Uma em cada quatro pessoas que cresceram numa família com baixos recursos é pobre

Estudo conclui que filhos de trabalhadores não qualificados têm uma taxa de risco de pobreza três vezes maior do que a dos filhos de especialistas das actividades intelectuais.

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A situação laboral dos pais é determinante para a situação de pobreza dos filhos Paulo Pimenta (arquivo)
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Quem cresceu em famílias com menos recursos económicos e com uma menor escolarização enfrenta um maior risco de ser pobre na vida adulta: uma em cada quatro pessoas que cresceram com estas condições permaneceu nessa situação. E quem, por exemplo, cresceu com um pai apenas com o ensino básico é duas vezes mais afectado pela pobreza face a quem teve um pai com o ensino secundário — o que se reflecte também no próprio percurso académico, tradicionalmente um "elevador social".

Entre os adultos cujo pai tem o ensino básico,​ apenas 20% completam o ensino superior — uma percentagem que sobe para 58,5% e 75,6% para adultos com pais com ensino secundário ou superior, respectivamente.

Estas são algumas das conclusões do relatório Portugal e o Elevador Social: Nascer Pobre É Uma Fatalidade?, que pretende ser um complemento ao estudo Portugal, Balanço Social, que analisa indicadores referentes à pobreza e às condições socioeconómicas das famílias que vivem em Portugal. Os seus autores são Bruno P. Carvalho, Miguel Fonseca e Susana Peralta, investigadores do Nova SBE Economics for Policy Knowledge Center.

O estudo, que é apresentado nesta terça-feira, Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, olha ainda para a situação laboral, revelando que "um em cada quatro adultos que, aos 14 anos, tinham um pai desempregado é pobre", o que sugere que "a situação laboral dos pais é determinante para a situação de pobreza dos filhos, quando atingem a idade adulta".

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A análise debruça-se sobre a transmissão da pobreza de pais para filhos, tendo por base dados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR) de 2019, em particular sobre a situação económica presente e do seu agregado quando tinha 14 anos. Conclui ainda que a profissão dos pais assume particular relevância no que ao futuro profissional dos filhos diz respeito: "Filhos de agricultores e de trabalhadores não qualificados têm uma taxa de risco de pobreza três vezes maior do que a dos filhos de especialistas das actividades intelectuais (22% e 7%, respectivamente)."

A própria composição familiar tem também influência no percurso dos seus jovens, já que a análise conclui que os adultos que cresceram em famílias monoparentais "têm uma probabilidade de 20% de ser pobres". Para os que viviam em famílias numerosas, esta probabilidade é de 23% e para os que não viviam com o pai aos 14 anos chega aos 17%, e aumenta para os 23% nos casos em que não houve contacto com o progenitor.

No caso dos adultos que viveram em instituições de acolhimentos, um em cada quatro é pobre.

As condições económicas das famílias também foram analisadas, concluindo-se terem um forte impacto na transmissão intergeracional da pobreza. Uma em cada quatro pessoas que cresceram numa família com parcos recursos económicos é pobre. E um em cada três adultos cuja família não conseguia satisfazer as suas necessidades de material escolar aos 14 anos é hoje pobre.

Quem cresceu em famílias onde havia dificuldade em ter refeições completas enfrenta uma taxa de pobreza de 22%, mais do dobro da verificada nas restantes famílias (10%).

Os investigadores compararam ainda gerações nascidas nas décadas de 60, 70 e 80, tendo concluído que quem cresceu em famílias com boa situação financeira enfrenta taxas de pobreza entre 11% e 13%, independentemente da década em que nasceram. No entanto, para quem cresceu em famílias com baixos recursos, essas taxas de pobreza fixam-se em 22% e 24%, o que lhes permitiu concluir não existir "evidência de que a transmissão intergeracional de pobreza esteja a diminuir".

O último Balanço Social, conhecido em Maio, concluía que a taxa de risco de pobreza após transferências sociais – ou seja, a proporção da população que vive com rendimentos abaixo do limiar de pobreza — era, em 2021, de 16,4%, dois pontos percentuais abaixo da de 2020, quando se fixava nos 18,4%. O que quer dizer que há menos 197 mil pessoas em risco de pobreza, tendo passado de 1,9 milhões em 2020 para 1,7 milhões em 2021, segundo revelaram os dados preliminares disponibilizados pelo INE. Tal significa que estas famílias tinham como rendimento disponível menos de 6653 euros por ano, ou seja,​ menos de 554 euros por mês.

Os autores deste estudo alertavam ainda para o facto de existirem mais de 2,2 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social –​ mais 250 mil face a 2019 –​, o que representa mais de um quinto da população portuguesa.

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