Andaluzia pede água de Alqueva a Portugal: “O campo não pode esperar mais”

Aumentam as pressões dos agricultores de Huelva para que seja consumada a transferência temporária de água de Alqueva para a região espanhola. Já se admite a aplicação de medidas “mais contundentes”.

Foto
Este Verão a seca asfixio o Sul da Peninsula Iberica com a falta de agua a afectar sobretudo a região de Huelva e Doñana, em Espanha Nuno Ferreira Santos
Ouça este artigo
00:00
04:11

O Parlamento andaluz aprovou uma “proposta não legislativa”, o equivalente a uma recomendação ao Parlamento português, onde solicita, no âmbito “cooperação internacional hispano-portuguesa”, a “transferência dos direitos da água dos utentes da barragem de Alqueva (Portugal) para os utentes da bacia hidrográfica Tinto-Odiel-Piedras e Chanza”. Na informação publicada pelo Parlamento de Andaluzia sobre a reunião a 11 de Outubro, que o PÚBLICO consultou, a proposta teve cem votos a favor, cinco abstenções e dois contra.

O pedido de água a Portugal foi justificado pela “situação de seca extrema” que vive o mundo agrícola na região de Huelva e a proposta a solicitar a transferência dos direitos de água de Alqueva para a região espanhola foi apresentada pelo Partido Popular (PP) de Andaluzia que realça a urgência de o Governo espanhol “promover e levar a cabo as diligências adequadas”. A pressão já começou há algum tempo, mas ganhou mais força esta semana.

O governo de Andaluzia reforçou a argumentação do PP, apelando paraa necessária transferência temporária de direitos de água entre os utentes de Alqueva (Portugal) e os utentes do distrito hidrográfico Tinto-Odiel-Piedras-Chanza”, de forma a que esta operação “possa ser materializada num curto período de tempo”. É uma solução que as autoridades andaluzas classificam como uma “medida excepcional e de curto prazo para a grave situação de seca” que está a fustigar a região de Huelva.

A deputada do PP Berta Centeno frisou que a iniciativa do seu partido pretende dar resposta a um “problema gravíssimo que a província de Huelva tem com a seca”, alegando que a água “é vitalm, porque o peso que o sector primário tem na economia de Huelva é muito superior à média das restantes províncias da Andaluzia, só superado por Almería”.

Berta Centeno recorreu às comparações para destacar o volume “verdadeiramente impressionante” da barragem de Alqueva, “a maior da Europa Ocidental”, que é “alimentada principalmente por águas espanholas”. E reforça o seu argumento com o volume de água armazenado neste momento em Alqueva, 2834hm3 e, “ao lado, em Huelva, o distrito hidrográfico Tinto-Odiel-Piedras-Chanza tem apenas 371hm3 de água represada e está com 33% da sua capacidade”.

Da Coligação Eleitoral Por Andaluzia, o deputado Juan António Delgado lembrou a situação portuguesa, em que “também há seca”, realçando um pormenor importante: “De acordo com o regime de caudais do acordo de Albufeira, o pedido (do PP) não cumpre o acordo, porque o Guadiana também se encontra numa situação excepcional, [pelo que] o acordo terá primeiro de ser revisto.”

A vantagem portuguesa na reserva de recursos hídricos foi explicada pelo deputado do Vox Rafael Segovia: se “Portugal tem água, é porque tem as infra-estruturas que Huelva não tem”, factor que possibilitou o armazenamento em Alqueva de 4150hm3, enquanto todas as barragens de Huelva somam 1500hm3.

“O campo não pode esperar mais”

A pressão exercida sobre o Parlamento andaluz tem a sua origem nas movimentações e tomadas de posição do movimento associativo do sector agrícola de Huelva.

Na página online da Associação de Jovens Agricultores (Asaja) de Huelva, o seu secretário-geral, Félix Sanz, destacou o início das reuniões entre o Governo de Espanha e a Junta de Andaluzia “para procurar soluções para a irrigação da Coroa Norte de Doñana”. E uma das conclusões dessas reuniões realça a necessidade urgente de solicitar água a Portugal para irrigação.

Félix Sanz salienta que “não deverá haver problemas com a transferência de água”, até porque a albufeira de Alqueva “está a 70% da sua capacidade, pelo que a bombagem é viável”. Entretanto as organizações agrícolas “não excluem medidas mais contundentes, se as administrações não agirem”, frisando que “o campo não pode esperar mais”.

Alguns órgãos de comunicação social da Andaluzia reportam a existência de negociações entre as autoridades dos dois países ibéricos para analisar a captação de água a partir do rio Guadiana junto à aldeia do Pomarão (Mértola).

Nas explicações prestadas ao PÚBLICO, o gabinete de comunicação do Ministério do Ambiente e da Acção Climática (MAAC) disse que até à data “não foi recebido qualquer pedido” ou contacto por parte das autoridades espanholas para autorizar o envio de 100hm3 para Huelva, embora tenha conhecimento de que o volume de água pretendido “tem sido referido em órgãos de comunicação social de Espanha”.

Contudo, reconheceu ainda o ministério tutelado por Duarte Cordeiro, “Portugal tem em curso com Espanha uma negociação para a definição do regime de caudais na secção de Pomarão no rio Guadiana”.