Crises imediatas desviam atenção dos debates decisivos sobre a Europa que vamos ter na próxima década

Líderes europeus convergem em Granada, que quer ser a “capital das decisões sobre o futuro do continente”. Apesar do guião, o foco estará nas soluções para os problemas de curto prazo.

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A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, com Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, durante a cimeira dos países do Sul da UE, em Malta EPA/Domenic Aquilina

A expectativa da anfitriã Espanha é que os canhenhos da história possam reconhecer a reunião da Comunidade Política Europeia desta quinta-feira, e a cimeira informal dos líderes do Conselho Europeu de sexta-feira, ambas na cidade de Granada, como o “momento fundamental” de lançamento do debate estratégico — e das decisões políticas — sobre a Europa que vamos ter (ou ser) na próxima década.

“Granada, capital das decisões para o futuro do continente”, ambicionam os organizadores espanhóis, que fixaram uma mesma linha orientadora para conduzir o debate alargado entre os 50 chefes de Estado e governo dos países da Comunidade Política Europeia e a discussão mais restrita entre os 27 líderes da UE: como podem as nações europeias preparar-se e cooperar para responder aos múltiplos desafios e às ameaças com que se confrontam.

A matéria é existencial para todos os Estados europeus, sejam eles membros da UE, tenham eles interesse em aderir rapidamente ou em permanecer do lado de fora desse clube: com a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, todos concordam que não pode haver soluções eficazes para crises de segurança, energéticas, sociais ou ambientais sem essa escala continental.

O “risco” é que as atenções acabem por desviar-se do nível mais ou menos filosófico, académico e institucional do debate político sobre o fortalecimento e a projecção da Europa como grande actor geoestratégico num contexto global extremamente complexo, para se concentrarem na discussões de questões mais imediatas da agenda europeia, da gestão das fronteiras, ao apoio militar a Ucrânia e à revisão do quadro orçamental da UE.

São temas à margem do guião da Europa do futuro, mas que vários líderes fazem questão de tratar em Granada. Um deles é o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, que segundo a imprensa britânica estava bastante descontente com a coreografia prevista para a reunião da CPE, precisamente por não estar prevista uma sessão dedicada ao tema das migrações. Outra é Georgia Meloni: a líder italiana arrecadou uma pequena vitória política, esta quarta-feira, com o Conselho da UE a fechar a sua posição sobre um futuro mecanismo de gestão de crises migratórias que permite desbloquear o processo legislativo com o Parlamento Europeu com vista aprovação do novo Pacto para as Migrações e Asilo antes do final da legislatura.

Como aconteceu nas primeiras duas edições da CPE — um novo fórum de discussão informal que fontes diplomáticas de Bruxelas acreditam poder tornar-se uma “tradição” — o trabalho foi organizado em torno de painéis temáticos, que acontecem depois da sessão plenária inaugural e antecedem encontros bilaterais entre os líderes. Estão previstos três debates, sobre sobre multilateralismo e questões geoestratégicas e securitárias, que é o painel mais concorrido; energia, ambiente e combate as alterações climáticas, onde participa o primeiro-ministro, António Costa; e Inteligência Artificial e transição digital, todos fechados e sem conclusões formais.

Segundo as mesmas fontes de Bruxelas, apesar da importância desses debates temáticos, o foco dos líderes que vão participar na reunião da CPE de Granada vão ser os contactos informais e as negociações diplomáticas para arrefecer as tensões, prevenir a escalada do conflito e fazer avançar os processos de normalização entre a Arménia e Azerbaijão, e a Sérvia e o Kosovo. “Há muita actividade de bastidores, têm sido contactos diários e intensos”, informava um diplomata europeu envolvido na preparação de alguns encontros.

Este responsável admitia que, tendo em conta a situação difícil no terreno na região de Nagorno-Karabakh, não se podia esperar fumo branco. “A intenção é fazer alguns progressos, ver o que pode ser feito em termos de apoio. Não é fechar um acordo de paz, isso é ser demasiado optimista”, esclareceu.

A Reuters citou uma declaração do primeiro-ministro da Arménia, Nikol Pashinyan, à agência russa Interfax, confirmando a sua disponibilidade para assinar um documento “inovador” e “decisivo” para a paz entre os dois países. Mas o optimismo esfumou-se após com uma notícia da agência estatal APA a dar conta da mudança de ideias do Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, que teria cancelado a viagem até Granada em reacção às “declarações pró-arménias” de vários líderes da UE, entre os quais o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. A informação não foi confirmada oficialmente.

Também por confirmar está a participação do Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Em Junho, o líder ucraniano cruzou a fronteira com a Moldova para reclamar garantias de segurança de longo prazo aos líderes da UE e da NATO que participavam na reunião da CPE. Se aparecer em Granada, ocupará novamente o palco: Zelensky não pode desperdiçar essa oportunidade, num momento tão delicado para Kiev, que teme o corte do apoio militar dos seus principais aliados.

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