“Esta selecção joga uns furos largos acima do râguebi nacional”

Joaquim Ferreira, que vestiu por 84 vezes a camisola da selecção nacional de râguebi, diz que o último jogo de Portugal no Mundial 2023 será “muito bem jogado” e “com um resultado imprevisível”.

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Joaquim Ferreira esteve no Mundial 2007 Luís Cabelo

Fez 84 jogos pela selecção portuguesa de râguebi e o último foi em Toulouse – no mesmo estádio onde Portugal joga neste domingo contra Fiji -, tendo capitaneado Portugal nessa partida, que assinalou a despedida dos “lobos” do Mundial 2007, e onde marcou um ensaio contra a Roménia. Joaquim Ferreira, que enquanto atleta representou sempre o CDUP, afirma em entrevista ao PÚBLICO que a federação tem de “trabalhar mais com os clubes” e acredita que será importante que o substituto de Patrice Lagisquet seja estrangeiro: “Vai trabalhar sem ser influenciado.”

Que balanço faz dos três primeiros jogos de Portugal?
Foram jogos muito bem conseguidos por Portugal, que demonstrou uma grande garra, mas também jogou muito râguebi e foi ofensiva. Esta equipa é bastante dinâmica. Tiveram dificuldades, mas essas dificuldades foram criadas pelos opositores que tiveram. O empate contra a Geórgia foi fantástico e, a primeira parte, não foi dada de graça. Foi a Geórgia que pressionou e usou as suas armas. Já a segunda parte foi muito boa. Contra o País de Gales e a Austrália, dois colossos do râguebi mundial, Portugal consegui sempre desafiá-los. Foram jogos muito bem conseguidos.

Ficou surpreendido pela forma como Portugal conseguiu, num nível destes, aguentar os 80 minutos sem ter as quebras no final?
Este plantel é muito equilibrado. Temos já muitos jogadores nos campeonatos franceses, que é o mais competitivo que há. Já estão habituados a este nível. Isso, associado a toda a preparação que houve, resultou num trabalho bem feito.

É possível acreditar numa vitória contra Fiji?
Acredito que será um jogo muito agradável de ver e onde muita coisa pode acontecer. Fiji tem um jogo muito dinâmico, mas também muito brutal. São jogadores fisicamente muito fortes. Mas tem o lado Fiji: o lado mental. O que quero dizer com isto? Que eles podem achar que será fácil, que estão quase lá, por só precisarem de um ponto. Isso pode ser um ponto a favor de Portugal. Será um jogo aberto, dinâmico, muito bem jogado, com um resultado imprevisível.

Portugal tem sido das selecções mais elogiadas. O que se está a ver em França corresponde à realidade do râguebi português?
Esta é a dinâmica e a característica do jogador português, mas esta selecção joga uns furos largos acima do râguebi nacional e camufla um pouco a realidade do râguebi português. A federação tem de trabalhar mais nos clubes para melhorar essa qualidade. E isso tem de acontecer no país inteiro. Não é só numa região.

É quase certo que a partir de 2027 o Mundial passará a contar com 24 seleções, o que facilitará uma qualificação portuguesa. De qualquer forma, o que é preciso fazer para que Portugal mantenha este nível e não dê um passo atrás após o Mundial?
Sou do Porto e a realidade fora de Lisboa é diferente. Do lado de fora de Lisboa, acho que federação tem de trabalhar nos clubes. Precisamos de treinadores com mais conhecimento. Tecnicamente, os skills têm de ser melhorados. E há um deficit grande em Portugal de técnicas, seja do passe ou da placagem. A federação deve ajudar os clubes todos. Tem de trabalhar mais com os clubes e não fazer a separação: a selecção é uma coisa e o resto, deixámos andar por aí. Antigamente havia academias, selecções regionais que ajudavam imenso a desenvolver e a dar a conhecer aos jogadores outras realidades. Isto pode não ser agradável de se dizer, mas é fácil a um jogador português ser internacional. Manter esse nível é que é diferente. Há muitos jogadores com qualidade que se conhecessem o râguebi para além do que é o campeonato nacional, iriam tornar-se muito melhores jogadores…

A aposta tem de ser na exportação dos jovens para campeonatos profissionais no estrangeiro?
É quase crucial nos próximos tempos fazer isso. Mas gostaria que a federação trabalhasse mais nos clubes, para desenvolver jogadores, criando as oportunidades para que conhecessem um râguebi de melhor nível.

O Patrice Lagisquet vai sair depois do Mundial. Portugal deve continuar a apostar num seleccionador estrangeiro?
Acho que é bom existir um treinador fora de portas. Chega e vai trabalhar sem ser influenciado. Um treinador estrangeiro não estará influenciado por ninguém, e isso é importantíssimo. Depois, as oportunidades devem ser dadas a todos e quem merecer é que lá estará.

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