Um livro para dar um pouco de sentido a um “Mundo às Avessas”
Crónicas de uma era turbulenta e angustiosa, escritas por Nuno Severiano Teixeira, passam das colunas do PÚBLICO para edição em livro
Os leitores habituais do PÚBLICO há muito se habituaram a encontrar a cada quinzena um curto ensaio de opinião assinado por Nuno Severiano Teixeira e destinado a procurar o sentido possível das mudanças que fazem do nosso mundo um mundo cada vez mais “às avessas”. Nessas colunas, Nuno Severiano Teixeira revela-se acima de tudo na pele de um académico conceituado nas áreas da História e das Relações Internacionais. Mas, no estilo e no propósito desses textos, encontram-se também o empenho de um jornalista, sempre preocupado em dar legibilidade ao que escreve, e a convicção de um democrata, a cada passo motivado a tomar posição e a alertar para as disrupções na ordem internacional ou para as consequências das derivas autoritárias que se propagaram na Europa e no Mundo nas últimas décadas.
Ler “O Mundo às Avessas” no formato de livro que, já se encontra nas bancas, é, por isso, um exercício tão estimulante como necessário. Estimulante porque a forma como Nuno Severiano Teixeira analisa os cruzamentos entre as heranças e tradições diplomáticas dos estados com as suas acções no presente nos remete para um campo de reflexão e de inteligência notáveis. Mas igualmente necessário porque é crucial nestes tempos turbulentos dispor de âncoras e de perspectivas nos que permitam perceber e julgar melhor a causalidade dos sucessivos distúrbios que afectam a Europa e o mundo. Nas palavras de David Pontes, director do PÚBLICO, durante apresentação do livro, ontem, Nuno Severiano Teixeira possui a “clarividência de ver para além da espuma dos dias.”
Distribuída ao longo de 384 páginas e dividido em 13 capítulos, a colectânea de textos escolhidos da rúbrica de Nuno Severiano Teixeira no PÚBLICO abarca um vasto leque de temas. “Esta forma de organização exprime directamente o benefício que cada um de nós pode retirar do livro”, destacou Augusto Santos Silva, na apresentação que teve lugar no auditório do PÚBLICO. “Os textos são reflexões abertas, muitas delas inconclusas, que alimentam a nossa imaginação com ideias do autor que não representam apenas as suas opiniões, mas que representam também as suas opiniões”.
“Há ingredientes suficientes para despertarem a vossa atenção”, garantiu o presidente da Assembleia da República. E, como nota Carlos Gaspar no prefácio, essa dispersão e eclectismo têm um ponto de convergência: a ameaça a o fim de uma era. “A crónica do nosso mundo, onde o regresso da guerra, a surpresa da pandemia e a ressurgência do autoritarismo vieram pôr em causa a paz, o direito e a estabilidade que prevaleceram na política internacional durante 30 anos”, lê-se no prefácio.
O que se ganha na leitura desses textos (ou na sua releitura), porém, não é apenas o retrato estático da pandemia, da guerra na Ucrânia ou no florescer de autoritarismos que, como diz Gaspar, “puseram o mundo da geração de 89 às avessas”: o que sobressai nos textos de Nuno Severiano Teixeira é a qualidade e abundância de chaves para se contextualizarem e entenderem esses retratos. Como destacou na apresentação “d’O Mundo às Avessas”, este livro é “particular”. “É um livro de um académico, mas não é um livro académico. É um livro de opinião”, sublinhou o autor.
Nuno Severiano Teixeira situa o campo teórico onde se move como estando “próximo do institucionalismo liberal, sem ser alheio ao construtivismo”. Mas, para o leitor comum, mais importante que a epistemologia é a atitude ou, regressando a uma designação do passado, à função do seu papel como intelectual. Se “n’O Mundo às Avessas’ a análise se procura axiologicamente neutra, a opinião toma partido”, esclarece Nuno Severiano Teixeira. É aí que se percebe a dimensão democrática e humanista do autor. Um liberal que abomina as autocracias, que privilegia o diálogo e a diplomacia como instrumentos para a garantia da paz, que coloca os Direitos Humanos sempre na primeira linha das escolhas ou das visões do mundo que a cada passo é obrigatório ter. Como Nuno Severiano Teixeira escreve, ainda antes do brutal ataque do Hamas a Israel e da também brutal resposta de Israel em Gaza, “quem sacrifica os valores em função dos interesses perde desde logo os valores, mas acaba, no longo prazo, por perder também os interesses”. “Se déssemos mais atenção aos valores e um pouco menos aos interesses, talvez o mundo estivesse menos 'ao avesso'”, destacou antes dos agradecimentos finais.
“O Mundo às Avessas” é uma edição da Tinta da China e do PÚBLICO. Encontra-se à venda nas livrarias, na loja do PÚBLICO em Lisboa e no site do jornal (loja.publico.pt)
Actualizado a 8 de Novembro, com a apresentação do livro, que decorreu no auditório do PÚBLICO