japão, e estamos atentos aos autocarros eléctricos que, por agora, têm pouca autonomia para este tipo de viagens”.

Não são, contudo, as alterações climáticas ou a turistificação o maior desafio do turismo e das agências de turismo, avalia Rui. “É a paz. Pode ser um chavão mas não deixa de ser verdade.” “Nos últimos anos, a geopolítica mundial mudou muito”, considera — apontando a guerra entre a Rússia e a Ucrânia como paradigma. “Tínhamos 40 grupos que faziam aquela zona, Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Moldávia, e estão interditos”, explica, “e países limítrofes, como os Bálticos, Roménia, Polónia, Arménia e Geórgia, foram afectados”. O conflito em Israel e Faixa de Gaza é o mais recente e se “os grupos para Israel foram suspensos”, a operação nos países vizinhos, Líbano, Jordânia e Egipto, está a decorrer normalmente.

“Há condições de volatilidade muito grandes no mundo”, diz, “e as crises económicas tornam-se secundárias face ao que vivemos agora”. Tanto que, ironiza, depois do departamento de vistos se ter tornado, durante a pandemia, no departamento da covid-19, “qualquer dia será gabinete de guerra… ou paz…”. O que é certo, assegura, é que a Pinto Lopes Viagens não vai parar de criar viagens e novos circuitos “fora da caixa a sítios de beleza ímpar” — tudo na “procura incessante por trazer novos mundos ao mundo”.

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