Mário Centeno diz que falta “medir o esforço” da acção climática
Governador do Banco de Portugal diz que é preciso mais dados e análises sobre o combate às alterações climáticas, uma vez que medir esse esforço é fundamental para “não gerar frustração nas pessoas”.
O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, disse esta segunda-feira que é preciso recolher mais dados e fazer mais análise sobre o combate às alterações climáticas, considerando que medir esse esforço é fundamental para evitar a frustração das pessoas.
Na conferência do Banco de Portugal intitulada "Liga-te aos dados", que pretendia assinalar o Dia Europeu da Estatística, Mário Centeno destacou a importância da recolha e análise de dados na economia e sociedade actual. O responsável sublinhou que é preciso mais trabalho na recolha, análise e divulgação de dados relativamente ao combate às alterações climáticas.
"Temos feito um enorme esforço em tornarmo-nos muito mais amigos do ambiente, mas precisamos de medir esse esforço, o progresso que esse esforço dá", afirmou na sua intervenção, dirigida a estudantes e transmitida no canal do banco central no Youtube.
Mário Centeno considera que ter esse conhecimento "é essencial para não gerar frustração nas pessoas". Isto porque a população, por desconhecer os dados, pode sentir que nada é feito nesta matéria.
Para o responsável, é assim preciso recolher mais dados sobre a acção climática, analisar informação e divulgá-la. Os bancos centrais são fundamentais nesse papel, porque têm "mais tempo, recursos e qualificações", referiu.
Centeno vincou que a vantagem de um banco central é precisamente dispor de mais tempo para investir nesse trabalho de fundo, comparando com a disponibilidade que tinha quando foi titular das pastas das Finanças de executivos socialistas liderados por António Costa.
"No tempo em que fui ministro das Finanças tinha receio ao subir a escadaria do Ministério das Finanças que, quando chegasse ao meu gabinete, um assunto já tivesse passado o prazo para ser resolvido", afirmou.
O responsável destacou "o ritmo completamente diferente" do Banco de Portugal e como esta instituição tem o dever de "entregar à comunidade o resultado do trabalho" que faz todos os dias. "É um trabalho de elevadíssima qualidade e que tem de ser escrutinado a todo o momento", disse Centeno.
César das Neves: dados ou sabedoria?
Na mesma conferência, o economista João César das Neves, professor da Universidade Católica, considerou que os dados "são muito perigosos" e que é fácil "fazer aldrabices" com a manipulação dos dados ou até falsificando dados. Deu o exemplo de Thomas Malthus que, no século XIX, previu um crescimento catastrófico da população humana com base em dados falsos.
César das Neves disse ainda que, quando o Governo divulga a proposta do Orçamento do Estado, como aconteceu este mês, se fecha em casa durante cinco horas. Todos os anos, faz as mesmas contas e, com isso, o economista acredita fazer análises diferentes das de outros intervenientes da opinião pública. Segundo afirmou, não vai atrás dos dados de que se fala no momento.
Para o professor catedrático, apesar de se falar tanto em dados, em verdade "ninguém quer dados, o que quer é sabedoria" e recordou a pirâmide do conhecimento, em que na base estão os dados, depois a informação, depois o conhecimento e, no topo, a sabedoria.
"Os dados são a matéria-prima, dados há muitos, toneladas de dados, mas a maior parte daquilo é lixo", afirmou.
Segundo César das Neves, quando começou a carreira a única fonte que usava era o Banco de Portugal, porque tinha qualidade muito superior à do Ministério das Finanças ou do Instituto Nacional de Estatística e que, desde então, todas essas entidades fizeram um caminho muito importante e que hoje em Portugal "a qualidade técnica [dos dados das instituições públicas] é boa, os dados são sólidos".
Mesmo a informação do Orçamento do Estado, disse, há uns anos "era uma aldrabice" e "melhorou muito", a que ajudou a criação de entidades como Conselho das Finanças Públicas (CFP) e Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO).
Contudo, o economista aproveitou a conferência para deixar uma crítica ao Banco de Portugal, considerando que a "qualidade dos dados aumentou espantosamente, o conhecimento aumentou", mas que a informação prestada por este se tem reduzido. Há uns anos, disse, quando queria sugerir publicações para compreender a economia portuguesa sugeria o Boletim Estatístico, a Síntese Mensal da Conjuntura e outras publicações no Boletim Anual. Hoje, disse, o Banco de Portugal tem milhares de séries no BPstat mas "desistiu de fazer a selecção dos dados".
"Sinto esta falta e não quis deixar de dizer isto", afirmou João César das Neves, acrescentando que no futuro deverá aparecer junto aos dados o que hoje aparece nos rótulos das bebidas alcoólicas "Beber com moderação".