A urgência do regresso à diplomacia

As tragédias a que temos assistido nos últimos dias convocam-nos a um regresso urgente à via diplomática. Mais do que nunca, precisamos hoje de diplomacia e diálogo.

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O brutal choque dos ataques terroristas de 7 de outubro perdura há já mais de uma semana – e ainda não conhecemos todas as repercussões desta terrível tragédia.

Certo e seguro, como afirmámos desde a primeira hora, é o nosso dever de solidariedade para com Israel e o povo judeu, que viram centenas de inocentes morrer às mãos de terroristas do Hamas. Este dever existe por todas as razões. Mas também porque a atual ordem internacional, criada nos escombros da II Guerra Mundial, assenta no direito à existência do Estado de Israel, herdado pelos sobreviventes do Holocausto e tantas perseguições históricas.

É por se reconhecer esse direito basilar que se reconhece também o direito à defesa de Israel, o que inclui o direito à eliminação da capacidade militar do Hamas, que constitui uma fonte de repressão (não de defesa) dos civis de Gaza e uma ameaça em permanência ao Estado de Israel.

Igualmente certo e seguro é o direito do povo palestiniano à paz e à segurança.

Portugal tem sido vocal e coerente na defesa de uma solução de dois Estados, com base nas fronteiras de 1967, e Jerusalém como capital de ambos os Estados.

Não há vidas mais sacrossantas do que outras. É nosso dever ter consciência plena de que, se falharmos no reconhecimento desta verdade, abrimos portas à barbárie e cometemos o trágico erro de imaginar que é na violência que reside a solução. Privar, em Gaza, civis inocentes do acesso a água, comida e combustível é um castigo coletivo inaceitável.

E daí só pode sobressair hoje uma evidência: não é possível atingir a paz sustentável e duradoura pela via militar. Desde logo porque a via militar deve respeitar o Direito Internacional Humanitário. Mas sobretudo porque, eliminando-se o Hamas, continuará por resolver a extensão de profundas e válidas injustiças sentidas pelo povo palestiniano, que se consubstanciam em inúmeras resoluções (ignoradas) do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral das Nações Unidas.

Há três gravíssimos riscos que podemos antecipar desde já.

O primeiro, já a concretizar-se, é que a resposta militar israelita resulte em inúmeras vítimas civis e inocentes, entre uma população de dois milhões, sobretudo mulheres e crianças. Sabemos que os terroristas se escondem cobardemente atrás da população civil.

As obrigações à luz do Direito Internacional Humanitário são inequívocas. E a proteção de vítimas civis deve nortear todo e qualquer uso da força, mesmo que isso implique uma intervenção mais prolongada. Um estado de direito jamais pode confundir a sua legítima defesa com ações de vingança e violência cega.

O segundo risco é que a atual tragédia pode vir a alastrar-se, desde logo para Estados frágeis como o Líbano, a Síria e o Iraque. E o enorme (e latente) potencial de disrupção regional será rapidamente capitalizado por atores como o Irão, propenso a apoiar o extremismo.

O terceiro grande risco resulta da observação, feita por muitos, de que estes ataques terroristas são o 11 de setembro israelita. Beneficiando de duas décadas de distância, reconhecemos que a resposta foi muito imperfeita face aos horríveis atentados nos Estados Unidos.

Entre medidas compreensíveis e justificáveis, encontramos também graves erros geopolíticos e processos que, em democracia, não devem ter lugar. Racionalidade e lucidez, em detrimento das emoções, devem prevalecer para evitar consequências profundamente nefastas.

Aqui chegados, há uma só direção: a da diplomacia. O momento é de apaziguamento imediato, mas sobretudo de consolidação de um caminho para a paz sustentável – o que significa a solução de dois estados, vivendo lado a lado em paz e segurança.

Dir-se-á que não há condições para tal. Hoje talvez seja mais difícil, mas é-nos exigido que as criemos o mais rapidamente possível.

Dir-se-á que os moderados, os construtores de paz, já não existem. Mas só a defesa de uma abordagem política, em detrimento de uma apenas militar, é que permitirá aos moderados forjar soluções e criar a paz.

Dir-se-á que é inviável porque a expansão dos colonatos e a ocupação para lá das linhas de 1967 dissiparam a possibilidade de paz. Mas não há nada mais inviável do que o conformismo perante o atual estado de coisas.

As tragédias a que temos assistido nos últimos dias convocam-nos a um regresso urgente à via diplomática. A alternativa – mais violência atroz e mortes injustas – não é, na realidade, uma opção.

Mais do que nunca, precisamos hoje de diplomacia e diálogo.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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