Vamos comer à mesa com os generais das Linhas de Torres
O que comiam os generais que enfrentavam Napoleão? Eis gastronomia histórica em restaurantes locais, de 13 a 22. Que tal bifinhos de javali ou o Prato de Batalha? Extra: duas receitas para praticar.
Outubro é um bom mês para voltarmos atrás no tempo, aos dias em que se batalhava pelo país pelas Linhas de Torres, e sentarmo-nos À Mesa dos Generais. É uma iniciativa da Rota Histórica das Linhas de Torres, de 13 a 22 de Outubro, que envolve 22 restaurantes da região (a rota abrange os municípios de Arruda dos Vinhos, Loures, Mafra, Sobral de Monte Agraço, Vila França de Xira e Torres Vedras) e que teve como consultor Nuno Nobre.
Foi no início do século XIX que, na zona de Torres Vedras, se começou a construir um sistema de defesa com 152 fortificações, para tentar proteger Lisboa dos avanços das tropas de Napoleão. O britânico Arthur Wellington chefiava o exército que, com tropas britânicas e portuguesas, fazia frente aos franceses – e para o homenagear há, nas ementas dos restaurantes aderentes, pratos como o mexilhão à general Wellington, o bife Wellington ou o leite creme à Lord Wellington.
Sob o mote À Mesa dos Generais recuperam-se receitas oitocentistas, uma forma de chamar a atenção para um acontecimento histórico que se comemora a 20 de Outubro, o Dia Nacional das Linhas de Torres, e de promover a rota histórica, que tem o seu Centro de Interpretação em Bucelas.
Cada um dos 22 restaurantes apresenta pelo menos dois pratos desse receituário histórico, que serão servidos com vinhos da região. A compilação das receitas, feita a partir de uma investigação sobre os produtos disponíveis na época, as formas de conservação e os temperos mais usados, é um documento muito completo, que, baseando-se em vários livros de referência, explica as diferenças entre o que era a alimentação do povo e a da nobreza e dos exércitos, o português, o inglês e o francês.
É que “no centro dos conflitos, as chefias militares não deixavam de ter as suas prerrogativas, entre as quais se salientava uma mesa farta”, escreve Ana Marques Pereira em Mesa Real – Dinastia de Bragança, uma das obras citadas. Aqui também se pode ler que “O príncipe regente, D. João, mandou publicar, em 1796, um novo decreto, já anteriormente editado em 2 de Abril de 1762, em que se regulava a mesa do general-chefe e mais oficiais do Exército. Nele se determinava o número e a qualidade dos pratos com que deviam ser servidas as mesas dos mesmos, evitando o uso de baixelas e de louça da Índia e estipulava-se o número de comensais à mesa.”
É ainda a mesma autora que nos revela que “Napoleão nunca foi conhecido como gastrónomo. Os seus gostos eram simples, gostava de feijão, de lentilhas, de massas italianas e de molhar o pão nos molhos. Quase não bebia vinho e dedicava pouco tempo às refeições.” O exército francês subsistia com as pilhagens que ia fazendo à medida que avançava em direcção às Linhas de Torres e, segundo as memórias do capitão francês Jean-Baptiste Lemonnier-Delafosse, “o vinho não faltava em Portugal, só que não podia ser escondido nem levado. Foi esta bebida benfazeja que amparou os soldados nas suas misérias.”
Com uma selecção de receitas que, garantidamente, não têm como referência os gostos de Napoleão Bonaparte, a lista dos restaurantes aderentes e respectivos pratos pode ser consultada no site oficial, onde estará também disponível a Carta Gastronómica com as receitas oitocentistas, criada pela Rota Histórica Linhas de Torres.