A falta de professores é um problema de gestão? Há quem acredite que sim

O PÚBLICO juntou professores, especialistas e o secretário de Estado da Educação, António Leite, para debater a crise de docentes no país e procurar soluções para fazer face ao problema.

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O debate Faltam professores. O que fazer? foi organizado pelo PÚBLICO esta quarta-feira Mariana Godet
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No debate esteve Luísa Loura, ex-directora-geral da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência e actual directora da Pordata Mariana Godet
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O secretário de Estado da Educação, António Leite, também esteve presente Mariana Godet
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O secretário de Estado da Educação, António Leite, também esteve presente Mariana Godet
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Filinto Lima, presidente da Associação Nacional dos Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas. Mariana Godet
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Luísa Loura, ex-directora-geral da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência e actual directora da Pordata Mariana Godet

A falta de professores é um problema que se sente em quase toda a Europa, Portugal inclusive. Mas o que se pode fazer, que não está a ser feito, para não comprometer o futuro da educação? Para a investigadora em educação e directora executiva do Instituto para as Políticas Públicas e Sociais do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa, Isabel Flores, há um nítido "problema de gestão das escolas" e de horários dos professores, além da "carga burocrática repetitiva que pode ser automatizada".

Desde o início do ano lectivo que mais de 5000 docentes apresentaram baixa por doença. É um número que se repete todos os anos. "Há padrões que conseguimos antecipar" e subsequentemente solucionar mais rapidamente, defendeu a especialista durante o debate Faltam professores. O que fazer?, organizado pelo PÚBLICO esta quarta-feira. No mesmo painel, estiveram presentes também o professor, investigador e coordenador nacional do projecto MAIA - Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica, Eusébio André Machado, e Rafael Santos, professor de 25 anos, na Amora (Seixal).

Os números foram avançados na segunda-feira pelo Ministério da Educação, mas já são conhecidos de Isabel Flores e de quem trabalha nas escolas. "A magia dos números é que todos os anos é igual", disse. E serão essas substituições que criam "a maior dificuldade na gestão das escolas", admitiu.

Para o professor Rafael Santos, "há pequenas acções simples que podem ajudar a combater a falta de professores", entre elas todo o processo originado pelas baixas e pelas substituições, que não raras vezes deixam o professor substituto sem trabalho ao longo de meses. Outra proposta elencada pelo docente foi a de passar a permitir aos finalistas dos mestrados em ensino concorrer ao concurso nacional no mesmo ano em que terminam o curso. "Porque não permitir que os finalistas dos mestrados em ensino concorram aos concursos, desde que até Setembro apresentem o certificado de habilitações?", questionou, exemplificando que no seu caso e no de outros colegas, isso não foi possível.

Já Eusébio André Machado é da opinião de que o contributo do digital e da inteligência artificial pode ser uma das soluções para estes e outros problemas com que os professores se deparam nas escolas, como o excesso de burocracia, e que contribuem para que a profissão docente seja cada vez mais aceite como pouco atractiva.

Mito à volta da habilitação própria

Sob o mote de quão grave é a crise de professores, o secretário de Estado da Educação, António Leite, reconheceu que existe de facto um problema de escassez, mas defendeu os "pontos essenciais" dos quais o Governo não abre mão para lhe fazer face. Entre eles está o facto de não ter sido aumentado o número de alunos por turma. Também não foi diminuído "o tempo de contacto dos professores com os alunos". "Quanto mais diminuir mais prejudicamos um determinado tipo de alunos, os mais frágeis e que mais dependem das escolas", sublinhou.

Por fim, o governante garantiu que a tutela não vai baixar as qualificações dos professores e dos candidatos aos mestrados em ensino. "Criou-se um mito, por exemplo, à volta da habilitação própria de que nunca isso antes aconteceu. E sempre tivemos “professores nas escolas com habilitação própria", disse, dando o seu próprio exemplo como um desses profissionais. O Ministério da Educação apresentou, esta semana, um conjunto de propostas aos sindicatos com o objectivo de atenuar a falta de professores. O diploma, que revê o regime de habilitação profissional para a docência, está em discussão, mantendo como condição ter um grau de mestre para o acesso à carreira docente, mas revê em baixa os requisitos exigidos para o acesso a este nível de ensino. António Leite deu ainda uma nota de sossego, garantindo que "a componente das didácticas nunca é dispensada" nos mestrados profissionalizantes para o ensino.

No debate estiveram ainda Luísa Loura, ex-directora-geral da Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (​DGEEC) e actual directora da Pordata, e Filinto Lima, presidente da Associação Nacional dos Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas.

Mas como se atraem, então, as camadas mais jovens para a profissão docente e as que abandonaram a profissão quando "ainda existiam professores a mais?" Luísa Loura notou que houve uma "enxurrada, uma torneira aberta" no início dos anos 2000, quando se formavam mais docentes do que os necessários. À data, casos houve de se formarem 30 a 40% dos professores que estavam no activo. "Mesmo que se aposentassem 30% dos professores as instituições de ensino superior estavam disponíveis para dar resposta", frisou a especialista.

É uma realidade que em pouco se parece com a actual: no caso de Português a formação passou a representar cerca de 1% dos professores no activo. Em números redondos isso significa que, no último ano lectivo, saíram do ensino superior 64 professores para dez mil que estão a exercer. As maiores necessidades de professores nos próximos anos estão no 3.º ciclo e no ensino secundário, um “problema estrutural”.

Para o resolver, Filinto Lima disse ser essencial aumentar salários. "Eu acho que os professores não recebem rendimentos dignos para a função que exercem", frisou, ao mesmo tempo que recordou a necessidade de simplificar a carga burocrática e de procurar soluções de alojamento para professores deslocados, assim como pensar em ajudas de custo.

Segundo o secretário de Estado da Educação, "está a ser debatida e desenhada uma medida de apoio" para professores deslocados e, "em breve, o Ministério da Educação terá novas casas disponíveis" com rendas acessíveis.

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