A actriz Emília Silvestre reúne (quase todas) as mulheres de Shakespeare
A peça Mulheres de Shakespeare, da autoria de Fátima Vieira e Matilde Real e encenada por Carlos Pimenta, leva a palco a actriz Emília Silvestre e a cantora Sofia Fernandes.
Miranda e o espírito Ariel ficam na ilha do exílio de Próspero com as restantes peças de Shakespeare. É este o pano de fundo de Mulheres de Shakespeare, que pede emprestado o local e duas das personagens de A Tempestade, escrita pelo dramaturgo inglês. Neste cenário, as personagens interagem, de uma forma metaficcional, com outras obras do Bardo de Stratford-upon-Avon, e nestas Miranda vê uma espécie de manual de instruções sobre como ser uma boa esposa e mulher.
A peça é encenada por Carlos Pimenta e baseada na obra homónima da UPorto Press, da autoria de Fátima Vieira e Matilde Real, publicada em Setembro, e que evoca clássicos como Romeu e Julieta, Macbeth, Como vos Aprouver e Hamlet.
Miranda (a actriz Emília Silvestre), à medida que vai lendo as peças a Ariel (a cantora Sofia Fernandes), vai aceitando, questionando e reflectindo sobre o seu papel enquanto mulher, à luz dos conceitos do seu criador e com um pendor crítico relativamente mais actual. “Apesar de a Emília Silvestre fazer uma série de papéis que foram escritos por Shakespeare há várias centenas de anos, é uma actriz de hoje, que está a ter um juízo sobre aquilo e obviamente questiona o olhar que os textos têm sobre a mulher”, explica Carlos Pimenta ao PÚBLICO. "Quisemos colocar uma mulher a pensar na razão por trás dos critérios de Shakespeare naquela altura, um tempo em que as mulheres nem podiam representar”, acrescenta o encenador, salvaguardando que não se pretende "uma reapropriação dos textos, de ler no contexto actual", o que, ressalva Pimenta, "é uma perspectiva muito incorrecta.”
Num âmbito mais estético, a cantora Sofia Fernandes acredita que “o Ariel, este espírito sem corpo físico, é quase como se Shakespeare tivesse escrito para efeitos especiais e para o tipo e capacidade técnica de hoje.” Para a cantora, "é um desafio reflectir sobre a liberdade de ser através desta personagem", para lá das exigências práticas de cantar e actuar simultaneamente.
Emília Silvestre já teve oportunidade de interpretar mulheres de Shakespeare, como por exemplo Lady Macbeth na encenação de Macbeth de Nuno Carinhas, em 2017. “O homem escrevia maravilhosamente. As suas personagens femininas têm personalidade, garra, energia, e arriscam, são respondonas. Não conseguimos pensar em Macbeth sem pensar em Lady Macbeth. É uma emoção enorme quando, aqui, pego em algumas delas, sobre o que lhes aconteceu. São tudo desgraças, mas elas continuam a ser poderosas, mesmo sem papéis principais”, explica a também actriz na série de televisão O Crime do Padre Amaro (2023), exibida na RTP.
A actriz nota ainda que “há uma coisa que o texto consegue: a questão da liberdade, de sermos quem quisermos ser. Aqui ninguém diz que os homens são assim e as mulheres assado. A diferença é importante. E ler este texto, de uma beleza incrível, não pressupõe apontar culpas".
A peça que esta quarta-feira se estreia no teatro portuense Helena Sá e Costa (até dia 14, sempre às 21h30), segue para Viana do Castelo, a fechar o Festival de Teatro, no dia 19 de Novembro; Teatro Municipal de Bragança, no dia 6 de Dezembro; e em 2024 será a vez do Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, de 11 a 14 de Julho de 2024. Vila Real e Seixal serão outras possibilidades mas, para já, com datas por definir.
Mulheres de Shakespeare é uma co-produção do Ensemble - Sociedade de Actores, da Casa das Artes de Famalicão, Teatro Municipal São Luiz e do Teatro Municipal de Bragança. A obra encomendada e depois editada pela UPorto Press, com apoio da Fundação Gulbenkian, já está à venda online e, fisicamente, nos dias e locais de espectáculo.
Notícia alterada com rectificação sobre A Tempestade