Governo faz depender aumentos da função pública da subida do salário mínimo

Aumento da base remuneratória do Estado dependerá das negociações entre Governo e parceiros sociais para rever as metas do acordo de rendimentos e do salário mínimo.

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O primeiro-ministro António Costa abriu a porta a aumentos do salário mínimo acima de 810 euros em 2024 LUSA/ANDRE KOSTERS

Depois de o primeiro-ministro, António Costa, ter admitido que o salário mínimo nacional poderia ir além dos 810 euros no próximo ano, o Governo mostrou-se, nesta quarta-feira, disponível para rever a sua proposta de aumento da base remuneratória da função pública. O novo valor deverá ser apresentado aos sindicatos na sexta-feira e está dependente da discussão em curso com os parceiros sociais sobre o valor do salário mínimo e uma eventual revisão do acordo de rendimentos.

No início da semana, o primeiro-ministro mostrou abertura para acelerar a evolução do salário mínimo prevista no acordo de rendimentos (que prevê um aumento para os 810 euros em 2024; 855 euros em 2025, e 900 euros, em 2026). Entre a proposta da UGT, que pede 830 euros e a disponibilidade dos patrões para irem mais longe na sua política salarial, António Costa vê alguma abertura para se chegar a um consenso.

Nos últimos dias, o Governo tem reunido de forma bilateral com as confederações patronais e sindicais para encontrar uma plataforma de entendimento e dar resposta a algumas das exigências colocadas em cima da mesa para o Orçamento do Estado para 2024, o que poderá resultar numa revisão de alguns dos pontos do acordo de rendimentos, em particular do salário mínimo.

Este processo, que nesta quarta-feira ainda decorria, é a chave para colocar a base salarial do Estado acima dos 821,83 euros em 2024, uma vez que os sindicatos saíram da reunião com a secretária de Estado da Administração Pública, Inês Ramires, com a certeza de que a nova proposta será alinhada com o que ficar decidido para o sector privado.

“O Governo comprometeu-se a apresentar uma nova proposta relativamente à base remuneratória da Administração Pública, o que, esperamos, terá impacto nas outras posições remuneratórias”, destacou José Abraão, dirigente da Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap), alertando que a proposta que está em cima da mesa é “insuficiente para responder à inflação e ao aumento do custo de vida”.

A proposta apresentada na semana passada previa que, no próximo ano, os aumentos da função pública oscilassem entre 6,8%, para os salários mais baixos, e os 2%, no caso dos salários acima de 2649 euros, em linha com o que prevê o acordo assinado no ano passado.

A base remuneratória subiria 6,8% entre 2023 e 2024, passando de 769,20 euros para 821,83 euros mensais.

Tendo em conta que o salário mínimo devia subir para 810 euros no próximo ano, a diferença face à base remuneratória era de cerca de 12 euros. Se se quiser manter esta diferença e assumindo que o salário mínimo sobe para os 830 euros, como pede a UGT, então a base remuneratória da função pública teria de passar para 842 euros.

A expectativa da Fesap é que as mexidas na base tenham impacto nas posições remuneratórias seguintes para evitar a compressão da tabela salarial do Estado.

Também a presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE), Helena Rodrigues, espera que o Governo apresente uma nova proposta de actualização salarial para todos os trabalhadores da Administração Pública e não apenas para quem está na base.

“Não pode haver compressão dos valores acima da base remuneratória, sob pena de continuarmos a perder salário”, justificou, citada pela Lusa.

“Passámos em revista a contraproposta apresentada pelo Governo, sabemos que eventualmente, na próxima sexta-feira, a última reunião deste processo, haverá uma nova proposta”, afirmou a presidente do STE, acrescentando que está a ser feito “um compasso de espera entre aquilo que possa ser decidido noutros fóruns e aquilo que o Governo poderá acompanhar depois para a Administração Pública”.

“Perversão completa” da negociação, alerta Frente Comum

Esse compasso de espera é criticado pela Frente Comum, considerando-o uma “perversão completa” da negociação.

“Fazer depender da negociação com os patrões do sector privado o aumento da base remuneratória da função pública é um absurdo”, disse Sebastião Santana, dirigente da Frente Comum, no final da reunião com a secretária de Estado.

“O que o Governo devia fazer era dar o exemplo: negociar os aumentos para os trabalhadores da Administração Pública e depois fazer valer isso no sector privado”, sublinhou.

Na reunião desta quarta-feira o Governo não se mostrou disponível para aumentar o valor das ajudas de custo e de transporte, limitando-se a acabar com os cortes que são aplicados a estas prestações desde 2010 e anunciando que a medida custará 21 milhões de euros.

Foi ainda discutido o reforço do pagamento do trabalho extraordinário a partir da 101.ª hora anual, aplicando à função pública o que está previsto na Agenda do Trabalho Digno, o que custará 25 milhões de euros por ano.

Esta medida, sublinhou José Abraão, não se aplica a médicos, enfermeiros ou técnicos de diagnóstico e terapêutica, que têm um regime específico previsto no Decreto-lei 62/79.

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