Queimar floresta para produzir energia é “falsa energia renovável”, alertam associações

Dia Internacional da Acção sobre a Biomassa em Grande Escala celebrou-se a 19 de Outubro. Associações ambientalistas alertam para perigos do aumento da capacidade de queima de biomassa florestal.

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A exploração da energia da biomassa em larga escala pode deixar de ser sustentável Duarte Drago

Várias associações de defesa do ambiente alertaram esta semana para os perigos do aumento da capacidade de queima de biomassa florestal para energia, entre os quais o de potenciar incêndios.

"O argumento da redução do perigo de incêndio florestal pela valorização energética da biomassa florestal primária não passa de um perigoso mito propagandeado pelo sector industrial", acusam as associações associações Quercus, Acréscimo e Iris num comunicado a propósito do Dia Internacional da Acção sobre a Biomassa em Grande Escala, criado por organizações ligadas ao ambiente, que este ano se celebrou a 19 de Outubro.

Também a associação ambientalista Zero alerta que a queima de floresta para a produção de energia é insustentável, e diz que a energia gerada não pode ser considerada renovável.

Pressão para cortar árvores

O Governo aprovou recentemente um diploma para o lançamento de concurso para centrais de biomassa. Reconhecendo que pequenas centrais de base local podem ser benéficas, as associações Quercus, Acréscimo e Iris sublinham que Portugal já tem uma capacidade industrial instalada de queima de biomassa "muito grande", superior a 865 MW.

Esta capacidade instalada, explicam, implica já uma necessidade de material "superior ao dobro do recomendado como disponível", que muitas vezes é constituído "não por sobrantes, mas por troncos de árvores". Aumentar a capacidade industrial, afirmam as associações, aumenta assim o perigo de "perda de coberto arbóreo autóctone", pela pressão dessas unidades para terem material para queima directa ou para produção de pellets.

Outro perigo, de acordo com o comunicado, relaciona-se com a expansão de espécies exóticas e invasoras ou o aumento da plantação de eucaliptos para fins energéticos. E a queima de todo esse material gera emissões de monóxido e dióxido de carbono, recordam.

As associações Quercus, Acréscimo e Iris alegam ainda que, em Portugal, o aumento da capacidade do uso da biomassa para a produção de energia coincide com o aumento da área ardida em povoamentos florestais. "Se o Governo quer valorizar os sobrantes silvícolas e reduzir o perigo de incêndios deve valorizar os sobrantes como fertilizantes, usar a biomassa triturada para regenerar a floresta, e usar a biomassa para produção de calor em unidades de base local", concluem as associações.

"Falsa energia renovável"

Esta semana, um conjunto de mais de 200 organizações ambientalistas de todo o mundo manifestou a sua preocupação de se queimar a biomassa para gerar energia, defendendo uma aposta em verdadeiras energias renováveis.

Em Dezembro, na COP28, a cimeira do clima das Nações Unidas, que se realiza no Dubai, vai acolher a discussão sobre o objectivo global para as energias renováveis. As associações avisam que a energia gerada pela combustão de biomassa florestal não deve ser incluída na categoria das energias renováveis aqui promovidas, por gerar grande volume de emissões de dióxido de carbono (CO2).

"A queima de biomassa florestal para fins energéticos é frequentemente apelidada de 'falsa energia renovável', porque não passa nos critérios básicos: não tem baixas emissões, não é limpa e o potencial renovável é questionável", lê-se no comunicado da Zero.

As organizações alertam que a queima de biomassa florestal emite, pelo menos, tanto CO2 como a queima de carvão por unidade de energia produzida, além de contribuir para a desflorestação e a violação dos direitos das comunidades locais em todo o mundo. A Zero acrescenta que são necessárias décadas - ou mesmo séculos - para que as florestas cresçam novamente e sequestrem o carbono libertado por essa queima.

Proteger florestas

A associação lembra que para se limitar o aumento da temperatura mundial a 1,5 graus Celsius, como indica o Acordo de Paris sobre o clima, é preciso retirar CO2 da atmosfera. Uma forma de o fazer é proteger e restaurar as florestas naturais. Abater árvores em larga escala para produzir energia reduz a capacidade de sequestro das florestas.

Além de dispersar o investimento que deveria ser concentrado em outras energias renováveis, usar a biomassa prejudica ainda a saúde e o bem-estar humanos.

A Zero tem também alertado para a exploração insustentável dos recursos florestais, ao ser usada madeira de qualidade para produzir pellets ou para fazer energia, quando só deviam ser usados resíduos florestais ou industriais. Para a associação, continua a não haver garantias de uma utilização sustentada dos recursos.

É preciso, acrescenta, que se cumpra a lei nesta matéria, que se conheça o verdadeiro potencial de resíduos florestais passíveis de utilização no sector energético, e que se avalie o impacto que as centrais de biomassa têm na prevenção de incêndios. E que se aposte em verdadeiras formas de energia renovável.