Ex-gestor contraria tese do MP e confirma que acordo de Salgado com Pinho é de 2004
A teoria do Ministério Público é que Salgado terá garantido a Pinho uma série de benefícios, entre eles a reforma aos 55 anos, dias antes ir para o Governo, em 2005, como forma de o corromper.
Rui da Silveira, advogado e antigo administrador do BES, foi arrolado como testemunha do Ministério Público (MP) para esta terça-feira, mas acabou por contrariar a teoria da acusação, segundo a qual Ricardo Salgado terá garantido a Manuel Pinho uma série de benefícios, entre eles a reforma aos 55 anos, dias antes de este ir para o Governo, em 2005, como forma de o corromper.
A testemunha garantiu, tal como Pinho já havia relatado, que o acordo era de Março de 2004. Rui da Silveira disse numa reunião da Comissão Executiva do BES que tinha sido decidido que Pinho iria desempenhar outras funções. Este antigo administrador diz mesmo que o antigo governante iria ter funções no BES e no Grupo Espírito Santo (GES). “Isso consta de uma acta onde até lhe agradeceram o desempenho dos 10 anos na comissão executiva e deram-lhe funções mais vastas”, sublinhou com a acta na mão e disponibilizando-se para deixar uma cópia ao tribunal.
Depois, segundo Rui da Silveira, para Pinho aceitar essas funções houve um acordo e Salgado entregou uma folha manuscrita com uma serie de cláusulas remuneratórias associadas às funções onde efectivamente constava a questão da reforma aos 55 anos. “Era para eu fazer daquele acordo um esqueleto jurídico para depois ser dactilografado”, disse, sublinhando que estava efectivamente a questão da reforma: “A passagem à reforma aos 55 anos com uma pensão equivalente a 100% do salário pensionável (cerca de 62 mil euros mensais)”.
Mas Rui Silveira explicou que esta questão aplicava-se se a pessoa estivesse em funções executivas no banco no momento em que fizesse os 55 anos e o que aconteceu com o antigo governante é que quando pediu a sua pensão não se aplicava. O antigo administrador explicou que os estatutos do Fundo de Pensões eram claros: “Se a pessoa não estivesse a exercer funções executivas teria de esperar pelos 65 anos e o valor seria mais baixo. No caso de Pinho tinha saído do banco para o Governo”.
Esta testemunha também acabou por ajudar a defesa de Pinho a demonstrar que os pagamentos através do “saco azul” do GES foram prolongados no tempo, a vários gestores, incluindo ao próprio Rui da Silveira que como advogado da família desde 1981 recebia uma avença. Portanto, "o saco azul" não seria apenas para pagar subornos e a tese da defesa é que Pinho recebia prémios.
Rui da Silveira começou por dizer que o BES só pagou remunerações através de sociedades no estrangeiro até 2004 e que ele próprio e outros enquanto, membros da Comissão Executiva do Banco, pugnaram para que essa ilegalidade terminasse no BES. No BES terá terminado efectivamente, mas não noutras empresas do GES.
O advogado Ricardo Sá Fernandes recordou à testemunha que havia em 2013 um registo com planos de pagamentos para 2014, com uma lista de nomes onde também constava o seu e ainda recordou que também foi através do “saco azul” que vários administradores do BES, incluindo o próprio Rui da Silveira, contribuíram para a campanha das presidenciais de Cavaco Silva em 2011.
Na realidade, Pinho só não viu serem confirmados os pagamentos dos seus prémios mensais. Nem Rui da Silveira, nem Joaquim Goes, antigo administrador executivo do BES que, entre outras áreas, era responsável pelos recursos humanos do banco, e que também testemunhou esta manhã, os confirmaram. Garantem que eram anuais e que nunca ouviram falar de prémios mensais.
"Só tenho conhecimento dos prémios que eram pagos anualmente na Suíça e tinham que ver com os resultados do banco", disse Joaquim Goes que, como foi também presidente da Espírito Santo Informática, acabou por ser confrontado por Ricardo Sá Fernandes com o facto de ter tido como um dos seus vogais Miguel Rio-Tinto, o ex-marido da juíza-adjunta. Joaquim Goes disse desconhecer a forma como o seu antigo subordinado era pago, uma vez que este tinha cargos noutras empresas do grupo.
Neste processo, Manuel Pinho responde por dois crimes de corrupção passiva, um de branqueamento e um de fraude fiscal, enquanto a Ricardo Salgado o Ministério Público imputa dois crimes de corrupção activa e um de branqueamento. Já Alexandra Pinho responde por um crime de branqueamento e outro de fraude fiscal, ambos em co-autoria com o marido.
De acordo com a acusação, Manuel Pinho, enquanto ministro da Economia (cargo que ocupou de 2005 a 2009) e, depois, como responsável pela candidatura de Portugal à organização da competição de golfe "Ryder Cup", actuou em detrimento do interesse público, na prossecução de interesses particulares do Grupo Espírito Santo (GES)/Banco Espírito Santo (BES) e de Ricardo Salgado. Alexandra Pinho senta-se no banco dos arguidos porque, segundo o MP constituiu com o marido a "Tartaruga Foundation" e outras sociedades para alegadamente ocultarem os pagamentos feitos por Ricardo Salgado a Manuel Pinho. Já o ex-líder do Banco Espírito Santo, Ricardo Salgado, está acusado de ter subornado o então ministro da Economia, Manuel Pinho, com valores superiores a cinco milhões de euros.