Ministro da Saúde já contactou sindicato dos médicos para reabrir negociações

Dirigentes sindicais reclamam apresentação de propostas concretas por escrito. Ministro da Saúde vai marcar nova reunião, adianta Roque da Cunha, que já foi contactado pelo gabinete de Pizarro.

Foto
Os sindicatos têm convocado greves e manifestações Matilde Fieschi
Ouça este artigo
00:00
04:23

O anúncio feito pelo bastonário da Ordem dos Médicos (OM) à saída da reunião com o ministro da Saúde – a de que Manuel Pizarro está disposto a reabrir as negociações e a aceitar que os médicos possam ter um horário base de 35 horas por semana como todos os outros profissionais do Serviço Nacional de Saúde – foi recebido pela vice-presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), Vitória Martins, com cepticismo. "O meu cepticismo é muito grande, apesar de eu ser um optimista irritante", admite também o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), Jorge Roque da Cunha.

“Não nos podemos deslumbrar com promessas. Promessas fomos nós ouvindo ao longo de 16 meses de negociações, incluindo essa [as 35 horas], mas nada ficou vertido nos documentos finais”, diz Vitória Martins. "Dada a experiência que temos de todos estes meses de negociações, necessitamos de ver propostas no concreto", corroborou Roque da Cunha. Mas acredita que o primeiro-ministro e os ministros das Finanças e da Saúde terão sido sensíveis às reivindicações, "dada a situação que se vive no SNS".

Roque da Cunha revela que o SIM já foi contactado pelo gabinete de Manuel Pizarro para uma nova reunião, mas ainda não há data porque vai ser necessário "concertar um dia" com a presidente da Fnam, Joana Bordalo e Sá, que está de férias. Seja como for, "esta reunião deve ser precedida da cimeira entre as duas estruturas sindicais que foi anunciada por Joana Bordalo e Sá".

A meio da tarde, a vice-presidente da Fnam ainda não tinha sido contactada pelo gabinete do ministro para uma nova reunião.

Da parte do "Médicos em luta", a palavra de ordem agora é "ver para crer". "Já estou como S. Tomé, quero ver para crer. E, sobretudo, quero ver as grelhas salariais que vão ser apresentadas", sublinha Helena Terleira, uma das líderes deste movimento inorgânico que surgiu nas redes sociais e cujo apelo para a adesão dos médicos à entrega de minutas de indisponibilidade para ultrapassar o limite das 150 horas extraordinárias anuais está a ter uma adesão cada vez maior e está a provocar constrangimentos e fechos transitórios de urgências em quase três dezenas de hospitais e centros hospitalares de norte a sul do país.

Decreto é inconstitucional?

Em Setembro, o Governo terminou as negociações com as duas estruturas sindicais e aprovou o projecto de decreto-lei da dedicação plena, que permitirá aos médicos que aderirem um aumento significativo do salário.

O Ministério da Saúde explicou, então, que o que se pretende é que o regime normal de trabalho seja o da dedicação plena, o qual se aplicará a todos os médicos que integrem centros de responsabilidade integrada (CRI) nos hospitais, aos que exercem cargos de chefia, sendo também permitida a adesão individual voluntária de todos os médicos que o pretendam.

O problema é que este regime prevê que os médicos que aderirem à dedicação plena tenham horário semanal de 35 horas, acrescido de mais cinco horas pagas como suplemento, e aumenta o número de horas extraordinárias a que os estão obrigados por ano, passando das actuais 150 para 250. Ou seja: continuarão a trabalhar 40 horas por semana e ficam obrigados a fazer mais 100 horas extraordinárias por ano. Neste caso, prometeu o Governo, o aumento salarial imediato será de 33%.

“É só fazer as contas”, diz Vitória Martins. A Fnam já tinha revelado que tenciona pedir a fiscalização preventiva da constitucionalidade deste decreto-lei. Só que não pode pedir ao Presidente da República que o faça antes de ter a versão final do diploma que o Ministério da Saúde ainda não lhe enviou.

O que pode ser inconstitucional? “Há várias questões que colidem com o acordo colectivo de trabalho”, explica a médica. Desde logo, o limite proposto de 250 horas extraordinárias obrigatórias por ano, a possibilidade de nove horas de jornada diária de trabalho, além de “não haver descanso compensatório com prejuízo de horário” no final do trabalho em serviço de urgência, elenca.

Os médicos que trabalham no SNS têm diferentes regimes de trabalho. É uma manta de retalhos. Há alguns, os mais velhos, que trabalham 42 horas por semana com exclusividade (regime que acabou em 2009), outros, 35 horas com exclusividade, mas a maior parte trabalha 40 horas por semana e mais seis horas na urgência (18 em vez de 12 semanais), regime que os sindicatos aceitaram em 2012, no tempo da “troika”, como contrapartida para aumentos salariais. O regime era para ser transitório mas acabou por nunca ser revertido. "Na altura apostaram-nos uma pistola à cabeça" para aceitar estas condições, recorda Roque da Cunha.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários